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Marechal

Anjos ao vento

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O Presente
Uma história de medo, angústia e incertezas que se transformou em solidariedade, amor e gratidão

Ela não sabia, mas a indisposição que Vera Biesdorf sentia na tarde de 19 de novembro de 2015 não era o pior de seus infortúnios. A professora aposentada de Marechal Cândido Rondon estava na cama, se sentindo fraca, logo após o almoço, quando percebeu um vento assustador fazer ranger as portas e janelas.

Em segundos, a casa em que ela morava há 25 anos, onde criou seus dois filhos, se resumiu às paredes. Um tornado que atingira a cidade havia destruído grande parte da residência da família, deixando em choque dona Vera e outros 50 mil moradores do município. Ao mesmo tempo em que as pessoas contabilizavam os estragos em meio ao caos, surgia espontaneamente um cenário devastado pelo vento e pela chuva, mas carregado de compaixão, solidariedade e amor ao próximo.

Quase um anos depois, Vera recorda dos momentos de aflição, medo e angústia, mas garante que o afeto e o apoio que recebeu depois da passagem do fenômeno é a grande lição deixada pelo tornado de 19 de novembro de 2015. Eu estava em casa com uma afilhada, que na época morava comigo para acabar os estudos. Fui pra cama porque estava me sentindo fraca. De repente, veio um vento muito forte. Fechei os olhos e os ouvidos, depois decidi correr para debaixo da mesa da sala. Minha afilhada gritou para eu ir até o banheiro. Lá, nos trancamos, lembra a aposentada. Quando passou todo aquele barulho, quando tudo ficou em silêncio e eu abri a porta… que tristeza! Fomos para a rua e vimos tudo destruído. Nos abraçamos e começamos a chorar por estarmos vivos, mas a casa estava destruída, conta.

Vera ainda tinha esperanças em poder voltar para casa em alguns dias, mas as rachaduras nas paredes e a inexistência do teto indicavam que o imóvel precisava ser reconstruído. Sem dinheiro suficiente para arcar com os custos, passou a noite seguinte em claro, tentando, em vão, encontrar uma solução para o problema. Fui para a casa de amigos e fiquei a noite toda fazendo contas, mas eu não iria conseguir reconstruir a casa. Sou aposentada pelo INSS, não teria como fazer quase nada, diz Vera.

 

A reconstrução

A angústia da professora aposentada duraria dois dias, até um colega de profissão fazer uma visita aparentemente despretensiosa. Ele veio no sábado, dois dias depois do tornado. Olhou as coisas e foi embora. Na semana seguinte, ele voltou e me disse: professora, nós vamos ajudar a reconstruir sua casa, conta. Me emocionei. Eram anjos que naquela hora difícil estavam na minha frente, amplia.

A conta bancária Amigos da Vera arrecadou cerca de R$ 20 mil. A história ganhou destaque no município e nas redes sociais e outras contribuições vieram de Itaipulândia, Maringá, São Paulo, Santa Catarina. Gente que eu nem conhecia. Teve ação entre amigos que sorteava um relógio Rolex, teve até gente que me parou na rua pra me dar dinheiro, lembra, emocionada.

Vera relata que as doações e apoio não pararam. As pessoas doaram materiais de construção, vieram fazer a pintura. Todo mundo abraçou a causa, foi uma coisa maravilhosa, comenta.

 

Arquivo/OP

 

A volta

A aposentada conta que cinco longos meses se passaram até que o amontoado de desilusão se transformasse em uma nova casa, segura, confortável e agora impregnada de amor entre as paredes. Fiquei cinco meses na casa de amigos e parentes. No dia 22 de abril entrei na casa de novo, mas agora costumo dizer que a casa não é minha, é nossa. Digo isso porque as pessoas não colocaram só tijolos aqui, elas colocaram muito amor, opina.

O dinheiro foi fundamental, mas observar as pessoas, muitas vezes desconhecidas, se importando com o seu problema foi incrível, revela. Toda essa ajuda faz a gente repensar alguns valores que temos. Isso mostra o quanto as pessoas se importam com os outros. Fui professora a minha vida toda por paixão pela profissão. Sempre fiz as coisas porque eu amava fazer, mas nunca esperei nada em troca. Esse carinho que recebi é lindo. Meu coração está enorme de gratidão, uma gratidão sem fim, acrescenta a aposentada.

Giuliano De Luca/OP

 

Sentimento coletivo

O coordenador da Defesa Civil em Marechal Cândido Rondon na época, vereador Arlen Güttges, que comandou a força-tarefa de apoio às famílias atingidas pelo tornado, conta que essa assistência gratuita das entidades e indivíduos veio imediatamente após o fenômeno. Nunca vi nada parecido. Em minutos as pessoas já estavam nas ruas ajudando as outras. Um com uma motosserra, outro ajudando tentar salvar um móvel. Tinha gente que largava sua casa para ajudar o vizinho. Foi único, lembra.

Para ele, o sentimento coletivo de apoio diminuiu a dor de famílias como a da aposentada Vera Biesdorf, que define: Não são só pessoas, são anjos.

 

O TORNADO EM MARECHAL RONDON


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