Dom João Carlos Seneme
A vida eterna é dom da vida de Jesus na cruz
O Evangelho de amanhã (22) nos permite entrever os sentimentos que Jesus viveu intimamente ao se aproximar de sua hora. O fato se passou no dia seguinte à sua entrada triunfal em Jerusalém (Domingo de Ramos). Em sua alma já começou a agonia do Getsêmani: Agora, a minha alma está perturbada. Mas, começou também o momento do seu sim.
A presença de gregos pagãos querendo ver Jesus indica a abertura da salvação a todos os povos. O gesto de obediência de Jesus ao Pai, dando a sua vida para que todos tenham vida em abundância, é para todas as pessoas que se abrem ao dom da fé e acolhem Jesus como Filho do Deus libertador e salvador. Os gregos não se dirigem diretamente a Jesus, aproximam-se de Filipe e manifestam o desejo de conhecer Jesus. Neste fato, São João indica que caberá à comunidade de Jesus a missão de anunciar a boa-nova do Reino a todos os povos. Hoje esta missão é nossa.
Em seguida, Jesus declara que a hora anunciada desde o princípio chegou, e que nela se manifestará a sua glória: o seu amor fiel até as últimas consequências, realizando até o fim o projeto de Deus. A glória que nEle se manifestará é a mesma do Pai. Em Jesus a humanidade recupera toda a sua plenitude humana como no dia em que fomos criados à imagem e semelhança de Deus. A glória de Deus é o homem vivo (S. Irineu).
Na Bíblia, a glória de Deus é a sua presença. Presença radiante como o fogo da sarça ardente que encantou Moisés e onde Deus se revelou (Ex 3). Quando Jesus disse Pai, glorifica o teu nome, poderíamos traduzir como Faça-se conhecer, revele-se quem você é, revele-se como um Pai amoroso que estabeleceu uma aliança de amor com a humanidade. Porque esta é, em última análise, a salvação, a felicidade humana, e é justamente isto que a primeira coisa que pedimos na oração do Pai Nosso: Santificado seja o vosso nome, venha o vosso reino, seja feita a vossa vontade. Em outras palavras, queremos afirmar que vos sejais reconhecido como o Deus de amor e que o vosso reino de amor se estabeleça entre nós. Jesus se encarnou para isso. Mais tarde vamos acompanhar o interrogatório de Jesus diante de Pilatos. Jesus dirá: Eu nasci e vim ao mundo para dar testemunho da verdade (Jo 18,37).
Em seguida, com uma metáfora, Jesus explica o conteúdo e o significado da hora. A imagem do grão de trigo ajuda a compreender o caminho da glorificação de Jesus. Para produzir fruto o grão de trigo tem que desaparecer na terra. É o único modo de produzir fruto. A metáfora revela à semelhança do grão de trigo, Jesus também deve morrer para que todos tenham a possibilidade de entrar em comunhão com o Pai. É a lógica da existência cristã: encontrar Jesus implica segui-lo em um estilo de vida que se realiza em ser dom para os outros. É dessa forma que Jesus dá sentido à sua paixão e morte: produzir muito fruto. Com a doação de sua vida, um povo novo há de nascer. Pode parecer estranho à nossa maneira humana de pensar, mas é assim a prova definitiva do amor de Deus: o Filho concorda em morrer nas mãos dos homens, o Pai aceita a sua oração: Pai, perdoa-lhes (…). Agora, ao olhar para a cruz, não vemos um instrumento de ódio e dor, mas o instrumento do triunfo do amor. Jesus veio para dar testemunho da verdade, chegou a hora, a missão está cumprida.
Ao mesmo tempo, Jesus propõe aos seus seguidores de todos os tempos que façam o mesmo. Sabemos que não é algo tão simples. O próprio Cristo passou por aflição e até pediu ao Pai que o livrasse deste sofrimento. Mas o dom de sua vida para a humanidade foi mais forte. E nós o agradecemos por isso. Ele foi obediente até a morte e morte de cruz e se tornou fonte de salvação eterna. Queremos ver Jesus também deve ser o nosso desejo fundamental, mesmo que tenhamos medo e incerteza, pois certamente esta busca e este encontro nos farão melhores do que somos e estaremos mais perto de Deus.
* O autor é bispo da Diocese de Toledo
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