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Elio Migliorança

As revelações da greve

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A paralisação dos caminhoneiros proporcionou uma espetacular aula de sociologia a céu aberto. Só não viu quem não quis e não aproveitou quem estava ocupado pensando como poderia levar vantagem com o desabastecimento ou ajudando a espalhar notícias falsas. Anunciada com antecedência, a paralisação começou de forma tímida, mas foi tomando corpo e de repente a adesão voluntária ou forçada foi quase total. Este fato revelou existirem meios de comunicação sobre os quais os governos não possuem controle, as empresas de comunicação perderam o monopólio e as notícias podem chegar de forma silenciosa a milhões de conectados nas redes sociais. Em três dias produtos essenciais começaram a desaparecer nos supermercados e nos postos de combustíveis. Foi aí que os seres humanos mostraram o seu lado perverso e egoísta com atitudes contra os direitos e anseios legítimos de seus semelhantes, também seres humanos com os mesmos direitos de sobrevivência.

Uma das faces escancaradas da sacanagem foi a atitude dos donos de alguns postos, que resolveram aumentar em quase 100% o preço dos combustíveis assim que se tornou claro o risco de desabastecimento. Deviam agora receber o troco dos consumidores com um boicote à compra de seus produtos.

De parte dos consumidores também houve comportamentos condenáveis. Para quem normalmente consome um botijão de gás por mês não é atitude normal e ética estocar outros cinco botijões em casa, apressando o desabastecimento e deixando outras famílias sem meios para preparar os alimentos.

Considerando que os combustíveis movem o transporte nacional, mas também são estratégicos para o agronegócio, os caminhoneiros foram surpreendidos com a adesão rápida e decisiva dos agricultores. Aonde os motoristas não chegavam, havia um ponto de bloqueio organizado pelos produtores rurais. Diante da possibilidade real da falta de alimentos nos supermercados, começou outra corrida pela estocagem de alimentos. Novamente foram vistas cenas lamentáveis de pessoas que consomem um pacote de arroz por mês saírem do mercado com cinco pacotes entre outros produtos. Ficou claro que o maior problema do ser humano é aquele ser humano predatório e egoísta, que não pensa nas necessidades dos outros e nos riscos que corre quando na vida precisar da solidariedade alheia.

Cenas cruéis e lamentáveis foram vistas quando os “piqueteiros” impediram a passagem daqueles que desejavam continuar sua viagem, aí incluídos caminhões com produtos perecíveis e comida para os animais, gerando assim prejuízos para outros seres humanos que sobrevivem da mesma atividade, a agricultura. Inaceitável também impedir a passagem de medicamentos, alimentos e suprimentos para hospitais e estabelecimentos similares.

Observar a forma selvagem com que alguns defenderam e outros atacaram o movimento lembrou uma praça de guerra, com a diferença que aqui as armas eram palavras, inapropriadas ou sem fundamento, na base da gritaria estúpida e agressiva. E o fato mais triste, lamentável e inaceitável foi a morte de um inocente e trabalhador pai de família que fazia sua última viagem como motorista para pagar a festa de aniversário de sua filha de 15 anos. Oportunamente faremos uma análise técnica e financeira do movimento, pois é sábio aquele que tira lições e aprende com as experiências vividas.

 

O autor é professor em Nova Santa Rosa

miglioranza@opcaonet.com.br

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