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Dom João Carlos Seneme

Eu sou a ressurreição e a vida. Quem crê em mim, viverá!

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Já estamos bem perto da Páscoa vivemos momentos difíceis atingidos por uma pandemia que agride o mundo inteiro. Deste modo, a preparação para a Páscoa se reveste de um sentido novo.

A consciência do limite é uma das experiências constitutivas do ser humano. Todos os dias experimentamos nossa finitude e nossa incapacidade radical de encontrar sentido quando vivemos situações de morte, doença, impotência. Neste instante, a fé vem em nosso socorro e nos dá sinais de esperança. Já fomos salvos por Deus através de Jesus Cristo morto e ressuscitado e com ele vamos superar todas as dificuldades que nos afligem.

O episódio da ressurreição de Lázaro é o anúncio antecipado deste novo dia. De fato, no evangelho de João, esse episódio funciona como uma moldura entre a primeira parte do evangelho (Jo 1-12) e a segunda (Jo 13-20). O episódio é colocado na fronteira entre o ministério de Jesus e sua Páscoa de morte-ressurreição. As cenas que se seguem são construídas em progressão constante e os leitores são convidados a se identificar com os personagens, a embarcar em um caminho que leva da dúvida à fé no Senhor da vida.

O primeiro ato do drama nos apresenta os protagonistas, não sem inconsistências gritantes. De fato, Jesus é apresentado como quem “amava Lázaro”; no entanto, no momento da notícia da doença de seu amigo, ele espera ainda dois dias antes de partir. Quando ele decide ir reencontrá-lo, ele o encontra no túmulo. Atitude estranha: por que esperar? Por que os males do ser humano acabam destruindo-o? Por que Deus não intervém imediatamente diante das necessidades do ser humano? Por que, por que …? No momento, o ser humano permanece sem resposta, apenas com uma afirmação enigmática: “Esta doença não leva à morte, mas à glória de Deus”.

Na segunda cena, Jesus encontra Marta, a irmã sensível e prestativa, profundamente humana e espontânea, porém sua fé é vacilante. Ela acredita em Jesus, junta-se a ele na fé professada na ressurreição do último dia, mas, quando o “Mestre” manda remover a pedra do sepulcro, ela o lembra dos quatro dias que se passaram desde sua morte. Como pode quem já cheira mal reviver? Jesus se apresenta como o Senhor da Vida, aquele que faz viver. “Eu sou a ressurreição e a vida”. Deus não criou a morte e o Filho veio para testemunhar o Deus da vida. O único requisito é a fé, porque quem acredita já tem vida eterna e não terá que temer a morte.

No terceiro ato, Maria entra em cena. Jesus a vê, é tomado pelo sofrimento e chora. O texto grego, no entanto, sublinha a consternação de Jesus como um movimento de raiva: é a reação dele ao reino da morte. Jesus não veio para nos ensinar a resignação, mas para combater o mal e vencê-lo. A raiva e as lágrimas de Jesus são sua primeira resposta à dor humana: a resposta de um Deus que não criou a morte e se entristece com esta derrota suprema no projeto de vida e bênção a que o homem tinha sido planejado. Deus se torna solidário com o ser humano, desce ao seu cativeiro, até onde o ser humano se desespera. Assim, e somente dessa maneira, Deus quis derrotar a morte.

No centro do quinto ato, permanece Jesus sozinho, com sua oração ao Pai e seu clamor: “Lázaro, vem para fora”! João não se preocupa em descrever o milagre com detalhes, para não distrair o leitor do que realmente importa: o poder de Jesus de dar vida. Ele é o verdadeiro protagonista; se queremos encontrar uma resposta para a questão angustiante da morte, da pandemia é para ele que devemos olhar; é ele é que precisamos ouvir. Diante da pergunta “por que o mal? Por que a morte? ” Deus respondeu enviando seu Filho para nos salvar. O ser humano continua a morrer e a vida a ser truncada, mas o Filho de Deus deu, aos que creem, a certeza de que a morte não terá a última palavra. No grão de trigo que morre sob a terra, quem crê saberá como descobrir o surgimento de uma nova criação.

Que a luz do ressuscitado nos ilumine e fortaleça!

 

Dom João Carlos Seneme é bispo da Diocese de Toledo

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