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Editorial

Insensibilidade ou inocência?

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Pelo respeito a você, leitor, pelo respeito a você, leitora, nesse jornal você nunca vai ver cadáveres de pessoas despedaçadas em acidentes de trânsito. Pelo respeito à memória das vítimas, pelo respeito aos familiares e amigos, você nunca vai ver este veículo de comunicação, em todas as suas plataformas, demostrar indiferença com a morte. Aqui, você nunca vai ver a gente zombar da Covid-19, que machuca as pessoas, que lhes faz reviver dor, sofrimento ou quaisquer outros sentimentos indesejados. Isso é a responsabilidade que nosso jornalismo tem, sobretudo, com as pessoas.

Na faculdade de Jornalismo a repercussão de tudo o que é publicado é exaustivamente debatida. Benefícios daquela publicação, utilidade, reflexos e efeitos colaterais, danos a terceiros. Tudo para garantir que aquela notícia não apenas seja apurada, verificada, mas que seu conteúdo informe sem agredir, sem desdenhar e com o respeito que, para além dos bancos escolares, foi passado por mamãe e papai.

O caso Lázaro mostra uma realidade perversa, inversamente proporcional ao que o bom jornalismo prega. Não pela imprensa, mas notadamente por pessoas nas redes sociais, que aprenderam a publicar sem restrições, que não se preocupam com os danos adversos que elas por ventura possam causar.

Desde que o homem condenado por assassinatos e estupros, fugitivo da Justiça, ganhou as manchetes no Brasil, não pararam de surgir piadas e memes com o ele, que acabou morto, ontem (28), após 20 longos dias de sofrimento de uma comunidade, mortes, angústia, medo e muito trabalho policial. Piadas e memes dos mais variados que provavelmente você recebeu em seu celular e que nem valem ser mencionados. Por falta de sensibilidade ou pura inocência, essas publicações foram repassadas aos montes, fazendo chacota não com a história de um homem cruel, acusado de cometer de vários crimes, mas com suas vítimas.

Como seria para você receber memes do homem acusado de matar seu filho, sua nora e seus netos? Como seria para você, estuprada, receber uma piada com seu suposto estuprador? Como seria para você receber fotinhas da pessoa acusada de assassinar o seu irmão, ou piadas sem graça unindo ele e a política partidária que avança sobre tudo nesse país? Como você reagiria?

Essas são algumas perguntas que o jornalista faz antes de publicar algo. E certamente muitas pessoas deveriam fazer antes de publicar, curtir e repassar conteúdos que podem piorar ainda mais a vida das famílias e amigos em luto. Sinceramente, não há nada de engraçado nesses conteúdos, pelo contrário, causam mal-estar, repugnância, mas especialmente mostram que pessoas não se importam com pessoas.

Essa história de o brasileiro fazer piada com suas próprias dores é coisa do passado, ou ao menos deveria ser. Fazer piada do sofrimento e da morte é de uma insensibilidade assustadora, mas que não chega a assustar. O caso Lázaro é só mais um entre tantos que aconteceram, entre tantas tragédias que vão acontecer e vão cair na graça de pessoas que, insisto, por insensibilidade ou pura inocência, não sabem o mal que podem estar causado.

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