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Elio Migliorança

NÓS E A BOITE KISS

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Sobre a tragédia em que morreram 241 pessoas, quase tudo já foi escrito, analisado, debatido e investigado. Mas os respingos se espalharam pelo Brasil e nós estamos sendo atingidos agora pelas consequências. Foi natural, após a tragédia, prevenir para que novas vidas não sejam ceifadas. Mas tentar passar o Brasil a limpo de uma hora para a outra, corrigindo erros ou omissões cometidos ao longo de 30 anos em apenas alguns meses, é tarefa impossível ou no mínimo uma decisão equivocada. Muitos estabelecimentos do mesmo ramo da Boite Kiss foram logo interditados e seu sistema de segurança passado a limpo. Aí cabe uma pergunta: de quem era a culpa por estarem funcionando fora dos padrões de segurança? Quem se omitiu, se beneficiou ou autorizou o funcionamento fora dos padrões exigidos? A quem cabia a fiscalização? São questões relevantes porque, conforme testemunhamos, as consequências podem ser trágicas e ninguém deseja que isso aconteça. Contudo, agora estamos vivendo o outro extremo. De repente todos os salões de comunidades religiosas, associações e clubes foram colocados na ilegalidade e proibidos de realizar qualquer evento antes de uma vistoria e liberação. Casamentos, festas e promoções de comunidades estariam sendo proibidos porque o ambiente onde se realizará não está dentro dos padrões exigidos. Concordo, todos queremos segurança. Mas querer que tudo seja feito imediatamente é uma falta de bom-senso. Estamos cientes de que é necessário ter extintores funcionando, os da Kiss falharam, que é necessário ter várias portas de saída e que não se pode usar fogos em ambiente fechado. Se tudo isso está sendo exigido das comunidades, associações e clubes, mas e como ficam os bancos em caso de incêndio? Só uma porta giratória onde sai uma pessoa de cada vez. Será o caso de interditar os bancos também? E nas escolas, as salas de aula não têm saída de emergência. Vamos suspender as aulas? As igrejas terão que ser fechadas também? Qual a probabilidade de um incêndio numa igreja? Será que algum insensato vai acender um sinalizador lá dentro para acordar a turma? Se numa estrada acontecem muitos acidentes, devemos fechar a estrada? Suspender o movimento de veículos naquela rodovia? Um ônibus que carrega 50 pessoas, e possui apenas duas janelas removíveis em caso de emergência, e uma porta que para atingi-la é preciso descer uma escadinha bem safada, seria o caso de proibir o turismo ou fabricar ônibus com paredes móveis?
Repito, todos queremos segurança, mas a forma como isso está sendo exigido está aterrorizando comunidades e associações pelo custo das mudanças exigidas e pela radicalidade de certas medidas proibindo eventos. E como ficam os responsáveis que liberaram as obras fora dos padrões? E os engenheiros que fizeram os projetos sem prever tais quesitos de segurança? Onde estavam os fiscais das prefeituras e Corpo de Bombeiros quando tais obras receberam alvará de funcionamento? O mais sensato será um cronograma com a exigência mínima para providência imediata, e que as demais adaptações tenham um prazo dilatado para que todos tenham condições de realizá-las. Sem terrorismo e sem querer fazer 30 anos em seis meses.

* O autor é professor em
Nova Santa Rosa
miglioranza@opcaonet.com.br

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