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Arno Kunzler

O corporativismo

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O que vimos no Congresso Nacional, na última quarta-feira (18), foi um ato de extrema coragem – ou seria desespero – que merece a nossa reflexão. Quando o corporativismo se fecha e consegue respirar os mesmos interesses, alimentar os mesmos objetivos, uma voz destoante como a do até então ministro Cid Gomes provoca a ira coletiva e gritos de revolta.

É bem assim que funciona o corporativismo em qualquer nível. No caso do Congresso é ainda mais difícil alguém ousar tecer críticas ou levantar qualquer questionamento sobre o funcionamento da instituição.

Quando Cid Gomes confirmou o que já havia dito – fato que provocou sua convocação, o Congresso Nacional inflou de ódio e palavrões se ouviam de todos os lados.

E o que ele disse, para nós não é nenhuma novidade, é apenas a confirmação daquilo que a maioria dos brasileiros já sabem ou pelo menos desconfiam…

Os deputados, pelo menos grande parte deles, negociam seus votos conforme o peso de cada votação. Alguns negociam por obras em seus Estados, ou redutos eleitorais… Outros, talvez… será que negociam contratos com empreiteiras com outros fins?

Essas mesmas que aparecem nas listas das empresas investigadas, talvez?

Os congressistas que fazem o jogo do poder, aqueles que Cid Gomes falou que deveriam “largar o osso”, ficaram agitados. O Congresso ficou agitado quando Cid não só atendeu à convocação, mas reafirmou o que já havia dito, mesmo sabendo que sua permanência no governo já não seria mais possível.

Aproveitou, antes de pedir demissão, para fazer barulho e levar um recado aos que se mostram infelizes com a situação do governo.

A mídia se saciou com uma discussão nova, talvez até provocada para desviar o foco dos noticiários da Operação Lava Jato.

Mas não há dúvida que as instituições precisam ser sacudidas e se o corporativismo não permite que elas mesmas corrijam seus rumos, algo excepcional, inesperado e improvável precisa acontecer.

Outras vozes solitárias e fartamente contestadas precisam se levantar e se agigantar diante da unanimidade burra, não só dentro do Congresso, mas em quase todos os segmentos onde o corporativismo se sobrepõe a qualquer iniciativa que possa pelo menos ser discutida.

A democracia no Brasil precisa encontrar meios para se sustentar, se auto reciclar e extirpar os métodos que permitem a construção de privilégios descabidos e indesejados, caso contrário nos distanciaremos cada vez mais de um modelo equilibrado e duradouro.

O método, conhecido como toma lá dá cá, ao que Cid Gomes se referiu, a partir do qual o governo compra literalmente o voto dos congressistas, está ruindo não só os governos, mas atingindo a estabilidade das instituições e do regime democrático conquistado com tanto sacrifício no Brasil.

Que apareçam outros Cid Gomes, outros Roberto Jefferson e outros Sérgio Moro…

 

* O autor é jornalista e diretor do Jornal O Presente

arno@opresente.com.br

 

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