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Arno Kunzler

O que funciona no trânsito?

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É comum, mesmo nas pequenas cidades, os governantes terem dificuldades para administrar o interesse dos que andam de carro, de bicicleta e os pedestres, especialmente os portadores de deficiência física, crianças e idosos.

É comum ver os governantes se atrapalharem quando não têm coragem para implementar medidas que exigem respeito em primeiro lugar, disciplina e moderação.

Por conta de alguns malucos que andam de carro, quando deveriam estar sem carteira ou até na cadeia, também é comum ver a sociedade tentando se proteger da violência, construindo obstáculos que na verdade são muito mais uma demonstração de ignorância do que salva-vidas, como se pretende na maioria das vezes com a melhor das intenções.

Até porque os motoristas que desobedecem à legislação, embora sejam indisciplinados e, às vezes, até malucos, não são burros e não vão passar os quebra-molas a 120 quilômetros por hora. Eles simplesmente vão escolher outra rua para fazer suas loucuras.

Mas o que mais chama atenção em Marechal Cândido Rondon neste momento é a quantidade de soluções que encontramos.

O que é aparentemente simples vira algo extremamente complicado, quando as pessoas não observam o que acontece no dia-a-dia de uma comunidade e cada qual procura solucionar o seu problema, sem, no entanto, se importar com o coletivo, com o ser humano, com o respeito ao próximo.

Se não vejamos: alguém, alguma autoridade recebeu reclamações sobre excesso de velocidade ou pedido de implantação de quebra-molas nas ruas Sete de Setembro, Tiradentes e pedaço da Santa Catarina depois que elas foram remodeladas em 2003?

Não, não houve reclamações de excesso de velocidade e nem pedidos de implantação de quebra-molas. Logo, aquela intervenção, por mais que tenha sido criticada, por mais que tenha sido questionada até mesmo porque tinha gente arguindo que a Sete de Setembro teria que permanecer uma via rápida por causa do pronto-socorro… Pasmem… Por mais que a obra tenha sido executada às pressas, sem explicações e sem debates com a comunidade, ali está um exemplo de como se pode mudar a realidade urbana, tirando dos carros a preferência e colocando ciclistas e pedestres em condições não de disputar o mesmo espaço, mas de ter o seu próprio espaço.

Nessas ruas os pedestres atravessam sem medo, a rua foi preparada para eles, os ciclistas andam fora da pista e nem precisariam andar na calçada como alguns preferem.

Se as mesmas obras tivessem sido feitas nas ruas Dom João VI e Independência e nas respectivas travessas, seguindo o que foi implantado na Sete de Setembro, implantando os binários conforme previa o projeto original, ou invés de ficarmos discutindo e debatendo outras alternativas, boa parte do centro estaria fora de discussão. Teríamos problemas com estacionamento, claro, esses nenhum governante vai acabar.

Os lojistas têm razão de não gostar da falta de espaço para estacionamento, de reclamar também, pois em muitos lugares simplesmente não há como estacionar, seja com estacionamento oblíquo ou paralelo.

Mas reclamar para quem? Quem é o culpado pela cidade ter crescido e a maioria da população ter comprado seu próprio carro?

E isso está assim em todas as cidades, o comércio é que precisa se adaptar à realidade urbana e não a realidade urbana se adaptar aos interesses dos comerciantes.

Quem precisa maior espaço para estacionamento com naturalidade vai procurar endereços – e temos espaço em abundância, para sair do centro e se adequar às necessidades dos seus clientes.

Se não fosse naturalmente assim, as lojas que vendem tratores e maquinário agrícola ainda estariam no centro da cidade, mas elas já procuraram espaços mais livres onde seus clientes têm maior conforto para estacionar.

O que precisamos compreender é que o centro da cidade não pode ser um espaço onde o veículo tem a preferência, pelo contrário, o veículo é um mal necessário e tem que ser tratado dessa forma.

Se quisermos construir uma cidade humanizada, que dá preferência aos pedestres, portadores de deficiências, crianças e idosos, vamos ter que mudar nossos conceitos, talvez alguns tenham que abandonar seus “preconceitos” e compreender que as pessoas são mais importantes como pedestres do que como motoristas e que o pedestre tem “preferência” e deve ser sempre tratado assim pelo governante. Justamente por ser a parte mais frágil, ele já está em desvantagem.

Se temos um exemplo tão claro no centro da cidade de Marechal Cândido Rondon, não há motivos para ficarmos debatendo anos e anos a mesma coisa, para ao final sempre descobrir que a cidade cresce e não terá mais espaço para todos os veículos que gostariam de estacionar.

O máximo que a prefeitura pode fazer aos que tanto querem espaço é incentivar os que têm lotes baldios, alguns plantando cana, mandioca e milho no centro da cidade, para utilizá-los como estacionamento mediante algum incentivo ou mesmo mediante pagamento de aluguel por parte dos comerciantes interessados.

Esse é o preço de querer permanecer no centro. Tem lá suas vantagens, mas também tem o ônus.

Um projeto de trânsito para uma cidade não pode ser um projeto individual, que atende aos interesses pessoais de cada cidadão. Se continuarmos pensando e agindo assim, vamos encher a cidade de quebra-molas, implantar um sistema de estacionamento em cada quadra e ver o caos prosperando.

Um sistema de trânsito é como a rede de esgoto, todos querem, mas na hora de implantar cada um faria de um jeito.

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