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Elio Migliorança

Passe livre para o crime

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Enquanto as atenções focam o debate nacional em torno das reformas necessárias, nos subterrâneos do poder vai sendo celebrada uma missa negra em louvor à bandidagem que fez dos cargos políticos um salvo conduto para livrá-los do alcance da Justiça. O famigerado foro privilegiado foi sinônimo de impunidade durante muitos anos. Aos poucos foi sendo questionado e quase banido da legislação nacional. O avanço das investigações na Operação Lava Jato alcançou muitos políticos e empresários corruptos e os meteu na cadeia, gesto que lavou a alma nacional, ao festejar o fim da impunidade para os poderosos.

Muitos políticos em pleno mandato saíram da poltrona direto para o presídio. Claro que isso desencadeou um movimento contrário de gente graúda tentando salvar a própria pele e prevenindo-se de futuras prisões. Importante lembrar que as prisões de parlamentares precisavam da autorização do Parlamento para que se concretizassem. Esta proteção ao parlamentar acabou criando situações bizarras em que acusados de crimes cometidos antes de sua eleição estavam protegidos pelo mandato e, assim, fora do alcance da Justiça.

Nas Assembleias Legislativas o número de parlamentares acusados dos mais diversos crimes, especialmente de corrupção, passa longe de uma centena de casos. Só na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro há cinco deputados na cadeia. Pois bem, um processo que tramita no Supremo Tribunal Federal (STF), iniciado em 2017 e ainda não concluído, estava indo muito bem ao permitir que o deputado seja preso sem a autorização dos colegas deputados. Naquele ano o ministro Dias Toffoli havia votado contra o direito das Assembleias Legislativas de revogar uma ordem de prisão decretada pela Justiça. No último dia 08 o processo, ainda em andamento no STF, deu uma guinada e Dias Toffoli mudou seu voto, dando poder às Assembleias Legislativas para revogar a ordem judicial e tirar da prisão o colega preso. É uma decisão que concede o passe livre para o crime, já que, muitas vezes, a prisão é decretada por crimes praticados antes do início do mandato ou outros crimes que nada têm a ver com a atividade parlamentar, indo da corrupção ao assassinato.

Quando a gente acha que as coisas estão tão ruins que parece termos chegado ao fundo do poço, vem alguém e consegue fazer a moralidade nacional descer um pouco mais. Vários ministros ficaram indignados, como nós ficamos, e afirmaram que permitir às Assembleias Legislativas reverter as prisões favorece a corrupção e pode tornar o Legislativo em reduto de marginais.

Depois desta atitude, como pode o ministro-presidente do STF achar estranho que as pessoas gritem dizendo que o STF é uma vergonha?

Evidente que é preciso separar o joio do trigo e não colocar todos dentro do mesmo balaio. Temos visto ministros com atitudes corajosas e que primam pela defesa dos interesses do Brasil e dos brasileiros, mas decisões como esta fogem do alcance de compreensão das pessoas de bom senso. Porém, não percamos a esperança, este governo e o projeto anticorrupção enviado pelo ministro Sérgio Moro ao Congresso Nacional podem consertar este e outros estragos causados por decisões que vão na contramão da moralidade pública.

Faça cada um sua parte, pois a sociedade é a somatória do que cada um faz.

 

O autor é professor em Nova Santa Rosa

miglioranza@opcaonet.com.br

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