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Elio Migliorança

PEC sem vergonha

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A rapidez das comunicações nos permite saber em tempo real o que ocorre no país, como é o caso do debate na Câmara dos Deputados da “PEC da Imunidade Parlamentar”. PEC é a sigla que indica uma Proposta de Emenda Constitucional, uma alteração constitucional que só pode ser feita pelo Congresso Nacional. Emenda constitucional deveria ser rara e apenas em temas muito relevantes.

Nós temos uma das mais extensas constituições do mundo e já tem um monte de remendos que são as PECs. Só para comparar, a Constituição dos Estados Unidos tem mais de 230 anos e tem apenas 27 emendas. A Constituição do Brasil tem 32 anos e já tem 108 emendas constitucionais. E tem mais esta a caminho, popularmente chamada de “PEC da Impunidade” ou como o título deste artigo sugere, “PEC sem vergonha”.

Só para esclarecer, a imunidade parlamentar é um princípio constitucional importante, pois protege os parlamentares quando emitem opiniões ou votos sobre determinado tema ou projeto de lei no Congresso Nacional. Nenhum parlamentar pode ser penalizado pela opinião ou posição que assumir diante de um projeto ou das denúncias ao fiscalizar os demais poderes da República. Contudo, se fizer acusações sem provas, pode ser processado e julgado pela Justiça, algo que querem impedir com esta PEC.

Ao longo dos anos, esta figura da imunidade parlamentar acabou servindo de escudo protetor para todo o tipo de crime, pois virou prática comum serem eleitos e com isso a Justiça não conseguiu mais alcançá-los. A partir da prisão do deputado federal Daniel Silveira, que fizera ataques virulentos e com palavras do mais baixo calão a ministros do Supremo Tribunal Federal, surgiu um forte movimento de autodefesa dos deputados federais com uma proposta imoral que, se aprovada, colocará os parlamentares acima da lei e da ordem.

Se esta imoral proposta for aprovada, na prática os parlamentares ficam blindados contra qualquer tipo de crime que tenham cometido. O mais incrível é que quando a proposta foi apresentada ela teve 304 votos a favor da sua admissibilidade, uma vergonha nacional se considerarmos o momento difícil que o país está passando, já na casa dos 270 mil mortos, boa parte vítimas do descaso e da incompetência do governo para antecipar ações que pudessem evitar parte do caos que vivemos, e aí a Câmara dos Deputados passa a gastar tempo criando escudos de autoproteção contra um leque de crimes que dão cadeia quando cometidos por pessoas comuns.

Além de proibir o afastamento dos criminosos por via judicial, determina que somente o Conselho de Ética do próprio Congresso tem poder para decidir a penalidade. Popularmente isso significa colocar a raposa para cuidar do galinheiro ou o vampiro para tomar conta do banco de sangue.

Felizmente dentro do próprio Parlamento já existem manifestações contrárias a esta tentativa para transformar réus em reis. Um absurdo e uma afronta ao povo brasileiro.

É urgente nos mobilizarmos, manifestar por todos os meios possíveis nosso repúdio e revolta contra esta iniciativa que transforma políticos em intocáveis. O sonho de todos nós, e o que devemos exigir, é o fim do foro privilegiado, a prisão após condenação em segunda instância e o fim da imunidade parlamentar. Seguir o mais básico princípio constitucional: todos são iguais perante a lei.

 

O autor é professor em Nova Santa Rosa

miglioranza@opcaonet.com.br

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