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Arno Kunzler

Um papa para o povo

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As últimas escolhas dos cardeais, e principalmente essa que escolheu o novo sumo pontífice, não deixam dúvidas sobre o que se pretende de Francisco.
Um homem inspirado pela humildade – que não só prega, mas também pratica.
O papa que tem uma enorme empatia com as pessoas, o povo na rua, nas favelas, nos grandes centros urbanos como Buenos Aires e não muda seu jeito.
É pouco provável que Francisco vá mudar seus hábitos simples por causa das exigências e daquela pompa que cerca um papa.
Até ali, Francisco deve levar vantagem com o seu jeito, o jeitão simplório, humilde por opção, simpático e falante.
Virtudes que nem João Paulo II tinha com tanta fartura, embora esse era mais jovem e muito mais vigoroso, porém mais comedido nas aparições e nas manifestações.
Mas João Paulo II ficou muito tempo vivendo um martírio suportado somente pela condição de não lhe permitirem a renúncia.
Ninguém se atreveria a uma sugestão dessa natureza para um papa que conquistou o mundo, conquistou o povo católico e fez a Igreja ser mais simpática perante outras religiões e com uma impressionante participação política.
Não fosse a força política do papa João Paulo II, talvez ainda vivêssemos sob a pressão da Guerra Fria e do muro da vergonha.
Mesmo assim, com esse vigor popular, essa força política e o entusiasmo de um papa jovem e motivado para percorrer o mundo, a Igreja não conseguiu evitar a perda de fiéis, o distanciamento de outros e nem a sucessão de escândalo com envolvimento de religiosos.
E pior, a chamada Cúria Romana, uma espécie de cúpula da Igreja Católica, não conseguiu administrar o Vaticano, um minúsculo país onde fica a sede da Igreja Católica, envolta da Basílica de São Pedro e da famosa Capela Sistina, onde acontece o conclave para escolher os novos papas.
Talvez por essa razão foi escolhido um homem de pouca presença, de pouca empatia, de poucas palavras e gestos sem emoção para suceder João Paulo II.
O cardeal Joseph Ratzinger foi eleito para “gerenciar” uma igreja adoecida durante o longo e penoso pontificado de João Paulo II, pelos escândalos e pela perda de fiéis, produzindo manchetes negativas quase que diariamente nos grandes veículos de comunicação do mundo.
Bento XVI não conseguiu estancar as feridas que continuaram produzindo manchetes, nem a perda de fiéis e ainda se envolveu em questões polêmicas com o islamismo, e nem passar aos católicos uma imagem de “Santo Padre”, capaz de mover multidões.
Muitos católicos tinham cada vez menos motivação para se mobilizar em torno de uma Igreja envolvida em escândalos e cuja liderança não era fator de mobilização.
Eis que Ratzinger renuncia e em 20 dias, entre o anúncio e a renúncia efetiva, talvez tenha feito mais pela Igreja do que nos anos que permaneceu como papa.
Senão pelo legado, mas pela exposição das feridas que o levaram à renúncia.
Pelas suas últimas manifestações que apontavam claramente para a necessidade de uma reforma profunda no catolicismo.
Também pelo fracasso de suas ações de combate aos escândalos.
Era certo que a Igreja não poderia sobreviver imune a tantas notícias ruins.
Então, surgiu na janela da sacada, Francisco.
Por enquanto, em suas poucas aparições, mostrou ser notável na arte de conquistar a mídia, na arte de se comunicar e promover uma nova ideia de Igreja, uma igreja com opção preferencial para os pobres.
Difícil imaginar isso a partir de Roma, para quem conhece, sabe. Mas sempre vale acreditar, sobretudo num começo tão promissor.
Francisco conseguiu produzir notícias positivas em todo mundo.
Por enquanto, já é um vencedor, propondo uma ação missionária bem definida e convicções que estão sendo bem recebidas.
Mas e os escândalos?
Será que essa enorme generosidade com os pobres e capacidade de comunicação resolverão os problemas que até então atormentavam os papas e os católicos, que proporcionaram a renúncia de Bento XVI? Especialmente os escândalos envolvendo padres e bispos e também os problemas que circundam os cardeais que trabalham ali, ao lado da casa do papa no Vaticano?
Será que esse homem generoso, cheio de bondade, verdadeiramente franciscano, terá personalidade e força política para vencer a batalha interna no Vaticano?
Essa resposta teremos somente quando o conclave se reunir novamente para escolher o sucessor de Francisco.

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