O Presente
Arno Kunzler

O que dizer agora?

calendar_month 28 de outubro de 2014
3 min de leitura

Talvez seja oportuno refletir sobre o que aconteceu domingo (26). Não foi uma simples eleição de presidente da República. O Brasil que saiu das urnas está inquieto, intolerante e agressivo.

A disputa eleitoral provocou ressentimentos dos mais diversos, fruto de acusações mútuas e a nefasta pregação de que somos ou ricos ou pobres, nós ou eles… Como consequência desse jogo eleitoral, colhemos o que estamos vendo desde a noite de domingo nas redes sociais: uma grande parte da população não quer aceitar o que aconteceu.

E essa não aceitação não é obviamente um sentimento de um povo que prima pela liberdade democrática. Esse sentimento foi construído durante a campanha e a presidente Dilma Rousseff percebeu isso com muita clareza. Tanto é que no seu discurso, após ser declarada eleita, conclamou a todos para o diálogo.

A percepção da presidente é que o Brasil ficou mais difícil de ser governado depois desta campanha eleitoral, embora as disputas acirradas também oferecem alternativas.

Primeiro porque ficou claro que a região Su/Sudeste apoiava um candidato majoritariamente e o Norte/Nordeste outra candidatura.

Todos sabem que com 59 milhões de brasileiros recebendo Bolsa Família há muitos votos de cabresto e de medo. Esse é o fato que provoca a grande revolta, que provoca a intolerância dos eleitores que queriam mudar.

O nosso regime democrático para ser justo e representativo precisa se desvencilhar dessas amarras que no passado foram duramente criticadas pelos próprios líderes do PT, quando essa prática era comum, também no Nordeste, mas por iniciativa dos “coronéis”, os homens mais ricos e poderosos que compravam votos para seus candidatos.

De fato não mudamos nada, mas o benefício que antes era oferecido pelos coronéis, agora é oferecido pelo governo.

O Brasil, do PT ou de qualquer outro partido governante, precisa vencer essa etapa.

Não se questiona a vitória da presidente Dilma, nem o resultado, afinal, numa democracia, pobres, ricos, negros, brancos, sulistas e nordestinos, votos do medo e de cabresto têm o mesmo peso.

O que não é bom é essa inegável alienação de muitos eleitores.

Pode-se dizer que o Brasil que queria mudanças votou diferente do Brasil do Bolsa Família, que votou pela continuidade.

E nisso repetimos praticamente 1982, quando o Brasil que queria democracia votou no PMDB e o Brasil nordestino, alienado como hoje, votou pela permanência do PDS, então sucessor da Arena, partido que dava sustentação ao regime militar.

A diferença é que naquela eleição só foram eleitos governadores, senadores, deputados, prefeitos e vereadores. Não havia eleição para presidente.

É só comparar o mapa dos vencedores de 1982 com a eleição de 2014 e ficará muito claro que o reflexo desta eleição num regime (democrático?) é muito parecido com o reflexo da eleição de 1982 (durante a ditadura), quando o Brasil queria liberdade democrática.

Muitas coisas precisam mudar, sob pena da presidente Dilma não ter êxito em seu segundo mandato. Ela mesma já reconheceu isso no seu primeiro discurso e disse mais, que a palavra que mais se ouviu durante toda campanha foi MUDANÇA.

O difícil é acreditar que a presidente Dilma terá condições políticas para mudar o que de fato precisa ser mudado, o que o Sul quer mudar.

E o que precisa ser mudado para os sulistas que votaram por mudanças talvez não seja o que os nordestinos querem. Estabeleceu-se, portanto, um conflito de interesses entre uma região e a outra.

E esse conflito, se não for contido, vai provocar reações como as que já se ouve, movimentos separatistas. E isso é ruim para o Brasil e péssimo para o governo da presidente Dilma.

 

(O autor é jornalista e diretor do Jornal O Presente e da Revista Amigos da Natureza)

 
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