A emenda constitucional aprovada na noite de terça-feira (16), chamada de PEC da Blindagem, é exemplo claro de como as instituições se enxergam neste momento.
De um lado, o Congresso Nacional, a todo instante afrontado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) – e nesta semana de uma forma ainda mais truculenta por causa do julgamento de Jair Messias Bolsonaro.
O Congresso está em pé de guerra com o STF, mas tem poucas armas para agir.
Destituir um ministro, por exemplo, é atualmente uma vontade quase generalizada dos congressistas e boa parte da população também.
Mas qualquer iniciativa esbarra no medo dos deputados e senadores de consequências indigestas, tanto de processos que podem ser deles, de algum familiar ou de seus aliados.
O medo dos congressistas de serem perseguidos impede qualquer iniciativa que visa dificultar as ações do STF.
Então, sob a ótica do Parlamento, pelo menos parte dele, a PEC que deseja impedir que o Supremo inicie ações contra qualquer parlamentar ou presidente de partido se justifica.
Todavia, como podemos imaginar, se os parlamentares já estão protegidos hoje, se a PEC virar lei, ficarão de fato blindados; poderão agir livremente contra ações que julgam inoportunas, injustas ou ilegais, como alegam ser as ações contra os bolsonaristas.
Para o STF abrir uma ação contra um deputado ou senador, terá que pedir licença ao Parlamento, que, antes, precisará “autorizar” o Supremo a dar andamento.
O STF está aguçado e promete reagir se a PEC for aprovada no Senado Federal e virar lei.
É difícil tomar partido, porque se o povo costuma eleger pessoas desqualificadas, bandidos e corruptos, esses vão legislar sem nenhuma preocupação com suas ações que estão sob a custódia do Congresso.
Só ele poderá autorizar os que deverão e serão julgados pelo STF.
Se o espírito corporativo já impera hoje no Congresso, com uma lei dessas basta estar de bem com seus pares e cometer crimes à revelia que nada vai acontecer.
Podemos sair de um extremo, onde o STF tem poderes demais, para mergulhar num abismo onde os deputados se tornam intocáveis, livres para cometer crimes que jamais serão alcançados pela Justiça.
Está muito difícil, sob o clima tenso das recentes condenações, chegar a um equilíbrio que possa fazer nossas instituições funcionarem livremente, sem medo do STF e sem coragem demais, porque estão blindadas.
É provável que a PEC sofra restrições e muita pressão no Senado, que ainda pode impedir o andamento, mas, se for para votação, é bem provável que seja aprovada.
Se a blindagem for bem usada, pode ser o primeiro passo para mudar o Poder Judiciário, a começar pelo STF, mas o objetivo é usá-la para proteger parlamentares encrencados com ações judiciais, e aí pode se tornar um desastre e mergulhar o prestígio das instituições definitivamente para o fundo do poço, onde muitos acham que elas já estão.
arno@opresente.com.br
@arnokunzler
Quer ler mais artigos do Arno Kunzler? Clique aqui.