Neste penúltimo Domingo do Tempo Comum (16/11), a Liturgia nos convida a olhar para o futuro não com medo, mas com fé. Os textos bíblicos falam de destruição, perseguição e provações, mas não para nos amedrontar. São palavras que iluminam a esperança do cristão diante das turbulências da história. Quando Jesus anuncia que “não ficará pedra sobre pedra” (Lc 21,6), Ele não está ameaçando, mas ensinando a não colocar nossa segurança em realidades passageiras — templos, poderes, riquezas, ou instituições humanas. Tudo o que é humano é frágil e passageiro. Somente Deus é eterno. É nesse fundamento que se constrói a fé verdadeira.
Jesus está em Jerusalém e observa as pessoas admirando a beleza do Templo — pedras magníficas, reluzentes, sólidas. Mas, por trás dessa admiração, há distração. O fascínio pelo exterior faz esquecer o essencial. Por isso, Jesus fala com palavras duras: “Não ficará pedra sobre pedra”. Ele não quer destruir, mas despertar. Suas palavras são um chamado a olhar mais fundo: o que acontece quando tudo o que julgávamos sólido começa a ruir?
O Templo era o centro da vida religiosa, política e social de Israel — símbolo da estabilidade. Quando Jesus anuncia sua destruição, está tocando no ponto mais sensível do coração humano: o medo de perder o que nos sustenta.Todos nós temos “templos” assim — seguranças, certezas, pessoas, situações que parecem inabaláveis. Mas, cedo ou tarde, algo nos obriga a encarar o colapso: uma doença, uma crise, um fracasso, uma perda. Então, torna-se inevitável uma pergunta: em que ou em quem temos colocado a nossa confiança?
O medo é uma reação natural diante da instabilidade. Porém, se não for iluminado pela fé, torna-se uma prisão. Muitos, como os admiradores do Templo, preferem distrações a encarar a verdade. Refugiam-se no consumo, nas redes, nas promessas fáceis — qualquer coisa que evite o contato com a própria fragilidade.
Outros se deixam arrastar pelo desespero e pelas visões apocalípticas: tudo está perdido, o mundo acabou, nada mais vale a pena. Jesus, porém, nos adverte: “Não se deixem enganar.” O medo é terreno fértil para os falsos messias que oferecem salvadores substitutos, mas roubam a liberdade interior e a esperança.
Jesus propõe outro caminho: a perseverança. “Com a vossa perseverança salvareis as vossas almas.”Perseverar é permanecer de pé no meio do terremoto, não porque somos fortes, mas porque sabemos em Quem confiamos. É suportar com fé, não fugir da realidade, mas habitá-la com esperança. É olhar para o caos e dizer: “Deus está aqui também”.
Nada do que vivemos — nem mesmo as perdas mais duras — escapa ao olhar amoroso de Deus. Ele promete: “Nem um fio de cabelo da vossa cabeça se perderá.” Essa imagem é de uma ternura imensa: Deus nos conhece por inteiro, guarda cada detalhe, acompanha cada passo.
O Evangelho deste domingo não fala do fim, mas do recomeço possível. As crises não são o apocalipse, mas ocasião de testemunho. O cristão não é aquele que ignora o sofrimento, mas aquele que o atravessa com fé e o transforma em oportunidade de amor.
Este domingo nos ensina que a fé autêntica nasce da perseverança e se fortalece na responsabilidade. Não vivemos à espera de um fim catastrófico, mas da plena manifestação do amor de Deus, que já atua no mundo através de nossas mãos e corações.Enquanto aguardamos o “sol da justiça” que virá, somos chamados a trabalhar pela paz, a cuidar da criação, a resistir ao mal e a semear esperança.
“Nem um só cabelo da vossa cabeça se perderá” (Lc 21,18). Quem confia no Senhor, mesmo em meio às ruínas, descobre que a fidelidade de Deus é o verdadeiro alicerce da história.
Por Dom João Carlos Seneme. Ele é bispo da Diocese de Toledo
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