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Dom João Carlos Seneme

De quem eu quero ser próximo?

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A liturgia deste domingo (10) nos oferece a parábola do Bom Samaritano (Lc 10,25-37). Esta parábola foi contada por Jesus para responder à pergunta: “Quem é o meu próximo”? O próprio especialista da lei conclui no final, ao responder à pergunta de Jesus, que o próximo é aquele que mostra misericórdia.

A ética de São Lucas poderia ser definida como “ética da responsabilidade”. A obra de São Lucas (Evangelho e Atos dos Apóstolos) aponta a fé como aceitação e cuidado do outro: na sua diversidade e liberdade, na sua grandeza e no seu pecado. O Deus da responsabilidade é o Deus que cuida da vida do outro.

O episódio do escriba que pede a Jesus esclarecimento sobre o coração da lei é colocado por São Lucas no início da viagem de Jesus a Jerusalém. Ele quer indicar que o caminho de Cristo (e do cristão) é direcionado a uma escolha radical: o amor a Deus “com todo o coração, com toda a alma e com toda a força” e o amor ao próximo caminham juntos.

Toda lei dos judeus se resume no amor a Deus e no amor ao próximo.
O escriba pede algo impossível. Ele deseja um meio de garantir a vida eterna, a salvação, e quer que Jesus lhe diga o que fazer. Naquele tempo seguir os mandamentos dava garantias de ser um bom religioso e garantir um lugar no céu.

Jesus esclarece esta mentalidade. Quem concede a salvação e a vida eterna é Deus; não existe uma “receita” pronta que nos dê certezas de que vamos conseguir a vida eterna pelas nossas próprias forças.

A salvação é dom de Deus e não prêmio pelo nosso bom comportamento. Porém, existem escolhas e comportamentos que nos dão indícios que estamos no caminho certo. Deste modo, Jesus apresenta a parábola do bom samaritano como meio de reflexão para conduzir à conversão e mudança de mentalidade.

Por isso a parábola se torna significativa principalmente pelo comportamento dos personagens. O sacerdote e o levita prestavam serviço no templo, eram homens de bem e acreditavam no que faziam, mas não conseguiram ir além de suas obrigações e não foram capazes de acolher um homem em dificuldades. Como se dirigiam ao Templo para a liturgia, não poderiam se contaminar com o sangue daquele homem ferido. A religião se tornou um fim em mesma e não uma abertura a Deus e aos irmãos.

Jesus, ressaltando o comportamento do samaritano, considerado pelos judeus impuro e sem religião, incapaz de um gesto de caridade quer estabelecer um grande contraste entre o comportamento de dois homens da lei e a atitude de um estrangeiro samaritano. Os primeiros, diante do homem ferido, passam o mais longe possível, enquanto o samaritano se aproxima do homem ferido e o trata como um irmão: “Fez curativos, derramando óleo e vinho nas feridas. Depois colocou o homem em seu próprio animal e levou-o a uma pensão, onde cuidou dele”.

Finalmente, Jesus responde aos seus interlocutores apontando o caminho para a vida eterna: o único meio para obter a vida eterna é fazer-se dom para os outros, deixar-se comover pelo sofrimento dos outros e doar a própria vida pelos outros. O sacerdote e o levita não querem se contaminar com o sangue daquele homem porque se tornariam impuros e não poderiam participar da liturgia. O samaritano, ao contrário, muda o seu trajeto, cuida do homem e se responsabiliza por ele, sem querer saber quem ele é. Ele salva vida daquele homem.

Amar o próximo é ajudá-lo a viver, oferecer-lhe os meios para viver. Amar o próximo como a si mesmo é tratá-lo como ser humano, considerá-lo um filho. Só assim poderemos pedir que Deus nos trate como filho e nos faça herdeiros da vida eterna.

Somos chamados a repetir o gesto solidário do bom samaritano, socorrendo as pessoas necessitadas. Cristo, o Senhor do universo, que doou sua vida por todos, nos ensine a viver a compaixão, a misericórdia, a gratuidade sem medidas.

Dom João Carlos Seneme é bispo da Diocese de Toledo

revistacristorei@diocesetoledo.org

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