Deixemo-nos tocar pela imagem serena e profunda que abre o Evangelho de hoje: Jesus está em oração. Um discípulo – que poderia ser qualquer um de nós – o observa em silêncio e sente o desejo de aprender a rezar como Ele. Essa cena nos convida a parar, contemplar e reconhecer que, ainda hoje, o Senhor continua presente em cada espaço da nossa vida, intercedendo por nós com sua oração silenciosa e fiel.
Com frequência, reduzimos a oração a uma lista de pedidos. Mas o Evangelho nos ensina que ela é, antes de tudo, um olhar: olhar para Jesus, que nos revela o rosto do Pai. E, ao olharmos para o Pai, aprendemos a olhar o mundo, não mais a partir de nossas carências, mas a partir da necessidade dos nossos irmãos, filhos do mesmo Pai. A oração nos descentra de nós mesmos para nos recentrar na comunhão.
Ao ensinar o Pai Nosso, Jesus não oferece uma fórmula mágica, mas um caminho de conversão: dizer “Pai” é entrar em uma relação viva, filial, que transforma o coração. Desde os primeiros tempos, os cristãos rezavam essa oração três vezes ao dia, como quem marca o ritmo da vida com o compasso da confiança. Não é a quantidade de palavras que define a oração cristã, mas a disposição de permitir que ela nos transforme.
Abraão é um belo exemplo dessa oração transformadora. Ele se coloca diante de Deus, não para pedir algo para si, mas para interceder pelos outros. Abraão acaba de receber a visita de três viajantes misteriosos onde vive em uma tenda, sinal de simplicidade e disponibilidade, enquanto Sodoma e Gomorra se fecharam em muros, tornando-se cidades de pedra cercadas por muros onde o estrangeiro não é bem-vindo. Deus quer reconduzir o coração humano ao deserto, onde poderá novamente ouvir a sua voz. Abraão não negocia com Deus por conveniência, mas se arrisca no diálogo, ousa pedir, sofre com a possibilidade da perdição dos outros. Mas sua intercessão se esgota nos “dez justos”. É Cristo quem leva essa oração até o fim, entregando-se totalmente por amor. Ele não apenas intercede, mas oferece a si mesmo – sua vida se torna a prece encarnada.
No Pai Nosso, aprendemos que chamar Deus de Pai é também assumir o compromisso de nos tornar pai, mãe, irmão e amigo para os outros: presença, cuidado, misericórdia. A oração cristã é compromisso com a vida, não fuga dela. Ela é uma força que pode transformar o mundo – mas somente se transformar primeiro o nosso coração.
No final do Evangelho, Jesus revela o segredo dessa transformação: o dom do Espírito Santo. É Ele quem nos ajuda a discernir e encarnar a nossa conformação a Deus, que é Pai segundo o coração de Cristo Senhor. Quando oramos, não buscamos apenas respostas, mas deixamo-nos modelar pelo Espírito, para que nossa vida se torne, como a de Jesus, uma oração viva.
A celebração eucarística é o lugar privilegiado para o encontro com Deus. Ele habita em seu templo santo e nos reúne em sua casa para nos dar força e poder. “Ó Deus, amparo dos que em vós esperam, sem vós nada tem valor, nada é santo. Multiplicai em nós a vossa misericórdia” (Oração do Dia).
Por Dom João Carlos Seneme. Ele é bispo da Diocese de Toledo
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