Enquanto o vírus não dá sossego para ninguém, vamos lutando e nos reorganizando na esperança de que o “novo normal” seja parecido com aquele que tínhamos antes da primeira contaminação pela Covid-19 em 2020. De lá para cá, o mundo ficou de ponta cabeça e ainda não podemos respirar aliviados. Mas alguns setores do cotidiano não foram afetados pela pandemia; continuaram em expansão. Um deles é a criminalidade.
Os crimes de feminicídios chegaram aos mais distantes rincões. Somados aos demais crimes já conhecidos, como estupros e profissionais que abusam de pacientes ou larápios que roubam os incautos, chegam à casa dos milhões.
Não temos um sistema prisional que recupere aqueles malandros que assim o desejam, bem como nossas leis não correspondem, na maioria das vezes, ao prejuízo irrecuperável causado por muitos desses crimes. Mas, algumas vezes, os brasileiros respiram aliviados porque um notório criminoso foi finalmente condenado, às vezes depois de dezenas de medidas protelatórias, e a condenação traz um número de anos assombroso: 132 anos de prisão ou até mais que isso.
Os brasileiros comuns imaginam que o condenado vai terminar seus dias na prisão. Ledo engano. É aí que entra a máxima de que em muitos casos, anos não são anos, ou em certas sentenças há anos que não contam.
Um notório médico de renome nacional, especialista em reprodução humana, foi acusado de mais de 50 estupros e outros crimes mais. Alcançado pela Justiça, foi julgado e condenado a 278 anos de prisão. Como mesmo na dor somos bons humoristas, alguns brincaram dizendo que o condenado deveria ser proibido de morrer antes de cumprir toda a pena.
Preso em 2014 depois de ficar três anos foragido, foi finalmente encarcerado. Sete anos depois, isto é, em 2021, o condenado já está cumprindo prisão domiciliar e logo estará nas ruas.
Assim como este caso, há milhares de outros criminosos confessos que mataram friamente, muitas vezes sem que as vítimas tivessem esboçado qualquer tipo de reação. Há também os criminosos do trânsito, que raramente são punidos como deveriam, e quando se acredita que foi feita justiça às vítimas com a condenação do criminoso, em pouco tempo ele está nas ruas matando de novo.
Quantas mulheres perderam a vida, vítimas de ex-maridos ou ex-companheiros, os quais nunca pagaram pelo crime cometido. E aí chegamos ao ponto. Os anos que não contam, ou seja, aqueles anos assombrosos da sentença judicial, soam como uma piada de mau gosto a incentivar o criminoso já que ele não vai cumprir o que está na sentença.
Na minha opinião, temos dois problemas graves: uma legislação arcaica e ultrapassada que beneficia os criminosos, pois a impunidade é a mãe de novos crimes; e um Legislativo Federal que não faz o dever de casa, já que é deles a responsabilidade pela mudança da legislação para punir os criminosos.
É urgente que todos os agentes políticos, dos vereadores aos governadores, e as entidades organizadas, sejam elas municipais, estaduais e federais, movimentem-se para cobrar uma mudança na legislação. Omitir-se é apoiar a impunidade que vai continuar matando. É um longo caminho, mas se não dermos o primeiro passo, ficaremos deitados eternamente num berço que de esplêndido só tem o nome.
O autor é empresário rural, professor aposentado e ex-prefeito de Nova Santa Rosa
