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Naturalização da violência contra as mulheres

calendar_month 21 de agosto de 2024
5 min de leitura

A violência contra as mulheres é um problema grave e persistente em sociedades ao redor do mundo. Embora, muitas vezes, percebida como um conjunto de incidentes isolados, a violência de gênero é, na verdade, um fenômeno profundamente enraizado nas estruturas sociais e culturais. A naturalização dessa violência – ou seja, a aceitação inconsciente ou consciente de comportamentos violentos como normais ou inevitáveis – desempenha um papel crucial na perpetuação dessa crise. Conforme destaca a socióloga Heleieth Saffioti, a violência contra as mulheres é uma expressão da desigualdade estrutural de gênero, que se manifesta tanto em espaços privados quanto públicos.

Historicamente, a violência contra as mulheres tem sido legitimada por meio de narrativas culturais, religiosas e sociais que perpetuam a ideia de inferioridade feminina. Esses discursos, muitas vezes, são internalizados tanto por homens quanto por mulheres, contribuindo para a manutenção de um ciclo vicioso de violência e subjugação.

Simone de Beauvoir, em sua obra seminal “O Segundo Sexo”, argumenta que a construção social da mulher como “o outro” reforça sua subordinação e justifica a violência. Ao analisar esses fatores e suas consequências, podemos começar a desvendar as complexas dinâmicas que sustentam a violência de gênero e buscar soluções mais eficazes para combatê-la.

A naturalização da violência contra as mulheres está profundamente interligada às construções sociais de gênero. Desde a infância, meninos e meninas são frequentemente expostos a estereótipos de gênero que reforçam a ideia de masculinidade como sinônimo de poder e agressividade, enquanto a feminilidade é associada à submissão e passividade.

Pierre Bourdieu, em “A Dominação Masculina”, discute como essas normas de gênero são internalizadas e reproduzidas, criando um ambiente em que a violência masculina é frequentemente justificada ou minimizada. Estudos mostram que crianças que crescem em lares onde a violência é comum são mais propensas a aceitar essa dinâmica como normal na vida adulta, perpetuando o ciclo de violência.

Além disso, a legislação e as políticas públicas muitas vezes falham em oferecer proteção adequada às vítimas de violência doméstica, o que reforça a percepção de impunidade e desamparo. Em muitos países, a aplicação da lei é insuficiente ou ineficaz, e as vítimas enfrentam barreiras significativas ao buscar justiça e apoio.

Heleieth Saffioti destaca que a falta de resposta efetiva do Estado contribui para a perpetuação da violência, desmoralizando as vítimas e fortalecendo os agressores. Este ambiente de impunidade não apenas desmoraliza as vítimas, mas também envia uma mensagem perigosa de que a violência contra as mulheres é tolerada pela sociedade. Para quebrar este ciclo, é crucial que as instituições adotem políticas rigorosas e forneçam os recursos necessários para apoiar as vítimas e punir os agressores de maneira justa e eficaz.     

A educação desempenha um papel crucial na desconstrução das normas de gênero que naturalizam a violência contra as mulheres. Judith Butler, em “Problemas de Gênero”, argumenta que o gênero é performativo e que a repetição de atos de conformidade às normas de gênero reforça a violência estrutural. Programas educacionais que promovem a igualdade de gênero e questionam os estereótipos tradicionais têm o potencial de transformar as percepções sociais e reduzir a aceitação da violência. Esses programas devem ser implementados em todos os níveis de ensino e envolver a comunidade como um todo, garantindo que as mudanças culturais necessárias sejam sustentáveis a longo prazo.

A naturalização da violência contra as mulheres é um problema complexo que requer uma abordagem multifacetada para ser eficazmente enfrentado. A transformação dessa realidade exige mudanças profundas nas normas culturais e sociais, bem como reformas institucionais que garantam a proteção e o apoio às vítimas. A educação desempenha um papel central nesse processo, promovendo valores de igualdade e respeito desde a infância. Somente através de um esforço coletivo e contínuo será possível desmantelar as estruturas que perpetuam a violência de gênero e construir uma sociedade mais justa e segura para todas as mulheres.

Referências bibliográficas

– BEAUVOIR, Simone de. O Segundo Sexo. Rio de Janeiro,  Nova Fronteira, 2009.

– BOURDIEU, Pierre. A Dominação Masculina (trad. Maria Helena Kühner) Rio de Janeiro: Bertrand Brasil. 1999.

– BUTLER, Judith. Problemas de Gênero: Feminismo e Subversão da Identidade. Civilização Brasileira. Rio de Janeiro, 2003.

– SAFFIOTI, Heleieth. Gênero, Patriarcado, Violência. São Paulo, Fundação Perseu Abramo, 2004.

Autoras

Edna Vaz Battistella, pedagoga do Núcleo Maria da Penha (Numape) – Unioeste, campus de Marechal Cândido Rondon

Marhaian Figueroz Bello, graduanda em História do Colegiado de História da Unioeste, campus de Marechal Cândido Rondon

QUEM SOMOS

O Numape é um projeto de extensão da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste), campus de Marechal Cândido Rondon. Faz parte da Superintendência Geral da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (Seti), do Governo do Estado do Paraná.

O Numape promove o acolhimento jurídico de forma gratuita e sigilosa, assegurando a tutela de seus direitos e a desvinculação do agressor para mulheres em situação de violência doméstica dos municípios de Marechal Cândido Rondon, Quatro Pontes, Pato Bragado, Entre Rios do Oeste, Nova Santa Rosa e Mercedes.

Em atuação desde 2019, o Numape realizou centenas de atendimentos jurídicos. O atendimento é realizado com uma escuta atenciosa e qualificada e todas as orientações cabíveis para cada caso são repassadas, sempre preservando a autonomia de decisão da mulher para dar seguimento nas fases processuais, que se desdobram geralmente em medidas protetivas de urgência, divórcio, dissolução de união estável, pensão e guarda dos/as filhos/as, entre outras ações. Além disso, promoveu dezenas de ações socioeducativas na comunidade em geral, alcançando inúmeras pessoas de diferentes faixas etárias e grupos sociais.

Entre em contato para saber mais sobre o serviço. O atendimento pode ser realizado pelo telefone celular e WhatsApp: (45) 99841-0892. Nos encontre também nas redes sociais. Estamos aqui por você. Até a próxima coluna!

 
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