A partir de uma sala sem divisórias nem quadro negro e com cadeiras emprestadas, Denise Veronese edificou a mais reputada escola de inglês de Cascavel

Quando o gaúcho de São Marcos, Quinto Luiz Veronese, recém-chegado a Cascavel nos anos 1970 observava orgulhosamente sua frota de 10 caminhões Scania enfileirados no pátio da empresa, e via a gurizada correndo no entorno, jamais poderia imaginar que
entre aquelas quatro crianças surgiriam músicos, poliglotas, empreendedores e
até uma apresentadora de TV, Silvana, uma das vitrines da família Veronese.
Ali também estava – na condição de filha do meio – a sempre agitada Denise, menina que brincava de dar aulas para as bonecas no porão da casa. Amante dos idiomas, Denise construiria anos mais tarde a mais conceituada escola de inglês da cidade, a New York School, que acaba de completar 35 anos.
A “professorinha” do porão nunca se contentou com menos que a liderança.
Começou com capital zero, cadeiras emprestadas em um salinha sem divisórias.
Anos depois construiu uma escola de 1,1 mil metros quadrados, dotada dos melhores recursos tecnológicos do mercado, incluindo as sofisticadas lousas digitais.
35 anos depois, com um filho trabalhando no Google e outro em uma multinacional de finanças nos EUA, Denise sequer cogita se aposentar.
Quem passar ali pela rua Duque de Caixas no meio da manhã vai ver a teacher chegando com um sorriso no rosto e disposição contagiante. É assim a rotina dela há mais de três décadas, administrando um negócio que funciona todos os dias, das 8 às 21 horas.
Denise Veronese recebeu o Pitoco no último dia 20 para a seguinte entrevista:
BASE FAMILIAR
Minha mãe, Maria Luiza, era 100% dedicada aos filhos (Silvana, Silvio, Denise e Luciano). Levava, buscava, sempre muito ativa na nossa vida colegial, não admitia que a gente faltasse aula, vivia para as crianças, era uma geração diferente de hoje, em que as mães foram para o mercado de trabalho. Meu saudoso pai, Quinto Luiz, passou valores como honestidade e pacificação, dizia sempre: não briguem, não arrumem confusão. Ele era
uma pessoa sempre otimista, com olhar no futuro, tanto que nos trouxe de São
Marcos (RS) ainda crianças para morar na promissora cidade de Cascavel.
LUGAR AO SOL
Sou a filha do meio, nem a primogênita, nem a caçula. Pesquisas dizem que essa posição exige mais esforço para buscar um lugar ao sol. Sempre fui esforçada e persistente. Sempre quis ter meu próprio negócio. Com 14 anos dava aulas de piano e coordenava o coral infantil do Colégio Auxiliadora. Lá troquei minhas aulas pelas mensalidades do Ensino Médio, tornei-me bolsista pagando com meu primeiro trabalho.
VIDA SIMPLES
A nossa família Veronese ficou conhecida através da música (todos os irmãos
tocavam e cantavam), e do trabalho da minha irmã, que apresentou um programa por mais de 30 anos na TV. Por mais que estivéssemos em destaque, nossas vidas sempre foram muito simples, todos tivemos que batalhar muito para ocupar nossos espaços.
NASCE A ESCOLA I
Casei-me e fomos morar em Cuiabá. Lá passamos a administrar um supermercado na cidade vizinha, Várzea Grande. Eu acabara de receber, ainda em Cascavel, o convite para fazer parte de uma franquia nacional de escolas de idiomas.
Tinha muitas dúvidas se seria capaz de encarar o desafio e a mudança para outro Estado inviabilizou as tratativas.
NASCE A ESCOLA II
Eu chorava todo dia em Cuiabá. Imagine o Mato Grosso 35 anos atrás, e eu longe da família. Minha sogra na época, Flordelyz, foi minha grande incentivadora e disse: Abra sua escola. Não vai dar, estamos no meio do ano, respondi, franquia nenhuma irá topar. Dona Flor persistiu: Você não precisa de franquia, monte a sua escola.
NASCE A ESCOLA III
Com zero capital de giro, o que tínhamos foi investido no mercado, começamos a pensar um nome para a escola, inicialmente pensei Texas, Dallas, onde morei um tempo. Dali a pouco veio o nome da capital do mundo, New York. Ali nascia a New York School, 35 anos atrás, em Várzea Grande. Dois anos atuamos lá, os outros 33 em Cascavel.
CARTOLINA VERDE
Não tinha recursos para anunciar no rádio ou no jornal. Então fui até a uma pequena gráfica, em Cuiabá, ditei a mensagem da nova escola de inglês na cidade, imprimimos do jeito mais em conta possível, uma cartolina verde com letras em preto. E saí pela principal avenida da cidade pedindo autorização aos comerciantes para colar os cartazes. Assim obtive meus primeiros alunos. Me recordo da primeira aula, eram dois aluninhos.
Depois que montei a escola, naquele mês de agosto, parei de chorar. Meu sonho estava se concretizando.
O JINGLE
Passados 6 meses de escola, meu sonho era ter um jingle como as grandes franquias, então pedi ao meu talentoso irmão Luciano para compô-lo. Quando, naquela época, recebi a fita cassete do Correio, passei meia hora com um audiofone em casa ouvindo o tão sonhado jingle: “New York School, um jeito fácil de aprender inglês”. Eu prometi a mim mesma, naquela tarde, que um dia todo mundo iria ouvir e saber cantar essa melodia. O orçamento que eu tinha me possibilitou uma semana de rádio (risos)…
Hoje em dia quando encontro alguém, e me apresento, fico feliz ao perceber que
as pessoas conhecem o jingle.
“VIM DO PARANÁ…”
Percorri a avenida toda de Várzea Grande, de ponta a ponta, dali a pouco eu já tinha 70 alunos, incluindo quatro crianças de uma família de empreendedores de Cascavel que acabei encontrando lá no Mato Grosso, de tanto repetir de comércio em comércio: “sou professora de inglês há 10 anos, vim do Paraná para montar um escola aqui…”. Nunca vou esquecer essa frase.
A PRIMEIRA
O primeiro dia de aula a gente nunca esquece. Peguei umas cadeiras emprestadas, não tinha sequer o quadro negro, muito menos divisórias. Dona Flordelyz no dia do seu aniversário (9 de agosto), ficou na porta recebendo os alunos.
Eram apenas dois na primeira turma. Uma das alunas daquela primeira aula depois se tornou professora de inglês.
Esses dias me ligou para agradecer. Foi muito marcante.
PAIXÃO PELA CAUSA
Desde criança eu brincava de aulinha no porão da casa. À época, a Coca Cola distribuia quadrinhos para marcar o preço do produto com giz. Eu usava aquele quadrinho no porão e dava aulas imaginárias para minhas bonecas. Minha vida é ensinar. Ensinar e aprender todos os dias.
REALIZAÇÃO
Pela minha escola passaram mais de 30 mil alunos e poucas coisas me deixam mais feliz que observar alunos meus, bem posicionados, no mercado internacional.
Uma ex-aluna, por exemplo, refinou o idioma aqui na escola, onde também foi professora, hoje é funcionária do governo americano, morando em Washington e lecionado inglês para estrangeiros. Tenho ex-alunos bem posicionados na Irlanda, França e Alemanha. Isso me traz realização.
“CASE” DE MUNIQUE
Outro caso de sucesso é nossa ex-aluna Biomédica pela UEL, que atua como editora científica em uma empresa transnacional em Munique, na Alemanha. Alcançou esse nível profissional por que passou a dominar o inglês como bolsista da New York School.
CHARLATÃES
Na economia globalizada, não saber inglês ou usar tradutor de aplicativo no celular não dá conta não. Vale atentar para o charlatanismo vendido na internet, aquilo do segredo para aprender o inglês rapidamente, o tal método revolucionário. Tá cheio de gente oferecendo isso. Quem disser que vai tornar alguém fluente no idioma em menos de três anos não está sendo honesto. O único jeito de dominar o inglês é com no mínimo 400 horas aula.
CONVERSAÇÃO
Me perguntam por que não vendo aqueles cursos de inglês on-line tão populares na internet, onde o aluno apenas assiste aulas gravadas, sem interação.
Respondo que não vendo porque não quero enganar ninguém. Se fosse assim, quem lê em inglês ou ouve músicas no idioma saberia falar. A habilidade mais difícil é a conversação, é a palavrinha que está no centro de nosso método vencedor: conversação em grupos pequenos e professores presenciais de alto nível.
Por outro lado, para quem não é da nossa cidade oferecemos aulas online em tempo real, temos alunos que no momento fazem nosso curso de Toledo, Curitiba, Londrina, Francisco Beltrão e recentemente de São Paulo. Estamos ganhando espaço com o universo digital.
PRATAS DA CASA
Devido ao nosso método, o nível de inglês que nossos alunos atingem hoje em dia é impressionante. Exemplo disso são nossos professores, que são submetidos ao rigoroso exame TOEFL e desempenham altas habilidade no idioma, quase todos são graduados aqui na New York School.
PLUGADA NO 220
Sou inquieta. Todo o tempo estou participando de cursos e capacitação. Participei de congressos Braz-Tesol em São Paulo, Buenos Aires, Nova Iorque. Eu não paro nunca. Pesquisas dizem que um professor deve sempre estar aprendendo alguma coisa nova, meu sonho agora é ingressar no curso superior de jornalismo, pois adoro entrevistar pessoas.
ALUNOS ALADOS
Trouxemos a oportunidade de intercâmbio lá em 2004. Mas eu tinha receio de levar jovens para fora do país sozinha.
Então firmei parceria com uma empresa especializada de Curitiba. Já levamos centenas de alunos para os EUA e Canadá. Os resultados são incríveis, você tira um aluno tímido da sua cidade, e o coloca em uma experiência libertadora a ponto de elevar sua autoestima. O jovem percebe que pode construir uma carreira no exterior, se empoderar. Já estamos com as inscrições abertas para intercâmbio de 2025.
APOSENTADA?
Jamais! Não frequento mais sala de aula na mesma intensidade, mas sou professora corporativa. Todos os dias divido com os colaboradores meus conhecimentos sobre negociação, atendimento, persistência, resiliência. Gosto de ensinar.
Nasci para ensinar, meu propósito de vida é educar.E educar é amar, é cuidar, é acolher. É preciso muito amor para educar!
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Outubro sem o dia 12
“Só as crianças e os velhos conhecem a volúpia de viver dia-a-dia, hora a hora,
e suas esperas e desejos nunca se estendem além de cinco minutos” (Mário Quintana)
Não guardo muitas lembranças de 12 de outubros na minha infância. Definitivamente, era uma data menos marcante para as crianças de minha época se comparada ao Natal e a Páscoa.
Dia das bruxas, então, sequer existia em nosso círculo periférico da cidade.
Posso imaginar por que não se aventava essas datas. Éramos quatro crianças. Se contasse somente os presentes de aniversário de cada uma delas, mais o Natal, já seriam oito desembolsos por ano. Por que então fomentar o 12 de outubro e o dia das bruxas?
Entretanto, das brincadeiras de criança me recordo bem. Eu, particularmente, fabricava meus próprios brinquedos.
A tampinha da garrafa virava um jogador de futebol. 11 tampinhas com faixas diagonais pintadas a caneta na parte interna, já eram o Vasco da Gama em campo.
A bola era um pedaço de papel alumínio extraído de uma carteira erraante de Marlboro ou Hollywood (naquela época basicamente todo mundo fumava).
A bola também poderia ser uma ponta de giz, ou ainda a menor peça do jogo de lego. As traves eram os cadeados das muitas janelas da casa que habitávamos, construída para ser uma “boate”.
Era assim que aquela criança de outra época passava uma tarde inteira. Sentada, pernas esticadas no chão formando um ângulo de 90 graus e o campinho de jogadores tampinhas no meio.
Não vou entrar no mérito se a infância de minha geração foi mais divertida que a atual. Incorro no risco de proliferar saudosismos. Prefiro dizer, sutilmente, que foi diferente.
Por Jairo Eduardo. Ele é jornalista, editor do Pitoco e assina essa coluna semanalmente no Jornal O Presente
