Nunca um cidadão do Oeste do Paraná chegou a um cargo tão elevado na República; Luiz Edson Fachin, o camisa 5, agora é presidente do Supremo Tribunal Federal

Toledo, 1972. A foto vem de um profundo túnel do tempo, engendrada em uma pequena cidade paroquiana do “interior do interior” do Paraná. A indumentária é bastante conhecida dos meninos dos anos 1970/80. Olhem para o primeiro “boleiro” da esquerda para direita. Ele é nosso personagem.
Kichute aos pés com o lendário cardaço de um metro amarrado nas canelas, meiões de um amarelo queimado, mesmo tom da camiseta, lembrando o uniforme da seleção brasileira campeã do mundo dois anos antes. O guri em questão, contando não mais que 15 primaveras, é o “Patoski”.
PATADA SUPREMA
“Patoski” era um dos apelidos de Luiz Edson Fachin, neste momento o homem mais poderoso que o Oeste do Paraná já produziu. “Patoski”, assim chamado pela “patada” na perna esquerda, assumiu no último dia 29 a presidência do Supremo Tribunal Federal. Suprema patada!
Vamos dimensionar o feito: nunca um oestino paranaense chegou sequer à presidência do Tribunal de Justiça do Paraná. Menos ainda na penúltima instância, o STJ. Nunca o Paraná produziu um presidente da República, sequer um presidente do Congresso.
Fachin, substituindo Teori Zavaski – morto em trágico acidente aéreo em 2015 – é o primeiro filho do Oeste no STF, o Santo Graal do Judiciário. Antes de alçar ao cume supremo, ele já havia presidido o Tribunal Superior Eleitoral.
GAÚCHO DO PARANÁ
Por que descrevê-lo como oestino, se nasceu em Rondinha, à época vilarejo pertencente a Passo Fundo, no Norte do Rio Grande do Sul? Porque foi aqui, na cidade vizinha, que Fachin usou fraldas e calçou seus primeiros kichutes. Filho de uma família de poucas posses, mãe professora, pai agricultor, o presidente do STF chegou a Toledo com 24 meses de idade.
Fez tremer goleiros e redes improvisadas nos campos de pelada com suas patadas de esquerda até os 17 anos. Estudioso, foi aprovado no vestibular de Direito da reputada Universidade Federal do Paraná, no tempo em que o funil era ainda mais estreito.
Obteve os títulos de mestre (1986) e doutor (1991) pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP), realizou pós-doutorado no Canadá, foi professor visitante do King´s College (Reino Unido) e pesquisador convidado do Instituto Max Planck (Alemanha).
LARANJAS E BILHETES
Em sua sabatina pelo Senado Federal, em 2015, Fachin declarou que teve uma infância de privações em Toledo e uma adolescência difícil, tendo vendido laranjas nas ruas da cidade e bilhetes na estação rodoviária.
Torcedor do Coxa, fluente em quatro idiomas (inglês, espanhol, italiano e francês), o que esperar do primeiro oestino à frente do STF ? Em uma analogia com o futebol, é possível afirmar:
“Patoski” era o camisa 5, volante da equipe. Posição consonante com algumas de suas características como juiz. Fachin raramente sobe ao ataque, é reservado e prudente, afinal, no futebol, o 5 tem que cobrir a subida dos laterais.
Austero, ele não gosta de firulas. Cortou a festança e o banquete tradicionalmente oferecidos aos convidados após a posse do presidente do STF. Foi bico seco.
Como volante do time supremo, Fachin vai distribuir a bola para os 11 ministros, ou seja, já avisou que decisões de grande repercussão serão colegiadas. O fominha por holofotes, das decisões monocráticas, que não solta a bola e o microfone, terá dura marcação do “Patoski”.
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De Três Bocas aos Três Poderes

O advogado toledense Luiz Carlos Schroeder acompanhou toda a caminhada do novo presidente do STF, Edson Luiz Fachin. Eles estudaram juntos do ensino fundamental ao superior. Schroeder foi um dos raros convidados paranaenses de Fachin para a solenidade de posse. Aqui, ele relata a trajetória do agora toledense mais ilustre, da localidade de Três Bocas até a Praça dos Três Poderes, em Brasília. Acompanhe:
A CHEGADA
A família Fachin deixou o Rio Grande do Sul e se estabeleceu em uma área rural entre Marechal Rondon e Toledo, lugar conhecido como Três Bocas. Ficava entre a cidade e a Vila Ipiranga. Edson chegou a Toledo com dois anos de idade e perdeu o pai ainda na infância, quando então passou a viver com os avós maternos em Toledo.
A FORMAÇÃO
Como a mãe dele era alfabetizada, foi nomeada professora da escolinha rural. O Edson já chegou à escola alfabetizado pela própria mãe em casa. Depois estudamos juntos no colégio.
A PARTIDA
O Edson sempre foi muito estudioso. Ele fazia o ensino médio de manhã no Luther King e à noite cursava técnico em contabilidade no La Salle. No último ano do segundo grau foi eleito para a diretoria da União Paranaense de Estudantes Secundaristas, então passou a morar na sede da entidade, no Juvevê, em Curitiba.
BOLA OU CANUDO?
Foi craque de bola. Começou com a camisa 10, depois adotou a 5 de volante. Chegou a treinar na equipe profissional do Coritiba, e foi convidado a ingressar na equipe. Porém, preferiu seguir a carreira no Direito quando foi aprovado no vestibular da Universidade Federal do Paraná, onde também estudamos juntos.
VISITAS À COBRA
Nos anos 1960/1970 havia muita rivalidade entre Cascavel e Toledo. Mas eu, o Edson e outros colegas frequentávamos os bailes em Sede Alvorada. Ele jogou futebol de salão na Praça Wilson Jofre, em Cascavel. Certa vez fomos conhecer a Champanhe de Ouro, do João do Porão. O Edson já era um jovem muito reservado, nunca vi ele alcoolizado.
O JULGAMENTO
No La Salle, certa vez, nosso grupo foi convocado a simular o julgamento do ex-presidente Getúlio Vargas. O Edson foi o promotor, eu o advogado de defesa. Argumentei sobre conquistas do getulismo, como a Petrobrás, CSN, legislação trabalhista etc. Ele, como acusador, apontou violações aos direitos humanos, prisões políticas, torturas e a entrega da mulher do Prestes aos nazistas. Na votação do júri popular, o Edson obteve a condenação do Getúlio por 4 x 3. Ali despertou nele a paixão pelo Direito.
PITACO DO PITOCO
Para quem acha que o poderoso ministro oestino só chuta com a perna esquerda, vale lembrar. Em 2018, mesmo indicado ao STF por Dilma Roussef, foi de Fachin o primeiro voto contra um habeas corpus preventivo que visava blindar da prisão o então réu Luis Inácio Lula da Silva.
“Patoski” é ambidestro no Direito, mas leva o carimbo canhoto. Se fosse candidato a prefeito de sua Toledo, que já foi conhecida como “Capital da Cultura” do Oeste paranaense mas hoje é uma cidade bolsonarista raiz, possivelmente não faria 10% dos votos.
das freiras vicentinas e em seguida no Colégio La Salle. Tanto eu como ele não tínhamos pai, precisamos de uma permissão do juiz para estudar à noite com 12 anos de idade.
Por Jairo Eduardo. Ele é jornalista, editor do Pitoco e assina essa coluna semanalmente no Jornal O Presente
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