Renaranhos, Paranato, Leonato Silvaranhos… Como o prefeito de Cascavel atuou antes e durante a campanha eleitoral para fundir criatura e criador

22 de fevereiro de 2024, garagem da Viação Capital do Oeste, porção Sul de Cascavel. Imprensa e convidados acompanham a apresentação dos primeiros ônibus elétricos para treinamento dos motoristas. Ali estavam o prefeito e sua sombra de camisa branca, Renato Silva, o vice. Na rodinha de conversa, o assunto voltava à tona:
O Renato não é um bom orador, vai cometer gafes nos discursos… Paranhos chama o vice em um canto e repete o que já havia dito em outras ocasiões: “Renato, seja franco, abra a conversa dizendo que realmente você não é um tribuno, não é de falar, mas é de fazer. A maioria das pessoas é assim também, tem constrangimento de falar em público. Haverá uma identificação com você por empatia”.
O episódio acima dá a dimensão de como o prefeito “carregou o vice no colo” até a vitória acachapante no último 6 de outubro.
Mas é possível citar outros fatos: Diferente de prefeitos de outrora que deram a corda só até o meio do rio para seus apoiados, Paranhos vestiu a camisa do candidato e teve papel fundamental da escolha do vice, Henrique Mecabô, rejuvenescendo a chapa.
E foi além: fundiu corpos e almas: “Votando no Renato, você estará votando em mim”, repetiu inúmeras vezes, assumindo a paternidade da criança, fundindo criador e criatura, e fazendo jus à manchete da edição: Renato Paranhos da Silva liquidou a fatura no primeiro turno, com 56,4% dos votos.
Pitaco do Pitoco
A eleição vinha apática até 15 dias antes do pleito. A apatia só foi rompida parcialmente com as denúncias contra o prefeito.
A marca do pleito de 2024 terá sido da baixa empolgação e aparente indiferença do eleitorado. Um em cada quatro cascavelenses sequer compareceu às urnas.
Se somar abstenção com votos nulos e brancos, temos 73 mil eleitores que rejeitaram ou fizeram pouco caso das opções ofertadas, número mais elevado da série histórica. Nem foguetório e festança de vencedores na avenida houve.
Esses números não tiram os méritos de vencedores e vencidos, esses, bem ou mal, não se omitiram. Mas levanta uma inquietação pertinente: se figurinha repetida não completa o álbum, onde estão as novas ideias, a nova geração de líderes cascavelenses?
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Que será deles?

Edgar Bueno
Na próxima semana, dia 12 de outubro, data para celebrar a criançada, Edgar Bueno completa 76 anos. Embora ostentando ótima saúde, terá 78 na eleição para deputado e 80 na próxima para prefeito. Tende a “pendurar as chuteiras”, mas deixa potenciais sucessores em sua prole: tanto o filho André como Edgar Neto poderão dar sequência a carreira eleitoral do ex-prefeito.
Márcio Pacheco
A disputa de 2024 põe a terceira medalha de prata no pescoço do Xerife. O ouro novamente não veio e restam dúvidas se as sequelas e cicatrizes da campanha para prefeito irão produzir pesadas retaliações palacianas quando ele tentar renovar o mandato na Assembleia em 2026. Márcio Pacheco tende a fazer uma visita protocolar ao eleito, como fez com Paranhos quatro anos atrás, e aninhar-se ao time político de Ratinho Junior.
Professora Lilliam
Enfrentou a desconexão do PT com amplos setores da sociedade, que parecem não enxergar mais nas bandeiras históricas da sigla significações com o mundo contemporâneo. A meta de repetir na eleição municipal a votação de Lula aqui (33%) não foi atingida. Liliam e a velha guarda petista local deverão ser sucedidas por uma nova geração, representada na única vereadora eleita pela sigla, a líder estudantil Bia Alcântara. Aposentada na Unioeste, a professora conclui o mandato na Câmara e viaja para rever filhos e netos no exterior. “Em seguida voltamos à luta”, disse.
Leonaldo Paranhos
Blindado pela elevada popularidade – e, em alguma medida, pela fragilidade da oposição, Leonaldo Paranhos elegeu o sucessor e vislumbra voos mais elevados. Antes, porém, terá que enfrentar e esclarecer as pesadas denúncias apresentadas a seu desfavor na campanha eleitoral.
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Eleitor (a) não gosta de mulher?
Em janeiro, a cidade que nunca elegeu uma prefeita, terá uma única mulher no Legislativo

Em um momento mordaz da troca de insultos num dos inúmeros debates da eleição para prefeito de São Paulo, Guilherme Boulos (PSOL), fez uma pausa na fala e perguntou para o fenômeno eleitoral do pleito, Pablo Marçal:
Você não gosta de mulher?
A pergunta vinha com duplo sentido, embora a origem ideológica do inquerente suponha que Boulos se referia a suposta misoginia de Marçal.
A questão poderia ecoar no sentido literal aqui. Cascavelense não gosta de mulher na política? Havia três mulheres em chapas majoritárias no pleito que acabou no último domingo: Liliam, Monica e Sueli. Nenhuma delas foi eleita.
Se os partidos cumpriram minimamente a cota de gênero na eleição proporcional, havia mais de 50 mulheres disputando cadeiras na Câmara. Apenas uma foi eleita, exatamente aquela que ninguém via, ninguém falava: Bia Alcântara, a mais jovem vereadora eleita no município, com seus tenros 22 anos. A menina de 22 foi eleita pelo 13.
E o banheiro?
Emancipada em 1952, Cascavel só elegeria a primeira vereadora quase duas décadas depois, a médica Elisa Vieira Simioni, na virada da década de 1960 para 70. Ela faleceu aos 88 anos em agosto de 2021. Elisa relatou que sequer banheiro feminino existia na Câmara.
E a sub-representação feminina só aumenta aqui: hoje são duas (Liliam e Beth Leal), em janeiro a cidade que nunca elegeu uma prefeita, uma vice, ou uma deputada, terá uma única mulher na câmera Elas são quase 53% do eleitorado cascavelense, e 5% no legislativo.
Em tempo: embora a façanha da jovem guria seja inspiradora, vale destacar: todos os pares masculinos da vereadora eleita na Legislatura que entra em 2025 fizeram mais votos que ela.
E a diversidade racial também sofreu baques: Beth Leal e Josias não foram reeleitos, reduzindo pela metade a representação afro-brasileira. Ou seja, o típico vereador, prefeito ou deputado médio cascavelense é um homem branco.
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Quem é o líder memorável?
“Há homens que lutam um dia e são bons, há outros que lutam um ano e são melhores, há os que lutam muitos anos e são muito bons. Mas há os que lutam toda a vida e estes são imprescindíveis” (Bertolt Brecht)

Quem é o grande nome da história de Cascavel? Revisitei o passado e busquei uma resposta. Escrutinei os nomes mais citados nos escaninhos do Alceu Sperança, Vander Piaia, Anselmo Cordeiro e Mario Oliveira, entre outros.
Revisitei a prosa dos pioneiros Beto Pompeu, Dercio Galafassi, Chico Konalsaisen… E não encontrei o personagem…
Quem é o cara que pode ser apontado como a liderança inconteste, o sujeito que fez a diferença, que aglutinou a sociedade em torno das grandes causas, e pode apresentar em fatos irrefutáveis os resultados práticos de sua liderança? Perigoso enveredar por esse caminho. Pode ferir suscetibilidades.
Mas vale ressalvar: esse texto, produzido no calor da Feira do Teatro, datilografado em uma engenhoca analógica, está sujeito a dificuldades de concentração e passa longe de desmerecer nossos pioneiros.
Certamente há muitos nomes para citar e reconhecer como importantes em nossa exígua história. Mas ainda não me veio a memória o nome do figurão.
Alguém que estivesse para Cascavel como Napoleão esteve para a França, Churchill para para a Inglaterra, Gandhi para a Índia ou Mandela para a Africa do Sul.
Talvez a resposta esteja no ponto futuro. Ou, em outro cenário, nós, os escribas, não cavamos ainda na profundidade suficente para encontrá-los. Ou ainda, nossos olhares não os alcançaram na altura magnânica em que possam orbitar.
Igualmente, não encontrei na Cascavel do passado e nem na do presente a figura do mecenas, do milionário generoso. O exato oposto há em profusão.
Por Jairo Eduardo. Ele é jornalista, editor do Pitoco e assina essa coluna semanalmente no Jornal O Presente
