No ciclo da vida estão muitas pessoas. Vamos conhecendo, sendo apresentados e vamos adicionando aos nossos dias. Muitas chegam com um presente, outras como um pacote de desconforto. Por não prestarmos atenção, vamos aceitando do jeito que vier e vamos dando espaço sem observar os detalhes.
No transcorrer dos dias, muitos dos que vêm são benção, outros são vendavais e tormento.
Mesmo identificando aqueles que vêm para bagunçar a paz, nos sentimos impotentes e não sabemos dizer não. Vamos aceitando tudo e permitindo que nos façam mal e nos desconstruam.
Será que essa aceitação sem critérios pode vir da carência que vivemos ou das expectativas cegas que criamos na esperança de sermos vistos e amados?
O amor que precisamos vem da construção cautelosa, que precisa ser embasada na nossa paz, no bem-estar de convivermos com quem nos enxerga como somos e aceita as diferenças. Muito diferente da convivência com quem quer nos mudar, que não concorda e não aceita quem é e como somos, estão aqueles que nos respeitam e, mesmo sabendo que temos pensamentos diferentes, nos amam.
Está em nós aceitar aqueles que vêm e saber onde, se cabem ou não. Está em nós o direito de dizer não, de não permitir que nos manipulem ao seu ”bel” prazer. Está em nós o direito de fazermos escolhas, não permitindo que nos usem para acertarem as suas dificuldades e faltas.
Podemos e devemos fazer escolhas sobre o que queremos viver, como queremos viver, quem cabe e quem não cabe nas nossas vidas. Nessa liberdade de fazermos escolhas, se aceitarmos qualquer coisa, de qualquer jeito, não podemos esquecer que estamos deixando de exercer o direito de viver em paz, em harmonia, sendo respeitados e amados.
Caso as escolhas sejam pelo tanto faz, então deixa como está, perdendo o direto de reclamar. Bota um sorriso no rosto e siga sem vitimismo… afinal, dentre tantas escolhas, cada um sabe de si.
Diante de tantos desencontros, penso que é necessário fazermos uma reflexão sobre o que estamos vivendo, o que desejamos viver e o quanto estamos disposta a investir para que as nossas relações possam dar certo.
Tenho visto muitos casais que, mesmo vivendo em pares, querem fazer valer o seu egoísmo, onde o que deve prevalecer é a vontade de cada um, onde não se olha para o outro com o desejo de viver em harmonia.
Mesmo que pareça estranho, existem homens e mulheres vivendo uma relação de pares, fazendo a sua parte de uma forma linda, buscando compreender a necessidade do outro e lutando para ter uma vida feliz. Em contrapartida, dentro dessa mesma relação estão os que se importam somente consigo, trazendo desequilíbrio e mal-estar.
É complexo compreender como alguém vivendo uma relação a dois se importa somente consigo, abandonando o outro emocionalmente, desejando distanciamento emocional e físico e ainda dizendo amar.
O sofrimento de quem faz a sua parte e não tem reciprocidade é imensurável, porque é difícil compreender que mesmo dando tudo de si o outro(a) não consegue valorizar e sequer enxerga toda a dedicação investida.
Pois é, esse tipo de relação em descompasso é muito frequente. Embora pareça difícil de acreditar, existem pessoas que aos olhos e sentimentos do parceiro estão fazendo tudo certo. Ao perguntar que apontem um defeito do parceiro ou algo que precisa mudar, pensam, repensam e não conseguem identificar nada.
Está tudo certo, mas não está bom.
O sentimento de quem se doa, se esforça e se empenha é desesperador, porque chega uma hora que já não tem mais o que fazer.
Diante da incapacidade do outro de compreender, se faz necessário repensar a vida, buscando aceitar o fato de que ninguém precisa viver junto. A felicidade de pares precisa dos dois para dar certo, pois só o amor e o desejo, sentido e não praticado, não mantém relação alguma.
E se for falta de amor e só comodismo?
Cada um deve avaliar as suas necessidades e saber o quanto o que vive o faz feliz e confortável e o quanto o desinteresse do outro só está trazendo mal-estar e angústia.
A vida é muito breve para passarmos nossos dias simplesmente buscando nos conformar com dias sombrios e sem esperança. A vida precisa ter cor, brilho, precisa pulsar dentro de nós.
A vida precisa ser vivida com quem olha para nós além do corpo, alguém que queira fazer parceria, viver os mesmos sonhos e lutar lado a lado para que cada dia valha a pena ser vivido.
Essa reflexão vale muito para avaliarmos quem estamos sendo nas nossas relações, quem investe ou quem está assistindo a vida passar, e tomarmos atitudes necessárias enquanto ainda há tempo.
Por Silvana Nardello Nasihgil. Ela é psicóloga clínica com formação em terapia de casal e familiar (CRP – 08/21393)
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