O “Projeto Peneirar”, criado em 2004 por arqueólogos, se destina a investigar o que há nas mais de nove mil toneladas de terra removidas do Monte do Templo em Jerusalém. A remoção do entulho ocorreu em 1999.
O que era lixo para a Autoridade Islâmica Waqf – órgão que administra o local em Jerusalém desde o final da guerra de 1967 – para os judeus se tornou parte de sua história. Até o final da segunda década do século XXI, já havia sido catalogado mais de meio milhão de objetos históricos separados criteriosamente com a peneira.
Recentemente, a peneira filtrou artefato que traz nome de oficial citado nas narrativas bíblicas e pode estar relacionado ao período das reformas religiosas levadas a efeito durante o reinado de Josias em Judá. Trata-se de um selo de argila datado de 2.600 anos, conhecido como “bulla”, que carrega uma inscrição em hebraico que diz: “Pertencente a Yeda’yah, filho Asayahu”, nome que remete diretamente ao relato bíblico. O reinado de Josias pode ser conferido nos livros de 2Reis e 2Crônicas.
Mais do que letras esculpidas, o selo preserva impressão digital, possivelmente deixada pelo próprio Yeda’yah, um oficial de alta patente do reino. A datação do objeto indica o momento relacionado a existência do primeiro templo (construído por Salomão) entre os séculos VII e VI a.C., período que antecedeu sua destruição pelos babilônicos ocorrida em 586 a.C.
A identificação de Yeda’yah como filho de Asayahu despertou o interesse dos pesquisadores. De acordo com a narrativa bíblica, quando o rei Josias descobriu um pergaminho sagrado durantes as reformas do templo – provavelmente uma versão do Deuteronômio –, ficou alarmado com seus avisos de punição divina que rasgou suas vestes e enviou seus oficiais mais confiáveis para combater as práticas pagãs em Judá. Entre esses enviados estava um servo real chamado Asayahu.
A descoberta do selo sugere que Yeda’yah pode ter seguido os passos do pai e ocupado uma posição de destaque na administração real ou do templo. O objeto teria sido usado para lacrar bolsas ou recipientes contendo suprimentos, como grãos ou óleo, indicando que Yeda’yah provavelmente supervisionava armazéns reais ou sagrados – funções cruciais durante o cerco babilônico.
De acordo com o jornal britânico “Daily Mail”, conhecido por divulgar e avaliar achados arqueológicos, a descoberta reforça a conexão entre arqueologia e registros bíblicos, fornecendo evidências de que figuras mencionadas nas Escrituras podem ter, de fato, desempenhado papéis reais na história da cidade de Jerusalém. Em um contexto em que fé e ciência nem sempre caminham juntas, o selo de Yeda’yah surge como um elo fascinante entre ambos os mundos.

Por Tarcísio Vanderlinde. O autor pesquisa sobre povos e culturas do Oriente Médio.
tarcisiovanderlinde@gmail.com
@tarcisio_vanderlinde2023
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