Em nossa curta estadia em Jerusalém, por duas vezes nos vimos caminhando pela Via Dolorosa, caminho pelo qual Jesus teria carregado a cruz em direção ao Gólgota. Pesquisa arqueológica, entretanto, indica que o roteiro original percorrido por Jesus ficava de fato, num nível inferior à rua histórica da Jerusalém atual.
A via de traçado irregular costuma receber maior atenção por ocasião das celebrações da Semana Santa. Afora isso, a impressão sentida pelo visitante, é que o ambiente não passa de uma feira que embaça a história que fez aquela rua ser tão famosa. Estávamos enfim, num lugar carregado de simbolismos muito procurado por peregrinos desde a antiguidade.
É do conhecimento de muitas pessoas, até mesmo de quem nunca tenha posto o pé ali, que a via é marcada por estações iconográficas que representam eventos ocorridos durante a dolorosa caminhada de Jesus: são as 14 estações. Muitos templos em todo o mundo costumam reproduzir os ícones das estações.
Paramos alguns instantes diante da 5ª estação. Trata-se da alegoria relacionada a um visitante que se encontrava em Jerusalém para a festa da Páscoa. Ele estava ao acaso naquela rua quando Jesus vinha carregando a cruz. As narrativas sustentam que ele foi pego de surpresa ao ser solicitado pelos soldados romanos que escoltavam o “condenado”, que o ajudasse a carregar a cruz: “E constrangeram um certo Simão Cirineu, pai de Alexandre e de Rufo, que por ali passava, vindo do campo, a que levasse a cruz”.
Sabe-se pouco deste curioso visitante de Jerusalém. Cirineu não era o sobrenome dele, apenas indicava a região de onde viera. Era uma terra distante de Jerusalém. Ela fazia parte de uma colônia judaica situada ao norte da África, na região onde hoje é a Líbia, lugar este, estabelecido três séculos antes do nascimento de Cristo por Ptolomeu Lago que à época governava o Egito. Sabe-se que os judeus que habitavam aquela colônia eram influentes e numerosos a ponto de manter uma sinagoga em Jerusalém.
Estando ali por outro motivo, Simão de Cirene acabou sendo envolvido em uma situação inesperada que impactou sua vida. Entre referências bíblicas e relatos pautados na tradição, sabe-se que, após ajudar Jesus a carregar a cruz, Simão volta para Cirene e conta o ocorrido à família. Após o relato, seu filho Rufo (mencionado no Evangelho de Marcos), e que conhecia as Escrituras, conclui que o homem que seu pai ajudou a carregar a cruz, era o Messias.
Após a imprevista experiência, Simão e sua família teriam se convertido, passando a fazer parte da igreja cristã primitiva.

Por Tarcísio Vanderlinde. O autor pesquisa sobre povos e culturas do Oriente Médio.
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