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Marechal

A coleta do desrespeito

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Mirely Weirich/OP
menos de 40% dos munícipes adeptos à coleta seletiva do lixo, colaboradores da Cooperagir lamentam desperdício de material que vai para o rejeito, além da falta de conscientização e do desrespeito da população

 

“Todos querem ter o lixo recolhido, mas ninguém sabe a realidade do nosso trabalho. O desabafo vem das colaboradoras da Cooperativa de Agentes Ambientais de Marechal Cândido Rondon (Cooperagir), que recentemente passaram por duas situações de desrespeito que ilustram apenas a superfície do mar de desdém de parte da população pelo trabalho dos cooperados.

O primeiro fato ocorreu há cerca de uma semana, no Ecoponto instalado junto ao Parque de Exposições Alvaro Dias. Dentro de uma sacola que chegou com o material reciclado havia uma caixa de sapato de criança e, quando o material chega na nossa mesa, costumamos rasgar a sacola para separar o que é reciclável do que vai para o rejeito. Quando abri a sacola, notei que a caixa estava pesada e pensei que era misto molhado que tinha dentro. Eu bati, mas não saiu, então abri e dei de cara com fezes humanas, conta Sandra dos Santos, cooperada que atua no Ecoponto.

Ela explica que, pela movimentação no local ser intensa, os trabalhadores não sabem quem depositou o material no local. Na hora minhas companheiras de mesa começaram a passar mal e não conseguíamos mais voltar para o trabalho, foi uma situação horrível, relata.

O segundo caso, vivido pela coletora Julita dos Santos, ocorreu há poucas semanas no bairro Primavera. Quando fui fazer a coleta do reciclado, junto havia uma sacola com roupas misturadas, e eu informei ao cidadão que não poderia recolher, pois esse tipo de material não é reciclável. A partir disso ele passou a me agredir verbalmente, disse muitas palavras agressivas, me chamou de sujeira e disse que eu deveria trabalhar. Foram palavras de baixo calão, muito fortes, e me senti muito mal com a situação, relembra. Neste segundo caso, a cooperada envolvida registrou boletim de ocorrência na Delegacia de Polícia por agressão verbal.

De acordo com a coordenadora da Cooperagir, Caroline Bunzen, além das situações de desrespeito com os coletores que não são incomuns em Marechal Cândido Rondon, um dos problemas mais alarmantes enfrentados na cooperativa está na falta de consciência da população. Recebemos muitas ligações de pessoas reclamando que o caminhão não passou na sua casa recolhendo o material e, na verdade, a pessoa colocou o lixo para fora depois que o os coletores já haviam passado, retrata.

Ela cita casos recentes registrados no bairro Beija Flor, em que a equipe da Cooperagir foi até o local verificar o caso e, quando chegaram na residência, o material reciclável estava misturado com resíduo orgânico, calçados, roupas e até uma pia de cozinha. No bairro Augusto, há pouco tempo, também nos ligaram reclamando que fazia meses que o caminhão não passava, mas quando fomos até lá encontramos todo o lixo espalhado pelas laterais da rua, e a maioria era roupa e calçado, que são materiais que não recolhemos, destaca. Muitos também falam que estão pagando o salário dos coletores, mas na verdade não. Eles recolhem o material, separam e o lucro daquilo que é vendido é rateado entre eles. O dinheiro dos impostos pagos pela população vai para a prefeitura, não para eles, expõe.

Na estimativa da Cooperagir, menos de 40% dos munícipes fazem a coleta seletiva do lixo e, a cada dia, o monte de rejeito junto à usina de reciclagem só aumenta. De 130 toneladas mensais de material que recolhemos, só aproveitamos 90 toneladas, destaca Caroline. O que a população precisa entender é que esse reciclado é a fonte de renda de 45 pessoas que são cooperadas, e por trás delas estão 45 famílias sustentadas com a coleta, separação e venda desse material reciclável. Quanto mais a consciência da população em separar o lixo aumentar, maior será o sustento deles, complementa.

 

Separação correta

O pedido dos cooperados é para que, além de fazer a separação dos materiais recicláveis (papel, plástico, vidro e metal) do resíduo orgânico e de outros tipos de materiais que queiram descartar, como roupas, calçados, resíduos de banheiro e fraldas descartáveis, no momento de depositar o material do lado de fora da casa para a coleta deixe separado do lixo doméstico. É simples reciclar. Dentro de casa tenha um recipiente grande, pode até ser uma caixa de papelão, onde os membros da família vão depositando tudo que pode ser reciclado. Quando for o dia de passar o caminhão leve todas as sacolas ao escurecer, coloque um preguinho na árvore, por exemplo, bem separado do orgânico, orienta Sandra.

Além de receber todos os tipos de garrafas pet, latas, plástico duro, papelão e cadeiras de plástico, por exemplo, a Cooperagir também faz a recolha de eletrodomésticos e eletrônicos, como fornos elétricos, micro-ondas, televisões e computadores. Desmontamos esses eletrodomésticos, fazemos a separação das peças e vendemos o material em Curitiba. Apesar de ser pouco material, ele nos dá mais retorno do que o papelão ou o plástico, que vendemos por centavos. Essas peças vendemos em reais, expõe Caroline.

Sandra ressalta que são poucas pessoas que surpreendem os cooperados ao separarem corretamente o material reciclável e limpar as embalagens quando necessário. A gente nem poderia sentir nojo do reciclado, pois é algo que deveria ser limpo e reutilizável, mas aqui é misturança demais, enfatiza. Já nos deparamos até com fezes de animais, ratos mortos, veterinárias que queriam que recebêssemos os animais mortos, fraldas descartáveis e papel de banheiro. Até seringa com sangue contaminado junto com o material reciclável, completa.

Na opinião da cooperada, as famílias precisam tirar mais tempo para conversar umas com as outras e trabalhar a conscientização dentro de casa. É claro que a maioria dos pais trabalha, mas quando chegam em casa à noite poderiam ter aquele tempo para a família, para conversar com os filhos. Para aqueles que têm empregada, verificar se ela está separando o lixo corretamente e, caso não, cobrar uma atitude dela também, diz. É preciso uma mudança de atitude coletiva porque a venda do material reciclável é o ganha pão de muitas pessoas, e a população precisa ter consciência disso e entender que isso começa na casa de cada um de nós, destaca Sandra.

 

Mudança no centro

Pela falta de carrinheiros no centro da cidade, há cerca de um mês a Cooperagir adotou um novo modelo de coleta como forma de teste. Com o retorno positivo, a partir de agora, nas segundas, quartas e sextas-feiras o caminhão da cooperativa fará a coleta a partir do fim da tarde no quadrante entre a Avenida Rio Grande do Sul e Rua Ceará, e Rua Dom João VI e Rua Independência. Antes eram apenas os carrinhos, então acumulava material durante a semana e, no fim de semana, a cidade ficava suja. Em conversa com os roteiros, há um mês fizemos o teste, que deu um resultado bastante positivo, por isso vamos adotar em definitivo essa rota e horário, destaca Caroline Bunzen, coordenadora da Cooperagir.

A indicação da cooperativa é de que os lojistas depositem o material após as 17h30, horário em que o caminhão passará pelo centro. Temos uma dificuldade muito grande de pessoas que depositam o lixo após a passagem do caminhão, destaca, enfatizando que nos bairros o caminhão começa a passar após as 07h30 e segue durante o dia, enquanto que no centro comercial a coleta será noturna. Além disso, ainda temos três carrinheiros que fazem a região central durante o dia, mas eles pegam em pontos fixos, onde os lojistas guardam o material e deixam especificamente para eles, pontua.

Caroline destaca que, apenas no mês de teste, já foi possível perceber aumento no material arrecadado e que, com a nova empresa que passou a fazer a coleta dos resíduos orgânicos, os serviços passaram a acontecer em dias alternados. Se fazemos segunda, quarta e sexta-feira, eles fazem na terça e na quinta-feira, então o morador ou lojista precisa estar atento e colocar nos dias corretos, conclui.

 

Queda nas reclamações

Atuando desde agosto deste ano no município, o serviço terceirizado de coleta dos resíduos orgânicos, que substituiu a atuação da Companhia de Desenvolvimento de Marechal Cândido Rondon (Codecar), já apresenta resultados positivos. De acordo com o secretário de Agricultura e Política Ambiental, Vilmar Mantovani, a quantidade de reclamação sobre problemas com a coleta diminuiu significativamente, especialmente nos bairros, onde era necessária uma periodicidade de recolha. No centro, no entanto, ainda demandamos de alguns ajustes, porque no mapeamento esse centro ficou um pouco grande. Como a empresa é bastante técnica e preparada, está ajustando essa rota do centro comercial para que a coleta passe a ser diária e no centro ao redor aconteça três vezes na semana, enfatiza.

O engenheiro ambiental Marcos Chaves lembra que a empresa já alinhou para realizar a coleta com duas equipes à noite, já que o trabalho tem maior rendimento, tanto pela falta de tráfego de veículos quanto pelo serviço ser menos fatigante por não ter sol intenso. Os horários de recolha basicamente não vão mudar, somente no centro terá poucos ajustes, porém assim que acontecer será amplamente divulgado, menciona.

 

Prêmio Escola Sustentável

O engenheiro ambiental menciona ainda que o resultado do 2º Prêmio Escola Sustentável, que irá definir a nova identidade visual dos caminhões da coleta do lixo orgânico, será revelado no próximo dia 27. Tivemos 128 desenhos inscritos, entre estudantes de escolas públicas e particulares, e oito finalistas foram colocados em votação popular por meio de uma rede social, com a participação de mais de 300 pessoas na votação, pontua Chaves.

O primeiro colocado da votação popular – que já foi encerrada – terá o desenho estampado nos caminhões de coleta.

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