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Marechal Precisão versus legislação

Apesar de aprovado, uso de drones na agricultura em Marechal Rondon ainda gera debates

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(Foto: Divulgação)

A Câmara de Vereadores de Marechal Cândido Rondon aprovou, no último dia 29, em segunda e última votação, projeto de lei que autoriza o uso de drones para aplicação de defensivos agrícolas na área rural rondonense. O texto mantém a proibição ao uso de aviões para pulverização de agrotóxicos e exige que os equipamentos sejam registrados na Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) e Ministério da Agricultura, bem como o operador deve ser certificado. O projeto foi enviado para sanção do prefeito.

Tendo em vista o perfil dos agricultores de Marechal Rondon, município composto por pequenos e médios produtores, muito se questiona sobre a efetiva vantagem no uso de drones na atividade rural. Além disso, questões envolvendo legislações estaduais e federais ainda são pouco evoluídas na temática, apesar da lei municipal.

 

APLICAÇÃO LOCALIZADA

De acordo com o engenheiro agrônomo do Instituto de Desenvolvimento Rural (IDR) do Paraná e presidente do Conselho de Desenvolvimento Agropecuário de Marechal Cândido Rondon (CMDA), Urbano Mertz, o maior uso dos drones na agricultura atualmente é para assistência técnica, na realização de vistorias e medição de áreas. Além disso, como aprovado no projeto de lei, pontua ele, há possibilidade de utilizar o equipamento na aplicação de agroquímicos. “Possibilita a aplicação em áreas previamente mapeadas dentro da lavoura, onde há uma incidência maior de ervas daninhas ou reboleiras com ataques de pragas, por exemplo. O uso geral na lavoura somente se justificaria se fosse observado um ataque generalizado de pragas ou ocorrência de doenças em toda a área”, declarou ao O Presente.

Engenheiro agrônomo do IDR do Paraná e presidente do Conselho de Desenvolvimento Agropecuário de Marechal Rondon, Urbano Mertz: “Não será possível o produtor comprar um drone, como se fosse um pulverizador, e ir aplicando. É preciso de uma empresa com licenciamento da Anac e profissional habilitado” (Foto: Divulgação)

 

DERIVA DE AGROTÓXICOS

O uso de drones possibilita ainda, lembra o presidente do CMDA, a aplicação de produtos mais próximos ao solo, o que, segundo ele, é muito benéfico ao meio ambiente. “Dessa forma, se evita a deriva, que hoje é o grande problema da aplicação de agrotóxicos, tanto por pulverizadores normais como por aeronaves”, expõe.

 

VIABILIDADE FINANCEIRA

No que diz respeito à viabilidade financeira, Mertz salienta que os produtos utilizados são um fator pesado na balança. “Os produtos utilizados são concentrados e caros, porque são aplicados em gotas minúsculas, uma vez que o drone carrega poucos litros do produto puro ou misturado”, menciona.

 

USO DE DRONE

Apesar de novidade para alguns, o inspetor do Crea/PR e presidente da Associação de Engenheiros Agrônomos do Oeste do Paraná (Asseapar), engenheiro agrônomo Jullian Stülp, diz que usinas de cana de açúcar fazem uso dessa tecnologia há pelo menos dois anos.

“Na nossa microrregião o uso de drones é, atualmente, mais empregado na agricultura de precisão, medições de áreas, projetos ambientais e de conservação de solo, ou seja, é utilizado mais por conta da geração de imagens e mapas interativos”, informa.

Inspetor do Crea/PR e presidente da Associação de Engenheiros Agrônomos do Oeste do Paraná (Asseapar), engenheiro agrônomo Jullian Stülp: “Na nossa microrregião, o uso de drones é, atualmente, mais empregado na agricultura de precisão, medições de áreas, projetos ambientais e de conservação de solo” (Foto: Divulgação)

 

COMPARAÇÃO

Sobre a aplicabilidade de drones na pulverização em lavouras, Stülp destaca as vantagens de se ter uma dose a menos de aplicação, menos deriva e mais facilidade na aplicação. “Existem drones no mercado com capacidade de transportar cinco, dez, 15 ou 20 litros de calda, enquanto pulverizadores convencionais transportam 600, dois mil ou três mil litros, por exemplo, para aplicação em um mesmo tamanho de área”, compara.

 

ADESÃO DOS PRODUTORES

Questionado se os produtores de Marechal Rondon estão interessados no método aprovado, Mertz é incisivo: “Tudo dependerá do custo-benefício”. Segundo ele, não há empresas rondonenses especializadas neste quesito. “Não será possível o produtor comprar um drone, como se fosse um pulverizador, e ir aplicando. É preciso de uma empresa com licenciamento da Anac e profissional habilitado”, destaca.

O engenheiro agrônomo pontua que a maioria dos agricultores já possui equipamentos para pulverização, sejam os acoplados ao trator ou os pulverizadores autopropelidos. “Para atender a demanda, muitas vezes concentrada em um período curto e em milhares de propriedades na microrregião, a tecnologia de drones para aplicação de agrotóxicos não deve ser generalizada, pelo menos nos próximos anos”, opina Mertz.

 

PEQUENAS E GRANDES PROPRIEDADES

O presidente da Asseapar estima que o uso intensivo de drones nas lavouras de grandes culturas, como soja, milho, trigo e outras, será gradativo. “Se dará conforme tiver maior oferta de serviços desse segmento no mercado em nossa região”, entende.

Mertz, por sua vez, avalia que os produtores de médio a grande porte devem ser os primeiros a utilizar os drones. “Exige um acompanhamento atento e próximo da situação de cada lavoura, fazendo manejo de pragas. Então, para um proprietário que tem inúmeras áreas plantadas espalhadas na região, penso que o drone pode ter um custo maior que o benefício”, observa.

Conforme ele, o alcance aos pequenos produtores depende da disponibilidade das prestadoras de serviço, posto que, em contrapartida, a maioria dos agricultores possui pulverizadores e não depende de terceiros. “Produtores altamente profissionalizados tenderão a utilizar o equipamento em função do menor risco de deriva, uso somente em reboleiras dentro da lavoura, lavouras conduzidas com muita tecnologia, tanto na adubação, cuidado com o solo, qualidade das sementes e manejo integrado de pragas e doenças”, pontua.

Marechal Rondon, devido à dificuldade de acesso em algumas áreas, pode se beneficiar da aplicação de defensivos agrícolas com drones (Foto: Divulgação)

 

O OPERADOR

A aplicação se dá conforme os preceitos do receituário agronômico, legislação ambiental vigente e atribuição técnica, comenta o presidente do CMDA. “Além de saber traçar mapas de roteiro por GPS, por onde o drone vai circular, o profissional deve conhecer o tipo de produto a ser utilizado de acordo com a praga ou a doença da cultura, a erva daninha existente, concentração deste produto, melhor horário de aplicação, altura de voo conforme o vento ou a passibilidade de deriva e ter cuidados com a manipulação do produto, que é muito mais concentrado do que produtos utilizados em pulverizadores comuns”, detalha.

 

CRITÉRIOS TÉCNICOS

O presidente da Asseapar ressalta que a discussão principal sobre o uso de drones está sendo realizada pelo Conselho Federal de Engenharia e Agronomia (Confea), juntamente com o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). “Foi aberta uma consulta pública para que se tenha elaborada uma resolução final sobre o tema, que norteará os critérios técnicos e legais para o efetivo uso de drones. Ou seja, pode ser que se tenha que alterar a lei aprovada recentemente, dependendo do parecer final dos órgãos pertinentes”, finaliza.

 

MARECHAL TEM POTENCIAL PARA USO DE DRONES NA AGRICULTURA

Lucas Daniel Barbieri é sócio-proprietário da OperAgro, de Toledo, uma empresa que presta suporte ao agro desde 2016. A iniciativa viu nos drones, cada vez mais presentes no dia a dia, ferramentas em potencial para o agronegócio. “Iniciamos com o propósito de prestar serviço a multinacionais de pesquisa agrícola, desenvolvendo e manejando ensaios de pesquisa por todo o país. No início de 2019 implementamos aos nossos trabalhos o uso de drones pulverizadores e, no início deste ano, passamos a levar essa tecnologia aos produtores”, contou ao O Presente.

No ramo de pesquisa, a empresa atua em toda a região Sul do Brasil, com uma filial em Sorriso, no Mato Grosso. No atendimento aos produtores rurais, a empresa presta serviços em toda a região Oeste do Paraná.

Sócio-proprietário da OperAgro, Lucas Daniel Barbieri: “O valor ultrapassa o dos meios habituais de pulverização usados hoje, porém há compensação na qualidade da aplicação” (Foto: Divulgação)

 

PRODUTIVIDADE

Diante do alto valor agregado aos drones, Barbieri explica que os produtores interessados na aplicação de defensivos nessa modalidade contatam a empresa e eles verificam a viabilidade da aplicação para, então, executar o serviço.

Segundo ele, áreas de todos os tamanhos buscam a aplicação por drone, porém os produtores com alto nível técnico se sobressaem. “Todos com intuito de buscar, por meio da tecnologia, a mais alta produtividade”, destaca.

 

VANTAGENS X CUSTOS

O empresário afirma que a aplicação de defensivos com drones apresenta inúmeras vantagens. “Há praticamente zero amassamento do solo e da cultura, o vento que as hélices fazem na aplicação levam o produto até o solo e, além disso, pela ultrabaixa vazão, o produto é aplicado em maior concentração. Há até mesmo economia de água no preparo da calda”, enumera.

Por outro lado, ele destaca que o custo é a principal dificuldade. “O valor ultrapassa o dos meios habituais de pulverização usados hoje, porém há compensação na qualidade da aplicação”, evidencia.

 

MARECHAL RONDON

Analisando a área rural de Marechal Rondon, Barbieri vê potencial para o uso da tecnologia. “Algumas áreas na região têm difícil acesso, o que é uma dificuldade para os pulverizadores habituais e se agrava em períodos de chuva prolongados, obstáculos esses que, com o uso do drone, são praticamente anulados”, observa.

 

RECOMENDAÇÃO PARA APLICAÇÃO E DISTANCIAMENTO AINDA SÃO QUESTÕES PARA DISCUSSÃO

Em harmonia com o presidente da Asseapar, o fiscal agropecuário da Agência de Defesa Agropecuária do Paraná (Adapar) de Marechal Cândido Rondon, Anderson Lemiska, entende que a lei municipal que autoriza o uso de drones é apenas um dos requisitos para a operacionalização de agrotóxico.

Fiscal agropecuário da Adapar de Marechal Rondon, Anderson Lemiska: “Os drones ainda carecem de informações e regulamentação, principalmente as especificações técnicas por parte dos fabricantes” (Foto: O Presente)

 

RECEITUÁRIO AGRONÔMICO

De acordo com ele, para que qualquer agrotóxico seja utilizado no território brasileiro é necessário a recomendação de um profissional de Agronomia por meio de um receituário agronômico, em que constam itens que descrevem a cultura, a área, o problema diagnosticado e trazem informações técnicas de como será a aplicação. “Essas informações são repassadas mediante rótulo e bula pelo fabricante do agrotóxico. É uma norma. O agrotóxico para ser utilizado no Brasil precisa ser registrado com especificações de doses, época de aplicação, cultura e modalidade de aplicação”, explica, emendando que neste último item é que está o problema: “Os fabricantes ainda não recomendam na bula a aplicação de agrotóxicos por drone. Se não há recomendação para essa aplicação, os profissionais não conseguem prescrever no receituário, porque não ‘existe’ essa modalidade”.

Conforme Lemiska, com o avanço dessa tecnologia, possivelmente os fabricantes vão registrar o agrotóxico para essa modalidade de aplicação por drone.

 

DISTANCIAMENTO

Outra questão que ainda precisa ser discutida, segundo o fiscal da Adapar, é o distanciamento da aplicação em relação a edificações, agrupamentos animais e recursos hídricos. “Na legislação diz que quando as aplicações são tratorizadas ou costais o distanciamento é de 50 metros, mas quando é aviação agrícola o distanciamento é de 250 a 500 metros em relação a esses locais. O drone não se encaixa nem como aplicação terrestre e nem como aviação agrícola, então não há estipulado ainda um distanciamento seguro para aplicação nessa modalidade”, enfatiza.

 

FISCALIZAÇÕES

Ele ressalta, sobretudo, que todo tipo de aplicação, se feita conforme as recomendações dos fabricantes, tende a ser segura, principalmente em relação à deriva de agrotóxico. “Os drones ainda carecem de informações e regulamentação, principalmente as especificações técnicas por parte dos fabricantes”, pontua.

A Adapar, informa Leminska, fiscaliza esse tipo de aplicação quando chegam denúncias ou em fiscalizações de rotina. “Verificamos o receituário agronômico e temos feito autuações, aplicações dos processos e orientação aos agricultores e profissionais de Agronomia que se informem antes de prescrever o agrotóxico de drone”, finaliza.

 

O Presente

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