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Marechal Consciência ecológica

Construções podem ter aproveitamento consciente da água; engenheiro rondonense fala sobre o assunto. Confira

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Primeiro barracão da AJJ Pré-Moldados tem mais de 4,5 mil metros quadrados de telhados e utiliza a água das chuvas para resfriar a cobertura. Outro barracão (foto) está sendo construído com o mesmo mecanismo (Foto: O Presente)

Apesar de a água ser abundante no planeta, aos poucos, esse recurso torna-se cada vez mais escasso. Uma combinação de fatores humanos e de ordem natural contribui para o atual cenário de crise hídrica. O Paraná, por exemplo, enfrenta a maior estiagem dos últimos 40 anos, o que ocasionou uma série de agravantes ao Estado. Em Marechal Cândido Rondon a falta de chuvas expressivas desde o ano passado tem deixado suas marcas. Pela primeira vez o município encara racionamento de água por um período tão prolongado, inclusive no mês de inverno, algo inédito.

Em situações como essas, o consumo consciente volta à pauta. No entanto, deveria ser uma preocupação constante.

Com o propósito de ilustrar o tema, mostrando que há alternativas que preveem o aproveitamento consciente de água, a reportagem de O Presente conversou com o engenheiro civil rondonense Marcondes Luiz da Silva, que explanou sobre edificações que podem ser planejadas considerando economia e reutilização de água, viabilizando obras que priorizam questões ambientais.

Engenheiro civil Marcondes Luiz da Silva: “Um filtro não muito sofisticado consegue deixar a água boa para ser utilizada na lavanderia. Com um sistema de tratamento mais específico é possível tornar essa água potável” (Foto: O Presente)

 

MECANISMOS

Existem vários mecanismos que podem ser agregados às construções para otimizá-las no que diz respeito à questão hídrica. “Podemos contribuir bastante nessa questão da crise hídrica. O que está mais em pauta atualmente é a questão da reutilização da água da chuva”, pontua Silva, afirmando que várias pessoas desejam esse recurso em seus projetos.

O Plano Diretor atual, segundo o engenheiro, prevê que edificações maiores permeabilizem a água da chuva diretamente em seu terreno, sem direcioná-la para as galerias da rua. “Há uma taxa de permeabilidade mínima que deve ser mantida nas construções, ou seja, não é recomendado que haja calçada na totalidade do espaço. Contudo, caso a construção extrapole o limite permitido, existem alternativas para alterar esse índice, como o uso de uma cisterna que armazenará a água da chuva”, explica.

Cada cisterna tem a capacidade pensada de acordo com a quantidade de chuva e de recolha da construção. “É proporcional. Você não pode fazer uma cisterna de 50 mil litros para dez mil metros quadrados de telhado, porque você não vai coletar água suficiente para abastecer essa cisterna. Geralmente, fazemos um cálculo baseado na média pluviométrica da região e identificamos de quanto pode ser a reserva”, menciona.

A capacidade pode ser calculada, conforme Silva, pelo método prático inglês, por meio do qual o volume da cisterna é 5% da área do telhado (m²) multiplicado pela precipitação média anual (mm).

De acordo com ele, se cada morador conseguisse infiltrar parte considerável da chuva em seu próprio terreno, muitos problemas poderiam ser evitados. “Não é o caso de Marechal Rondon, mas se pensar em cidades maiores com problemas de urbanidade, se cada um resolvesse a água dentro do seu terreno seria um ponto crucial para evitar alagamentos e enchentes”, ressalta.

 

SUMIDOUROS

Quando avaliado que o terreno não conseguirá permeabilizar toda a água proveniente do telhado, existem outras possibilidades. “A permeabilidade e a velocidade de infiltração dependem de cada tipo de solo. Ao fazer os cálculos e constatar que não há condições de permeabilizar toda a água, a gente faz um sumidouro. É como se fosse uma fossa: um buraco de cerca de um metro de diâmetro e de três a quatro metros de profundidade. A tubulação que está coletando a água das calhas joga nesse sumidouro. Se o sumidouro encher, a água é direcionada para rua, mas isso só acontece em casos excepcionais”, pontua.

O engenheiro considera os sumidouros uma alternativa vantajosa. “Nessa condição, você alimenta o lençol freático de uma maneira espetacular. Toda aquela água que iria para a galeria, que acabaria no riacho, assoreando rios e indo embora, você consegue infiltrar no terreno. Grande parte dos poços do município são de água superficial, ou seja, a água das chuvas que é infiltrada não necessariamente vem de lençóis freáticos. Os sumidouros contribuem bastante para a alimentação desse manancial”, considera.

 

OUTRAS FONTES

Outro recurso pouco explorado é a reutilização de parte do esgoto doméstico, excluindo-se o resíduo da cozinha e do vazo sanitário. “Nessa água tem basicamente água e sabão, o que permite o uso em calçadas e jardins sem problemas. Vimos a apresentação de um empreendimento de grande porte na Capital com a lateral do prédio toda com ajardinamento que seria alimentada justamente por esse tipo de coleta”, pontua Silva, acrescentando: “Questionei sobre o sabão poder ser prejudicial para a planta, eles disseram que não é”.

A água dos lavatórios e do ralo do banheiro pode ser atrativa justamente nos períodos secos de inverno. “Não chove muito e os banhos costumam se prolongar. Ao recolher essa água, a necessidade das plantas é atendida e não se deixa desperdiçar”, destaca.

 

UTILIZAÇÃO

A destinação mais comum das águas armazenadas da chuva é para irrigação de jardins, mas o engenheiro rondonense afirma que essa utilização pode ser ampliada. “Dependendo da capacidade do armazenamento, você consegue direcionar a água para o vaso sanitário, torneiras para lavagem de calçadas e outros fins”, exemplifica, contando que em um de seus projetos a cisterna tinha capacidade de encher a piscina, caso fosse preciso.

Para ele, alguns sistemas de filtragem engrandecem ainda mais as opções. “Um filtro não muito sofisticado consegue deixar a água boa para ser utilizada na lavanderia. Com um sistema de tratamento mais específico é possível tornar essa água potável”, enfatiza.

 

QUESTÃO AMBIENTAL

Conforme Silva, a questão ambiental é o que mais motiva as pessoas a aderirem a esses sistemas em sua construção. “As pessoas vêm pedindo isso há algum tempo e agora ainda mais por conta dessa questão da crise hídrica. Elas costumam pesar mais a consciência ecológica que a parte financeira, já nem sempre esses sistemas são simples e baratos para implementar”, salienta, informando que observa essa tendência nas construções há cerca de nove anos, quando o município rondonense ainda não sofria tanto com a falta d’água como atualmente.

A economia gerada na fatura vem em segundo plano, aponta o engenheiro, mas ainda pode ser considerada. “Afinal, a água da chuva vem do céu e não passa por um medidor. Você tem uma economia no consumo de água e, consequentemente, na taxa de esgoto que é calculada proporcionalmente”, ressalta. “O que acontece é que ao longo do tempo a economia gerada não é tão significativa, visto que as taxas de água e esgoto de Marechal Rondon são baixas se comparadas com cidades atendidas pela Sanepar”, evidencia.

Andre Rohloff, administrador da AJJ Pré-Moldados: “Compensa investir para que as águas sejam reaproveitadas de maneira consciente. Não somente pelo valor da fatura, mas também por poupar e aproveitar corretamente essa água que vem da natureza” (Foto: O Presente)

 

EXEMPLO BEM-SUCEDIDO

A AJJ Pré-Moldados é um exemplo em Marechal Cândido Rondon sobre como a coleta da água das chuvas pode beneficiar uma empresa. “O sistema de coleta foi implantado conforme a evolução da estrutura física da empresa. Há quase 15 anos realizamos a captação de águas de chuvas visando o consumo consciente, economia e direcionamento das águas, pois são usadas nas caixas de descargas dos banheiros e no processo de produção. Temos mais de 4,5 mil metros quadrados de telhados, por isso foi necessário canalizar e criar drenos para conter as águas em épocas de excesso de chuvas. Outro processo interessante feito por meio desse reservatório é o resfriamento do telhado, gerando maior conforto aos colaboradores na época de calor. Para isso temos um reservatório específico no qual utilizamos uma bomba d´água e aspersores para molhar o próprio telhado. Essa água circula no telhado, nas calhas e volta para o reservatório em um processo cíclico”, explica Andre Rohloff, administrador da empresa.

Segundo ele, o mecanismo foi implantado de acordo com o crescimento da estrutura da empresa e continua evoluindo até então, tanto que o sistema já está sendo colocado no novo barracão que está sendo construído. “Ao longo do tempo realizamos alguns ajustes para otimizar o sistema de coleta. Para conter a proliferação do mosquito da dengue, por exemplo, instalamos telas e isolamos os canos”, conta.

Questionado se o investimento compensa, Rohloff garante que sim. “Compensa, pois a água é reaproveitada de maneira consciente. Não somente pelo valor da fatura, mas também por poupar e aproveitar corretamente essa água que vem da natureza”, opina. “Não temos o valor exato investido, porque foi implantado há tempo e em várias etapas, mas levando em conta as caixas d’água, bases de sustentação, calhas, dutos, encanamentos e aspersores considera-se em torno de R$ 45 mil a R$ 50 mil de investimento”, expõe.

 

O Presente

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