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Educação para Jovens e Adultos tem resultados expressivos em Marechal Rondon

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EJA Fase I conta com duas turmas na Escola Bento Munhoz (foto) e quatro Ações Pedagógicas Descentralizadas nas escolas Antônio Rockenbach, 25 de Março e Waldomiro Liessen (Fotos: Leme Comunicação)

 

Noventa pessoas estão aprendendo a escrever a sua história em Marechal Cândido Rondon. Escrever sua história no sentido literal da frase, com papel e caneta. Isso porque é este o número de alunos que frequentam atualmente a Fase I da Educação para Jovens e Adultos (EJA) no município, etapa que abrange do 1° ao 5° ano do Ensino Fundamental no ensino regular e oportuniza para mulheres e homens o acesso à educação.

Entre esses estudantes está a dona Ramona, que aprendeu a ler poucas palavras e escrever seu nome aos 49 anos. “Quando criança não tive a oportunidade de estudar e quando morava em Cascavel tinha receio de frequentar as aulas por serem à noite, em uma cidade bastante perigosa”, lembra.

Hoje com 68 anos, ela compartilha que já sabe escrever muito mais do que seu nome e já não tem mais problemas para entender o nome dos produtos no supermercado ou fazer as contas na hora de pagar a compra. “Eu sempre falava para minhas filhas que tinha muita vontade de aprender, de voltar a estudar, mas o empecilho agora estava no deslocamento. Como moro na área rural, não tinha como vir para Marechal Rondon frequentar as aulas”, comenta.

Quando buscou informações sobre a EJA na prefeitura, porém, um professor disse a ela que poderia se matricular porque um ônibus vinha ao centro da cidade todas as noites e no fim da aula a deixava na porta de casa. “Depois que soube disso vim no mesmo dia. Desde maio do ano passado venho nas aulas e me sinto muito feliz aprendendo a ler e tendo conhecimento”, ressalta.

De acordo com a coordenadora do EJA Fase I, Margareth Bettega, os resultados do programa no município têm sido cada vez mais expressivos e, principalmente, gratificantes. “Primeiro porque, diferente de anos atrás, temos a busca voluntária dos alunos para participarem das aulas e, mais do que isso, a grande frequência e permanência até o fim de toda a caminhada escolar”, enaltece ela, ao comparar os índices de estudantes do EJA com os de cinco anos atrás, quando ela começou a atuar junto ao projeto. “Apesar de antes o número de matrículas ter sido maior, os estudantes desistiam muito rápido das aulas”, compara.

 

Dona Ramona, de 68 anos: “Desde maio do ano passado venho nas aulas e me sinto muito feliz aprendendo a ler e tendo conhecimento” (Foto: Leme Comunicação)

 

Captação

Apesar da busca espontânea dos estudantes, Margareth explica que o EJA também realiza um trabalho de resgate para encontrar pessoas que queiram e precisam frequentar as aulas, principalmente as de mais idade.

Ela descreve que o trabalho é de “formiguinha”, já que parte do “boca a boca”. “Um aluno que vem se matricular fala sobre um amigo ou vizinho que também poderia frequentar e nós buscamos essa pessoa, ligamos ou a visitamos em sua casa”, menciona.

Inicialmente, acrescenta ela, a pessoa é convidada a conhecer o EJA e frequentar algumas aulas por um tempo. Caso se identifiquem com o projeto, a matrícula é formalizada e a pessoa passa a frequentar diariamente a sala de aula.

Foi exatamente isso que aconteceu com a dona Neusa, de 53 anos. “Quando era mais nova, vim do Rio Grande do Sul para Marechal Cândido Rondon e não pude ingressar na série que cursava. Tive que refazer o 1º e o 2º ano, quando reprovei. Me sentia muito deslocada em meio às crianças, então deixei de estudar”, conta.

Depois de muitos anos, tendo deixado de trabalhar como diarista por um problema de saúde, sua médica lhe recomendou a voltar para os bancos escolares. “Eu não imaginava que existia algo como o EJA e nem me imaginava voltando a estudar. Hoje, sou completamente feliz por vir à escola todos os dias. Sou incentivada pelos meus colegas, professores, coordenadora, diretora e por meus filhos. Me sinto realizada estudando”, enaltece ela, que já participa do EJA há um ano.

Margareth expõe que a maior parte dos estudantes permanece no EJA até concluir a formação, sendo mínimas as exceções daqueles que deixam o curso. “E normalmente envolvem questões de adoecimento da pessoa ou de algum familiar e, apesar de não haver a necessidade de uma justificativa quando eles deixam de frequentar as aulas, todos eles explicam os motivos porque um vínculo é criado entre aluno e escola, uma relação de respeito muito grande”, observa.

 

Dona Neusa, de 53 anos: “Eu não imaginava que existia algo como o EJA e nem me imaginava voltando a estudar. Hoje sou completamente feliz por vir à escola todos os dias. Sou incentivada pelos meus colegas, professores, coordenadora, diretora e por meus filhos. Me sinto realizada estudando” (Foto: Leme Comunicação)

 

Pertencimento

Mais do que uma escola, a coordenadora do EJA opina que o contexto no qual os alunos estão inseridos é necessário para fortalecer laços afetivos e sociais. “Muitos deles quando começaram o EJA tinham baixa autoestima. Isso porque não ter acesso ao estudo ou ter deixado de frequentar a escola regular fez com que perdessem oportunidades, especialmente profissionais e de uma renda melhor”, considera.

Neste sentido, ela aponta que o EJA trabalha também o contexto social dos estudantes, o sentimento de pertencimento a um grupo social, pois muitas vezes, conta Margareth, os estudantes estão sendo esquecidas até pelas próprias famílias. “Eles vêm em busca de conhecimento, mas também de carinho, atenção e acolhimento”, frisa.

É entre os colegas e a equipe do EJA que dona Ana, de 59 anos, solta seus tímidos sorrisos. Há três anos em sala de aula, ela começou a estudar apenas aos 12 anos, mas deixou de frequentar a escola regular pela necessidade de auxiliar a família com o trabalho na roça, já que viva no interior do Paraná, além das dificuldades para chegar até a escola. “Me sinto muito bem vindo aqui. Nas primeiras vezes sentia muita vergonha de vir, por conta da idade, principalmente. Mas depois a vergonha foi embora e graças a Deus a cada dia estou aprendendo mais”, revela.

 

Dona Ana, de 59 anos: “Me sinto muito bem vindo aqui. Nas primeiras vezes sentia vergonha de vir por conta da idade, principalmente. Mas depois a vergonha foi embora e graças a Deus a cada dia estou aprendendo mais”  (Foto: Leme Comunicação)

 

EJA em ascensão

Atualmente, o EJA Fase I conta com duas turmas na Escola Municipal Bento Munhoz da Rocha Neto e quatro Ações Pedagógicas Descentralizadas (APEDs) nas escolas municipais Antônio Rockenbach, 25 de Março e Waldomiro Liessen. “No Bento são duas turmas e nas demais escolas há uma turma em cada”, informa Margareth.

Um dos melhores resultados do EJA, na visão da coordenadora, está no fato da busca das pessoas ter aumentado significativamente nos últimos dois anos, especialmente por pessoas acima dos 40 anos, que em provas como a Olimpíada de Matemática e do Exame Nacional para Certificação de Competência de Jovens e Adultos (Encceja) têm resultados surpreendentes. “Tivemos um aluno medalha de ouro na Olimpíada de Matemática e que gabaritou todas as disciplinas no Enceeja, mas são vários estudantes que têm resultados brilhantes e isso nos deixa muito felizes porque eles são prova de que independentemente da idade é possível iniciar o processo de aprendizado, começar a ler, escrever e adquirir novas formas de pensar”, celebra a coordenadora do EJA.

Muitas pessoas, diz, buscam o EJA para ter possibilidade de conquistar a Carteira Nacional de Habilitação (CNH) ou para terem um melhor desempenho em entrevistas de emprego, por exemplo. “Esses momentos são igualmente celebrados pelos professores e pela equipe de coordenação porque ficamos muito felizes ao ver que uma pessoa antes muito tímida, retraída, agora está conquistando seus sonhos graças à possibilidade que teve de adquirir conhecimento e também por ter se desenvolvido no aspecto pessoal, não apenas na questão educacional”, pontua.

 

Alerta

Margareth informa que o programa funciona de forma semestral, por isso, na Etapa I do EJA são necessários ao menos dois anos para a conclusão dos estudos. “Para aqueles alunos que têm certo nível de conhecimento, aplicamos as provas de classificação para colocá-los na etapa mais adequada”, salienta.

Ela compara que, há algum tempo, havia a perspectiva de turmas do EJA serem encerradas em Marechal Rondon pela falta de estudantes. “Era uma batalha manter uma turma com 15 alunos”, relata. “Hoje, temos 40 alunos apenas na Escola Bento Munhoz, o que nos permite dividir uma turma para as etapas um e dois e outra para as etapas dois e três”, frisa.

Nas demais escolas, as turmas contam com alunos de todas as etapas na mesma turma, sendo também um desafio para o professor reger as aulas. “Temos alunos que sabem um pouco, outros que sabem ler e escrever e outros que não sabem nada, completamente analfabetos. Por esse perfil de ensino multisseriado é que os professores que trabalham no EJA também são escolhidos com muito cuidado, para que tenham afinidade com esse método de ensino e consigam aplicar os conteúdos nas turmas de forma efetiva”, destaca Margareth.

Apesar de ser um fator positivo o número de adultos que buscam o EJA para concluir os estudos, a coordenadora do projeto declara que este índice também deve servir como alerta. “Termos 90 alunos frequentando o EJA. É uma quantidade expressiva de pessoas, especialmente acima dos 40 anos, porque o pensamento normalmente é de que na nossa cidade não há pessoas analfabetas ou semianalfabetas”, evidencia.

 

Coordenadora do EJA Fase I, Margareth Bettega: “Diferente de anos atrás, temos a busca voluntária dos alunos para participarem das aulas e, mais do que isso, a grande frequência e permanência até o fim de toda a caminhada escolar” (Foto: Leme Comunicação)

 

 

Material específico

Neste ano, a Secretaria de Educação de Marechal Rondon fez uma nova aquisição de livros, atendendo pela primeira vez os alunos da modalidade Educação de Jovens e Adultos. Para eles, foram distribuídas 150 apostilas. “Esse material nos dá um direcionamento para as aulas, seguindo os padrões do EJA, trabalhando um conteúdo dentro da BNCC. É um ganho ainda maior para os alunos que frequentam o EJA”, conclui a coordenadora.

(Foto: Divulgação)

 

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