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Marechal Cultura da violência

“Ele me xingava de vagabunda e prostituta e dizia que queria que eu morresse no parto”

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Foto ilustrativa/Internet

 

A vida de Bruna*, 29 anos, é boa, com algumas dificuldades como todo mundo. Mas, até poucos meses atrás, ela vivia uma vida de terror. Há três anos, em março de 2015, a jovem conheceu aquele que poderia ser o par perfeito – pelo menos era o que ela pensava – através de um aplicativo de relacionamento. Na época, tinha 26 anos e morava em Marechal Cândido Rondon. Ele tinha 36 anos e residia em Curitiba.

Superando a barreira da distância, em junho daquele mesmo ano os dois começaram a namorar. Bruna ia a cada 15 dias para Curitiba e o mesmo fazia seu namorado, vindo para Marechal Rondon.

Assim como acontece na maioria de inícios de relacionamentos, o casal estava feliz e projetando planos para o futuro. “No início era tudo perfeito, ele se mostrava uma pessoa tranquila e calma. Eu achava que ia ser um relacionamento normal, que iríamos namorar, casar e constituir família. Esse era o plano”, revela Bruna, que, em decorrência de um grave acidente de trânsito sofreu traumatismo cranioencefálico e hoje tem dificuldade em relembrar detalhes e situações e, por isso, conta com ajuda da mãe para contar a história.

Após cerca de um ano de namoro, o príncipe encantado se transformou em sapo e uma cortina de mentiras se abriu diante dos olhos da rondonense. “No começo do relacionamento ele se passava por uma pessoa diferente. Dizia ter uma condição financeira e status que não passavam de fachada”, comenta.

Em janeiro de 2016, Bruna descobriu que estava grávida. Feliz com a descoberta, tudo que ela queria era compartilhar a notícia com o namorado. Mas junto com a gravidez vieram outras surpresas inesperadas: as traições por parte do companheiro. “No dia em que fui contar sobre a gravidez, ele estava na casa de outra mulher”, diz.

A partir de então, a vida da jovem sofreu uma drástica reviravolta e quando percebeu estava ilhada numa teia de mentiras e ameaças. Mas o pior ainda estava por vir. Após descobrir as traições, Bruna terminou o relacionamento.

Inconformado, no mês seguinte (fevereiro), o ex-companheiro começou a ameaçar a rondonense e sua família. “Depois que descobri a gravidez e, consequentemente, as traições, praticamente não tivemos mais contato. Eu me distanciei e disse que ia assumir a filha sozinha”, conta.

Da mesma forma que os mais de 500 quilômetros não impediram o início do relacionamento, também não serviram de empecilho para que o ex-namorado iniciasse as ameaças. Através de mensagens de celular e nas redes sociais, ele estava disposto a transformar a vida da rondonense e de sua família. “Tive que trocar de número de celular por conta das mensagens, mas as ameaças continuaram através do celular da minha mãe”, lembra Bruna. “Ele criava perfis falsos nas redes sociais para me ameaçar e também me xingava frequentemente de vagabunda e prostituta e dizia que queria que eu morresse no parto”, comenta.

Totalmente transtornado, o homem vivia para perseguir a ex-companheira. “Ele dizia que ia matar a mim e toda minha família”, revela. Além das constantes ameaças e perturbações através de mensagens, ele também criou um perfil falso nas redes sociais apenas para divulgar fotos íntimas da ex-companheira. “Ele tira fotos nuas das mulheres com as quais se relaciona para depois chantageá-las. E ele tinha fotos minhas, com as quais criou esse perfil e postou todas elas. Denunciamos o perfil e ele foi retirado”, lembra.

 

A primeira agressão

Antes do cenário aterrorizante de violência psicológica e moral, o homem já demonstrava indícios de personalidade violenta. “Teve uma situação em que estávamos conversando e ele me disse que já havia quase estrangulado uma ex-companheira, e falou, ainda, que se eu o traísse iria fazer a mesma coisa comigo. Então ele pediu para me mostrar como seria, me sentou na cama e começou a apertar meu pescoço, quase me estrangulando. Em outra vez ele me passou uma rasteira em uma escadaria”, relembra Bruna.

A partir de então a jovem começou a repensar seu relacionamento. “Fiquei com medo em pensar do que mais ele seria capaz, mas como ele demonstrava ser a melhor pessoa do mundo, eu esquecia e achava que tudo era normal”, menciona.

 

A decisão

Aquele homem romântico, que aparentava ser “o melhor amigo que uma mulher poderia ter”, segundo Bruna, deixou de existir completamente. Com as constantes ameaças, o medo e a preocupação resultaram em problemas à jovem grávida. “O comportamento dele piorou durante a gestação. Ela chegou a ser internada por conta do estresse, mas ele nunca sequer buscou saber como ela ou a filha estavam”, conta a mãe da jovem.

Ela também revela que durante a gravidez da filha eles registraram uma denúncia na delegacia. “Mas não representamos porque achávamos que ele poderia mudar”, menciona a mãe.

Depois do nascimento da criança, o ex-companheiro apenas registrou a filha, mas nunca mais procurou vê-la. As ameaças, por outro lado, continuaram até julho deste ano, que foi quando a jovem e sua família resolveram entrar com ação na Justiça contra o ex-namorado. “Decidimos procurar ajuda porque não aguentávamos mais. Fomos até o Conselho Tutelar e eles nos encaminharam para o Numape (Núcleo Maria da Penha) para fazermos a denúncia”, pontuam.

Através do Núcleo, Bruna conseguiu uma medida protetiva contra o ex-companheiro, que é proibido de entrar em contato com ela. Após ser intimado, ele nunca mais ameaçou a jovem ou sua família. Além disso, a Justiça também definiu que ele pode ver a filha apenas acompanhado do Conselho Tutelar, como também definiu o valor de pensão. “No entanto, até hoje ele nunca quis ver a filha e também não pagou nem um mês de pensão”, denunciam.

Bruna afirma que hoje muitas meninas que já se relacionaram com o ex-companheiro a procuram para falar que passaram pelas mesmas situações. “Se o meu relacionamento tivesse continuado, ele teria ficado ainda mais agressivo e eu preferiria morrer do que continuar naquela situação, pois não sei do que mais ele seria capaz. Não fiquei com medo apenas por mim, mas também pelos meus pais, que sempre estiveram comigo, e pela minha filha”, expõe.

Diante disso e de tudo que viveu nos últimos três anos, a jovem aconselha as mulheres que passam por situações iguais ou semelhantes que procurem se desvencilhar dos relacionamentos abusivos e procurar por auxílio. “E não esperar tanto tempo como a gente esperou. Se tivéssemos denunciado logo teríamos evitado quase dois anos de sofrimento”, enaltece, acrescentando: “Hoje tenho paz. Levanto, olho o celular e não tem mais nenhuma mensagem”.

No entanto, as feridas deixadas pela violência psicológica foram profundas e Bruna relata que desde o fim do relacionamento nunca mais conseguiu conhecer outras pessoas, por medo e trauma. “Queria deletar tudo o que eu vivi, pena que não consigo passar uma borracha no meu cérebro. Tenho medo que tudo possa se repetir. Não consigo mais confiar nas pessoas”, desabafa.

 

* Nome fictício para preservar a identidade da fonte

 

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