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Marechal

Ensinando a amar todos os dias

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Mirely Weirich/OP

Estudantes da Escola Municipal Bento Munhoz da Rocha Neto ensaiam a peça “Os Tipos de Mães”, apresentada durante a homenagem realizada ontem (11)

Quando o segundo domingo do mês de maio se aproxima, o amor, a gratidão, a felicidade e a unidade flutuam no ar. Não só no comércio, onde o Dia das Mães é considerado a segunda melhor data para venda pelos os empresários, mas também em escolas, repartições públicas, entre outros locais, cores e frases dão o tom das homenagens às matriarcas – que neste ano será celebrado neste domingo (14).

Apesar de todas as famílias mostrarem de uma ou de outra forma sua admiração às mães na data, é especialmente nas escolas que acontecem as homenagens que tocam o coração das progenitoras e trazem lágrimas aos olhos quando os filhos dedicam-se a cantar canções, dançar ou apresentar peças de teatro como forma de mostrar o que elas representam para eles e suas famílias.

Entretanto, estes momentos realizados pelas escolas, que envolvem não apenas o dia delas, mas também o Dia dos Pais, Natal, Páscoa, entre outras datas comemorativas, não é uma forma apenas de mostrar que as crianças se lembram de suas famílias. De acordo com a psicóloga Carina Frank, enfatizar essas datas comemorativas, especialmente nas séries iniciais, é resultado da preocupação da escola em fortalecer o vínculo e laços dos pequenos com seus familiares. “O primeiro contexto social da criança é a família, é a base de tudo, então é impossível trabalhar ou proporcionar aspectos de aprendizagem sem se preocupar com a família”, explica.

Entre os conteúdos trabalhados no contexto escolar, independentemente de qual for, Carina diz que estará sempre direcionado a envolver a família, já que atualmente há pesquisas que apontam que o acompanhamento familiar na vida escolar das crianças, por menor que seja, resulta em uma melhora de até 15% na aprendizagem. “Como hoje existem perfis de famílias diferentes onde não é só pai e mãe, é também preciso ter um cuidado ao falar disso a fim de não provocar lacunas na criança”, alerta. “Você faz toda uma preparação para o dia da mãe, e criança sabe que a mamãe foi viajar com outro tio – porque é dessa forma que ela vê. Neste sentido, objetivamos fortalecer o aspecto da família e não só das datas comemorativas: o contexto familiar, quem é que cuida de mim, quem está me amparando”, complementa.

 

Confiança

Conforme a psicóloga, o que mais afeta hoje a falta de contato com as figuras maternas e paternas (não sendo elas necessariamente pai e mãe), é a

insegurança, que tem reflexos diretos no futuro de cada um. “Eu acredito que nós, adultos, somos reflexos dos comportamentos dos nossos pais, então ter a possibilidade de trabalhar e entender que qualquer um tem o direito a ter a uma vida familiar é fortalecer o desenvolvimento do eu, que nada mais é do que trabalhar os medos, inseguranças e tristezas, e a primeira base disso é o contexto familiar”, ressalta.

Diferente do que era visto há cerca de 20 anos, as crianças hoje chegam às escolas desde muito cedo, o que trouxe uma nova responsabilidade para as instituições de ensino. “A creche antigamente era um local também para crianças de zero a três anos, mas para aqueles pais que não tinham condições

financeiras de cuidar os filhos, então eles ficavam na escola para serem cuidados, e as crianças chegavam à escola com seis, sete anos de idade”, relembra Carina.

Pelo perfil de pais mais jovens, em que ambos trabalham fora para garantir o sustento de suas famílias, houve um depósito de confiança a mais nas escolas, que adquiriram um compromisso cada vez maior. “Se a escola não conseguir fortalecer o vínculo família e criança, isso acaba se perdendo”, ressalta. “Sempre digo que as crianças não vêm com manual, não há como estudar para educar uma criança. Quando a mulher engravida ela não estudou para isso ou o pai para ter um filho, então você tem o subsídio do que você aprendeu no teu contexto familiar, mas principalmente confia na escola no papel de educar”, completa.

Esse papel de educar que as escolas passaram a executar, segundo a psicóloga, trouxe à tona divergências, já que em tese a escola teria o papel de trabalhar o ensino-aprendizagem. “Mas como eu vou trabalhar isso se uma criança de seis meses vem ficar comigo das 07 às 18 horas? Ela passa boa parte do dia aprendendo na escola o que são valores e princípios básicos que antes eram passados pela família”, expõe Carina, ressaltando que a escola desenvolveu um papel em que, por mais que as teorias não concordem, tem a necessidade de educar e dar valores.

Neste contexto, vem junto a preocupação de cada vez mais promover atividades festivas ou o contato escola-criança a fim de buscar o fortalecimento de laços que, pelo sistema social, foram desfeitos. “Hoje são raras as crianças que têm a mãe ou o pai em um período em casa, porque os pais querem ser pais, mas também não querem perder o contexto profissional, as expectativas pessoais que criaram para si”, enaltece. “O filho que antes tomava toda atenção de principalmente uma das partes, que normalmente era a mãe, hoje vem a ser agregado da história de vida deles, e é aí que a escola precisa, com muita delicadeza, mostrar a importância de que o pai e a mãe são a maior base para a criança”, acrescenta.

 

Sentimentos

A forma com a qual os pequenos lidam e dimensionam os sentimentos também não é a mesma que os adultos. Carina explica que até os 11 anos, quando encerra o ciclo da primeira e da segunda infância, a criança vive muito de fantasias, de mundos criados por ela. “Ela ainda está aprendendo valores, o que é o outro, o que é ter sentimentos, porque até então ela só tem duas pessoas amando ela”, pontua a psicóloga.

É nesse período que ocorre o egocentrismo da infância, já que ela considera-se o centro das atenções, o foco, por ser menor que todos os outros. “E normalmente aí as crianças não conseguem compreender que estão oferecendo algo”, comenta a profissional. “A dinâmica dos sentimentos funciona assim: eu ofereço algo, eu amo meus pais sem dimensionar o amor, mas dimensionando as atitudes. Como eles estão em fase de formação não tem essa noção de tempo que nós temos. Se eles oferecem uma bala agora para o pai, essa atitude já tem um significado de amor, então não é preciso ter o comportamento todos os dias no entendimento deles”, menciona.

Carina ressalta que é por essa forma de lidar com os sentimentos que a criança precisa ser motivada e ensinada a amar todos os dias, já que ela lida mais com fantasias do que com verdades a fim de evitar sofrimentos.

Diante de uma situação dolorosa, por exemplo, a psicóloga comenta que a primeira forma de defesa contra a dor para uma criança é fazer de conta que aquilo não aconteceu. “Mas lá pelos 13 anos eles descobrem que não tem como tirar a dor de uma hora para outra e aí começam as crises”, enfatiza.

Até os 11 anos, a forma encontrada pelos pequenos para eliminar a dor é pensando em outra coisa ou partindo para comportamentos agressivos, contudo, a falta de pai ou de mãe provoca a insegurança e o medo da rejeição, mesmo que seja provocada pela morte. “Tendo perda eles não entendem que o pai ou a mãe saiu por alguma razão, eles entendem que os pais rejeitaram. Nestes casos é comum de a criança fantasiar e os comportamentos negativos virem mais para frente, até um ano depois. Já outras crianças conseguem absorver e se tornam agressivas, evasivas, mas nenhum comportamento é igual”, declara Carina.

De acordo com a psicóloga, que atua no magistério há mais de 20 anos, a maior perda vivida pelas crianças e adolescentes são de mães omissas, que abandonam os filhos pela vida pessoal, seja por outros relacionamentos ou pela carreira. “E a mãe marca muito a criança. O pai é uma perda significativa também, mas nós fomos até educados pela sociedade que quando há uma separação o filho fica com a mãe. Quando a mãe se desvincula do filho a criança tem uma pressão maior até porque a própria sociedade cobra da criança a presença desta figura”, complementa a profissional.

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