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Marechal 585 autuações em Rondon

Lei Seca completa 11 anos, mas álcool ao volante ainda preocupa

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Foto: O Presente

 

“Se beber, não dirija”. A frase, usada frequentemente em campanhas publicitárias na televisão, rádios e jornais, faz parte do cotidiano social há mais de dez anos. Em alguns Estados ela inclusive é obrigatoriamente impressa em cardápios de bares e restaurantes como forma de lembrar a importância de não combinar bebidas alcoólicas e direção.

Porém, embora campanhas embasadas nessa frase já fossem realizadas desde o fim dos anos 1990, é com a aprovação da lei 11.705, popularmente chamada de Lei Seca, em 2008, que ela passa a ser utilizada de forma mais ampla e articulada pelo Poder Público e organizações da sociedade civil, tornando-a cada vez mais familiar para a população em busca da redução da violência no trânsito, já que dirigir sob o efeito do álcool é elencada como uma das principais causas de acidentes.

Em vigor há 11 anos, a lei representa “um marco divisor” na construção de uma nova consciência sobre a combinação entre o consumo de álcool e a direção de veículos. Mas na prática os resultados são diferentes, e mesmo quando os índices apontam para uma diminuição nas autuações os números preocupam, pois os registros, mesmo que menores, existem, e representam risco de acidentes e, em casos mais graves, a morte de pessoas.

Em Marechal Cândido Rondon, por exemplo, a prática recorrente e perigosa foi responsável por 585 autuações ao longo desses 11 anos de vigência da Lei Seca, de acordo com levantamento realizado pelo Setor de Trânsito da 2ª Companhia da Polícia Militar (PM).

Na circunscrição da Delegacia da Polícia Rodoviária Federal (PRF) de Guaíra foram 2,6 mil flagrantes por embriaguez e 742 prisões somente no período de 2010 a 2018. Já o número de prisões nas rodovias estaduais de Marechal Rondon após teste de etilômetro, de 2009 a 2018, fechou um saldo de 36 crimes de trânsito. Neste período foram realizadas 45 autuações durante fiscalizações de equipes policiais do posto da Polícia Rodoviária Estadual (PRE).

Além disso, conforme os dados das companhias, os homens lideram os casos de embriaguez ao volante. Muitas situações são verificadas somente após o registro de acidentes e o maior número de autuações ocorre no período noturno e nos fins de semana. “O uso de álcool é muito recorrente e as pessoas bebem e dirigem muitas vezes sem pudor. E são pessoas do nosso convívio diário. Com certeza você conhece alguém que bebe e dirige, eu conheço alguém que bebe e dirige, quem estiver lendo essa reportagem agora conhece alguém que bebe e dirige ou é um alguém que bebe e dirige, mas espera que nunca será abordado pela polícia”, ressalta o capitão Valmir de Souza, comandante da 2ª Companhia da PM de Marechal Rondon.

 

Infrações

Souza entende que o número de infratores pode aparentar ser alto devido ao crescimento ano a ano no número de notificações, mas que na verdade é muito maior que o notificado. “É um número baixo pela realidade que se constata não sé em Marechal Rondon, mas em todo o país. O município apresenta esses números porque nosso poder de fiscalização não é o que gostaríamos. Gostaríamos que a nossa fiscalização fosse mais que o dobro, mas infelizmente isso não acontece”, destaca o comandante.

Ele ainda diz que no imaginário popular o ideal seria que a polícia fiscalizasse todos os embriagados e não fiscalizassem aqueles que não estivessem. “Ou seja, se não bebo não me fiscalize, mas se o meu vizinho bebe, fiscalize ele”, exemplifica, acrescentando que o ideal seria um aumento considerável do poder de fiscalização da PM. “Para que assim nós pudéssemos encontrar todos aqueles que estivessem dirigindo embriagados ou com isso impedir que as pessoas dirigissem sob efeito de álcool”, argumenta.

O comandante também lembra que havendo um maior poder de fiscalização teria também um aumento considerável no número de autuações de pessoas dirigindo embriagadas. “E numa sequência dentro desse ideal o número diminuiria, talvez próximo de zero, porque as pessoas entenderiam que poderiam ser flagradas dirigindo embriagadas, o que não acontece atualmente”, pontua.

Um problema para o cenário de embriaguez no trânsito, segundo Souza, é o fato de os motoristas acreditarem que podem burlar a fiscalização. “Quem estiver lendo essa matéria agora coloque a mão na consciência ou olhe a seu redor. Você vai perceber que em qualquer restaurante de Marechal há pessoas que bebem e depois saem dirigindo”, diz Souza, emendando: “Saiam em uma sexta-feira ou sábado à noite e observem os pontos onde as pessoas fazem ingestão de bebida alcoólica naturalmente e verifiquem quantas vão sair e dirigir”, sugere.

Muitos têm o pensamento de que tomar apenas um copo de cerveja e depois dirigir não influencia, mas, para Souza, o mesmo não acontece com a legislação. “As pessoas fazem ponderações muito benevolentes com quem comete erros. Como se tivéssemos que perdoar o pecador, mas não o pecado. Dirigir embriagado é um crime previsto em lei e a polícia cumpre a lei”, enfatiza.

O comandante da PM ainda lembra que cada pessoa possui uma resistência diferente ao nível de álcool consumido. “Quando as pessoas dizem que foi apenas um copo ou um gole de cerveja, elas precisam entender que se pode tomar meia garrafa de bebida alcoólica e não parecer embriagado(a), porque se consome constantemente, mas estará com meio litro de álcool no sangue. Outros ainda afirmam que mesmo assim possuem condições de dirigir. Podem até ter, mas para efeito de fiscalização não poderia ter tomado. É simples, se quiser dirigir, não beba, do contrário sabe que poderá ser autuado”, expõe.

 

Punição

O cidadão flagrado conduzindo veículo sob efeito de álcool ou substância que determine dependência é multado em R$ 2.934,70, além de ter suspenso o direito de dirigir por um ano, segundo o artigo 165 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB).

De acordo com a 2ª Cia da PM, se apontar acima de 0,30 miligramas de álcool por litro de sangue o condutor é encaminhado à Delegacia da Polícia Civil e é liberado a partir do pagamento de fiança, no entanto responde processo. Para ter novamente o direito de dirigir após o término da suspensão é necessário que o condutor se submeta ao curso de reciclagem.

Um resultado acima de 0,05 mg/l a 0,33mg/l configura infração gravíssima e igual ou acima de 0,34 mg/l é considerado crime de trânsito.

Antes da Lei Seca, o CTB em vigor, aprovado em 1997, já limitava a ingestão de até seis decigramas de álcool por litro de sangue. A legislação de 2008 tolerava o limite de 0,1 miligrama por litro (mg/l). Ela fixou punições que envolvem multas elevadas, perda da habilitação e recolhimento do veículo. No caso de acidentes com vítimas, o responsável deve responder a processo penal.

Em 2012, uma modificação estabeleceria a infração a partir de 0,5 mg/l. Uma nova alteração em 2016 também intensificaria o rigor fixando a alcoolemia zero.

Conforme o artigo 306 do CTB, no caso de dirigir embriagado a pena pode variar de detenção de seis meses a três anos, multa e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor. O artigo 310, por sua vez, define que permitir, confiar ou entregar a direção de veículo automotor à pessoa não habilitada, com habilitação cassada ou com o direito de dirigir suspenso, ou, ainda, a quem, por seu estado de saúde, física ou mental, ou por embriaguez, não esteja em condições de conduzi-lo com segurança, resultará na prisão de seis meses a um ano, ou multa.

O motorista abordado em uma fiscalização tem o direito de recusar o teste do etilômetro, mas isso não o impede de ser autuado. “Os indícios de prova não se baseiam apenas o bafômetro. A polícia obtém provas a partir de vídeo e alterações das características pessoais, como voz, agressividade, odor etílico, andar cambaleante e olhos avermelhados. O policial precisa fazer constatações que verifiquem ou não essa questão, e vai dizer se a pessoa está ou não embriagada a partir dessa avaliação”, declara Souza. Neste caso o infrator também é encaminhado à delegacia e responde processo.

Vale ressaltar que a absorção do álcool é feita pelo organismo em poucos minutos, mas pode levar até dez horas para que não seja mais detectada no sangue. E, embora alguns motoristas busquem meios de burlar o teste do etilômetro, não existem maneiras de “enganar” o exame. “Caso o motorista tenha ingerido bebidas alcoólicas e depois chupar uma bala, por exemplo, não vai fazer diferença, porque o teor alcoólico é medido através do ar expelido pelo pulmão”, destaca Souza.

Além disso, as chances do bafômetro errar a medição também são descartadas. “O aparelho já tem uma aferição com margem de erro de 0,04 miligrama de álcool por litro de ar expelido dos pulmões, por isso o etilômetro é seguro”, frisa.

 

Cassação da CNH

Segundo o Departamento de Trânsito do Paraná (Detran-PR), 19 rondonenses, todos do gênero masculino, tiveram a Carteira Nacional de Habilitação (CNH) cassada entre 2014 e 2018. Isso acontece quando há caso de reincidência no período de até 12 meses. Se flagrada novamente no teste do bafômetro ou pela obtenção de provas, a pessoa terá sua punição dobrada, ou seja, pagará 100% do valor normal da multa e terá o direito de dirigir cassado por dois anos.

Entretanto, os dados do ano passado não estão totalmente fechados, haja vista que ainda existem muitos processos em análise de recurso através da Junta Administrativa de Recursos de Infração (Jari) e Conselho Estadual de Trânsito do Paraná (Cetran).

No cenário estadual, o número de carteiras cassadas neste mesmo período foi de 1.350, aponta o Detran.

 

Fiscalizações

Apesar dos maiores números de autuações acontecerem aos fins de semana, o comandante da PM ressalta que notificações são lavradas em outros dias da semana, inclusive na segunda-feira. “Claro que de certa maneira as pessoas tendem a beber e dirigir com uma maior frequência nos fins de semana, porque entendem que ali é um momento de lazer e descontração, mas temos autuações nos mais variados dias e horários da semana, não há uma regra geral”, salienta.

Após um ano de intensas fiscalizações no trânsito rondonense, Souza expõe que a ideia é sempre manter o policiamento em níveis aceitáveis, que possam garantir a segurança dos cidadãos. “Gostaríamos de poder aumentar essa fiscalização e que essa segurança fosse garantida de maneira mais efetiva, mas dentro das nossas limitações manteremos o planejamento que já vínhamos realizando, até porque no último ano não tivemos nenhuma morte no trânsito rondonense, principalmente em decorrência do uso de álcool”, afirma, emendando: “Esperamos conseguir manter ao longo deste ano os índices de policiamento mesmo diante de um cenário desfavorável, principalmente no que tange ao número do efetivo da Polícia Militar de Marechal Rondon”.

 

 

Mudança de comportamento

Se você é daqueles que acredita que não tem jeito, a boa notícia é que a solução existe. Mas vem a passos lentos. A chave que vai destrancar a consciência dos motoristas em relação ao álcool e direção parte da conscientização e sensibilização. “Mais informação não acarreta mais conhecimento, porém as mudanças de comportamento se apresentam, sim, diferentes. Cada vez mais os motoristas estão tendo informações, principalmente na sua formação, e também ao longo de campanhas e discussões junto à própria sociedade”, analisa o comandante da PM.

Souza menciona que boa parte da conscientização dos motoristas é veiculada ao poder de fiscalização ou o fato de saberem que podem ser fiscalizados pelas autoridades de trânsito. “As pessoas precisam ter mais consciência e saber que é errado beber e dirigir. Infelizmente, para o imaginário popular é algo normal e comum, mas é preciso alertar o quanto isso coloca em risco as vidas dos motoristas e as de outras pessoas”, ressalta.

 

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