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Agricultores da região Oeste vivem momento histórico: plantar milho em cima da soja. Há complicações? Confira

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(Foto: Bruno de Souza/OP)

A chuva “choveu no molhado”. Isso porque a maioria das precipitações esperadas para esta semana não se concretizaram e a média de 42 milímetros registrada em Marechal Cândido Rondon nos primeiros dias de janeiro foi insignificante para grande parte das lavouras da região. O acumulado variou de 81 milímetros no distrito de São Roque a 22 milímetros na sede rondonense.

Como as precipitações desse começo de ano não fizeram muita diferença para a safra 2021/2022, na quinta-feira (06) a Prefeitura de Marechal Rondon aderiu ao decreto estadual de situação de emergência devido à estiagem. O documento foi sancionado no último dia 30 pelo governador Carlos Massa Ratinho Junior.

 

Lavouras atrasadas se beneficiam

De acordo com o chefe da regional de Toledo da Secretaria de Estado da Agricultura e do Abastecimento (Seab), Paulo Salesse, as chuvas dos primeiros dias de 2022 promoveram “alteração mínima nas lavouras de soja, não havendo melhora significativa na média de produtividade”.

“As chuvas foram favoráveis para um pequeno percentual das lavouras. Beneficiaram as áreas de soja mais atrasadas que ainda têm condições de continuar o enchimento de grão. De todo modo, o número de vagens por planta está bastante reduzido e não deve haver uma grande produtividade”, considera o engenheiro agrônomo Cristiano da Cunha.

As lavouras que ainda se beneficiam das chuvas precisam adotar outros cuidados para evitar males maiores, destaca Cunha. “A orientação para os produtores que têm soja na fase de enchimento de grão é que continuem monitorando as lavouras e controlem as pragas, principalmente percevejo, ácaro e lagarta, que estão com uma pressão grande. Desse modo, esses grãos não serão prejudicados ainda mais”, orienta o agrônomo.

 

Colheita em Marechal Rondon

Segundo dados emitidos pelo Departamento de Economia Rural (Deral) da Seab na segunda-feira (03), a regional de Toledo tem 5% das lavouras na fase de florescimento, 68% na fase de frutificação e 27% na maturação. Conforme Salesse, apenas 1% das áreas de soja da regional foi colhida.

Em Marechal Rondon, menos de 5% da soja foi colhida até o momento. Invés de máquinas, as áreas recebem visitas de peritos para averiguar as perdas. “Na maioria das áreas que têm seguro ainda estão sendo feitas as perícias. A colheita deve avançar a partir do dia 10 (segunda-feira), mas ainda em uma porcentagem baixa”, prevê Cunha.

Chefe da regional de Toledo da Seab, Paulo Salesse: “A colheita tem apresentado baixa qualidade de grão em toda a regional. Devido à deficiência hídrica, as vagens não conseguiram encher os grãos e estes também não conseguiram maturar de forma homogênea” (Foto: Divulgação)

 

 

Baixa produção e pouca qualidade

A previsão inicial era colher cerca de 1,858 milhão de toneladas na regional de Toledo, contudo as intempéries fizeram as expectativas despencarem. “Estima-se uma produção de cerca de 520.500 toneladas, com uma perda de aproximadamente 72% na produção, com a possibilidade de aumentar com o avanço da colheita. Em dinheiro, isso representa R$ 3,7 bilhões que deixam de circular na economia”, declarou Salesse ao O Presente.

Nas áreas já colhidas de Marechal Rondon, Cunha diz que os agricultores têm tido produtividades entre oito e 35 sacas por alqueire. “São grãos de baixíssima qualidade, com uma grande quantidade de grãos avariados, murchos e esverdeados. Já está sendo colhido pouco e ainda tem esse prejuízo grande de qualidade. É uma safra perdida, porque a produtividade da maioria das áreas sequer paga os custos de produção. Consequentemente, o agricultor fica sem uma receita”, lamenta.

A média de produtividade das lavouras colhidas em Marechal Rondon segue o índice visto na regional: de sete a 25 sacas. “A colheita tem apresentado baixa qualidade de grão em toda a regional. Devido à deficiência hídrica, as vagens não conseguiram encher os grãos e estes também não conseguiram maturar de forma homogênea”, expõe o chefe da Seab.

 

Prática inédita

Diante da produtividade em baixa, o agricultor tem a opção de não colher a soja e, conforme o agrônomo, há dois pontos principais que interferem na decisão. “Primeiro, precisa pensar a produtividade que a área vai dar. Depois na questão de ter uma colhedeira própria ou não. Se a colheita for terceirizada, o custo aumenta ainda mais. Em algumas áreas de Marechal Rondon, talvez 5% do total, o produtor vai optar por não colher”, pontua.

Uma vez decidido não colher a soja, o agricultor simplesmente seca a área e entra plantando milho em cima das plantas. “O plantio do milho é sempre sobre a soja. O que não acontece é o agricultor plantar o milho sem colher a soja. Isso é algo inédito, porque pelo menos nos últimos 20 anos não aconteceu”, expõe Cunha.

Salesse menciona que na safra de 2011/2012 as perdas da sojicultura também foram expressivas devido à estiagem. “Em algumas áreas o produtor também analisou como inviável a colheita, porém as perdas foram de 52%, ou seja, não tão severas como as da safra atual”, compara.

Engenheiro agrônomo Cristiano da Cunha: “Uma vez decidido não colher a soja, o agricultor seca a área e entra plantando milho em cima das plantas. O que não acontece é o agricultor plantar o milho sem colher a soja. Isso é algo inédito, porque pelo menos nos últimos 20 anos não aconteceu” (Foto: Raquel Ratajczyk/OP)

 

Implicações do plantio sobre a soja

Apesar da prática incomum, Cunha explica que não deve haver muitas implicações para o milho safrinha. “Não é nada impossível plantar milho sobre a soja. Logicamente, alguns grãos de soja vão emergir depois dentro do milho, mas essas plantas que nascerem são facilmente impedidas através do controle químico”, pontua.

O principal impacto do plantio da safrinha sobre a soja sem colher acontece na economia, que, segundo o profissional, gera um “efeito cascata”. “O agricultor fica sem a renda que ganharia na safra 2021/2022 e, consequentemente, tem dificuldade de pagar os seus fornecedores. Por consequência, esse dinheiro não vai para o comércio local e regional. Mesmo que alguns agricultores eventualmente tenham alguma reserva, esse dinheiro não vai para o comércio, porque fica resguardado para a próxima safra. A economia de um modo geral sofre em função da quebra de safra”, ressalta o agrônomo.

 

Momento de decisões

Paira no campo um sentimento de incerteza: colher ou não colher? As chuvas de janeiro foram insuficientes para que plantadeiras entrassem nas áreas e, apesar de já permitido, o período ideal para plantio do milho safrinha ainda está por vir. “Até dia 05 de março está dentro do zoneamento agrícola, porém a janela normalmente mais favorável ao cultivo do milho safrinha é de 25 de janeiro até 15 de fevereiro”, aponta.

 

Esperança na safrinha

Mesmo com a difícil escolha do momento, o milho safrinha é a esperança do agricultor após uma safra perdida. “A expectativa para o milho safrinha é extremamente boa. Logicamente, dependemos das condições de precipitações. Precisamos de boas chuvas em fevereiro, março, abril e maio para ter uma safrinha com sucesso”, salienta o agrônomo.

De acordo com dados do Deral, a quantidade de lavouras com milho de segunda safra deve aumentar na regional de Toledo em 2022. “Diante do cenário atual, a área com safrinha deve aumentar, partindo dos 430 mil hectares semeados na última safra para 438 mil hectares neste ano. Consequentemente, ocorrerá redução na área de trigo”, informa Salesse.

O trigo surge como uma opção para grande parte dos produtores apenas se as condições de umidade estiverem ruins e o plantio atrase. “Se não tivermos chuvas significativas até metade de março, o agricultor migra para o trigo, que é menos lucrativo. Normalmente há chance de colher 250 sacas de milho, enquanto a produtividade do trigo gira em torno de 140 sacas. Então, o produtor teria uma renda menor, mas ocuparia as lavouras”, expõe.

 

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