Fale com a gente

Geral

Tentativas de suicídio quadriplicam em quatro anos em Marechal Rondon

Publicado

em

Por que não falamos sobre o suicídio assim como tratamos da prevenção das doenças sexualmente transmissíveis, do câncer, da diabetes ou da hipertensão, que, assim como o suicídio, diariamente tiram de tantas famílias entes queridos? Assim como todas essas outras questões de saúde pública que podem ser prevenidas, por ser a segunda maior causa de mortes no Brasil entre pessoas dos 15 aos 29 anos, os casos de suicídio não deveriam ser silenciados por serem “pesados” e ainda estarem taxados como um tabu.

Somente nos quatro primeiros dias do mês de setembro, na Unidade de Saúde 24 Horas de Marechal Cândido Rondon, das oito fichas de notificação de violência que chegaram ao Setor de Epidemiologia, três delas indicavam que a agressão havia sido autoprovocada. Isso significa que em apenas quatro dias pelo menos três pessoas tentaram tirar a própria vida. Os motivos são os mais diversos, mas não fazem diferença nas estatísticas já que, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), nove em cada dez casos de suicídio poderiam ser prevenidos se o tema fosse amplamente tratado. “Em 90% dos casos é possível prevenir, mas na maioria das vezes tem-se a concepção de que falar sobre suicídio vai acender a chama e fazer com que mais pessoas tirem a própria vida. Porém é justamente ao contrário”, aponta a psicóloga da Unidade de Saúde 24 Horas e coordenadora do Comitê de Saúde Mental e Enfrentamento a Violência, Josie Danielle Meinerz.

Apesar de o êxito nos casos de violência autoprovocada já ser considerado um problema de saúde pública no Brasil, com 32 brasileiros mortos por dia por conta do suicídio, segundo a OMS, o tabu acerca do tema faz com que a prevenção seja silenciada. “Essa taxa é superior às vítimas da Aids e da maioria dos tipos de câncer, e esse é só mais um fator para o Comitê abraçar a causa e falar abertamente sobre o tema”, aponta a profissional. “Precisamos falar sobre o suicídio para que as pessoas que estão na linha de frente do atendimento, lidando com essas situações, possam mudar esse olhar, quebrar o paradigma e o preconceito. Muitas vezes há casos de pessoas que vão buscar ajuda, mas não se dá atenção por pensarem que a pessoa só está falando e que não vai realmente fazer”, complementa.

O Setembro Amarelo foi criado em 2014 pelo Conselho Federal de Medicina junto à Associação Brasileira de Psiquiatria e o Centro de Valorização à Vida justamente para desmistificar o tema e prevenir casos de suicídio em todo o país. “Se observarmos o histórico nacional, o câncer, a Aids e outras doenças sexualmente transmissíveis, por exemplo, há duas ou três décadas também eram rodeadas de tabu e não se falava ou faziam-se campanhas sobre esse tema, até que houve um esforço coletivo para mudar essa realidade porque o número de vítimas começou a aumentar a olhos nus”, declara Josie.

Seja por medo de falar sobre o assunto ou por desconhecimento, a psicóloga diz que a maioria das pessoas não vê os sinais de que uma pessoa próxima apresenta tendência suicida. “Até mesmo quem está passando pela situação não sabe onde buscar ajuda”, pontua.

 

Grito de socorro

Conforme a profissional, não são apenas pessoas com quadros depressivos que podem apresentar tendências suicidas. “Quem passa por isso se encontra em um sofrimento psíquico muito grande”, explica.

Descobrir uma doença como câncer ou que a partir de agora é soropositivo são algumas situações que podem levar uma pessoa ao suicídio. Porém, motivos como o término de um relacionamento, uma traição ou desemprego, entre tantos outros, também podem ser o gatilho para tirar a própria vida.

Pessoas nesta situação, expõe ela, nem sempre falam abertamente sobre o que estão sentindo ou sobre o pensamento de tirar a própria vida em um primeiro momento, todavia, há sinais de pedido de ajuda que podem ser observados por familiares e amigos próximos, como mudanças bruscas no comportamento e tentar entender o contexto em que isso está acontecendo. “Falas sobre morte, com desesperança, acreditar que estão sozinhas mesmo perto de outras pessoas, frases no sentido de que ‘não tem mais graça viver’, ‘eu sou um fardo’, ‘a vida não vale a pena’, ‘não vou mais ficar triste porque não vou mais estar aqui’, ‘você vai sentir minha falta quando eu for’ ou ‘você nem vai sentir a minha falta quando eu morrer’, ‘não aguento a minha dor’, ‘não consigo lidar mais com isso’”, cita a psicóloga.

Josie comenta que o suicídio é um grito por socorro, por isso, os profissionais de saúde, ao identificarem uma pessoa em situação de angústia, devem perguntar se a pessoa em algum momento na vida pensou em se matar ou se está planejando cometer o ato. “Quando conseguimos perguntar, a pessoa consegue falar, e é neste momento que podermos intervir”, declara.

Quando a própria família perceber esses sinais de que a pessoa está pensando em se suicidar, a psicóloga ressalta também a importância de não reprimir ou ironizar a possibilidade, mas, sim, conversar ou buscar auxílio profissional.

 

Convite à vida

Uma das portas de entrada para o auxílio de pessoas que estão passando por sofrimento é o Centro de Valorização da Vida, que dá apoio emocional e prevenção ao suicídio, atendendo voluntária e gratuitamente todas as pessoas por meio do número 141, 24 horas por dia e em total sigilo. “Qualquer pessoa que esteja em uma situação de crise, desespero, com pensamentos de tirar a própria vida deve buscar ajuda nesta porta de entrada ou, em nível de serviço público de saúde, nas Estratégias de Saúde da Família e nas Unidades Básicas de Saúde, para conversar com seu médico sobre a situação”, ressalta Josie.

Em Marechal Rondon, por meio do slogan “Diga Sim à Vida”, que marca a 2ª Campanha de Prevenção ao Suicídio, o objetivo do Comitê de Saúde Mental e Enfrentamento à Violência é também capacitar e fortalecer toda a rede de atenção e cuidados, ligadas às secretarias de Saúde, Assistência Social e Educação, para que os profissionais possam identificar, encaminhar e lidar com situações nos seus locais de trabalho. “Por meio da capacitação dos agentes comunitários de saúde, por exemplo, haverá um olhar diferenciado para identificar alguma pessoa que está passando por uma situação de sofrimento, pois eles vão até as residências fazer a visita, diferente dos outros profissionais que estão esperando a pessoa vir pedir por ajuda”, explica. “Queremos fazer com que a comunidade perceba a importância de chegar a essas pessoas para que elas sejam convencidas a mudar de ideia sobre o suicídio, e isso não é um processo simples, mas é possível”, garante.

 

Apoio aos sobreviventes

Por meio das iniciativas do Comitê de Saúde Mental e Enfrentamento à Violência durante o Setembro Amarelo, menciona Josie, a intenção também é dar apoio aos sobreviventes do suicídio, já que cada pessoa que comete um suicídio acomete de sete a oito pessoas ao seu entorno. “Gostaríamos de realizar um trabalho de posvenção com as famílias das vítimas de suicídio, que são os sobreviventes”, explica.

Josie diz que a prevenção ao suicídio para as futuras gerações dos sobreviventes ainda não será abordada na campanha deste ano, entretanto, já há um planejamento para as próximas edições do movimento. “Queremos também que esses sobreviventes saibam que existe esse interesse e esse espaço. Os familiares e amigos podem buscar o serviço de psicologia da Unidade 24 Horas e o Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) porque é importante ter um olhar para eles e acolhê-los”, enfatiza.

O luto para alguém que perdeu um ente querido por conta do suicídio, de acordo com a psicóloga, tem características diferentes de outros tipos de luto, e até mesmo por conta disso há necessidade de uma capacitação dos profissionais para saber como acolher os sobreviventes. “Saber como acolher, trabalhar esse luto e mostrar que essas pessoas têm a possibilidade de cuidar de si e dar voz ao suicídio, até para que nós, profissionais, possamos saber como chegar às pessoas que estão passando por isso e sofrem em silêncio”, enfatiza.

 

2ª CAMPANHA DE PREVENÇÃO AO SUICÍDIO – DIGA SIM À VIDA

PROGRAMAÇÃO

Domingo (10)

11h00 – “Badaladas pela vida” pelas comunidades religiosas de Marechal Cândido Rondon

 

Segunda-feira (11)

08h30 – Caminhada pela vida

Concentração na Prefeitura de Marechal Cândido Rondon

 

13h30 – Abertura do ciclo de palestras

Local: auditório do Isepe Rondon

 

13h45 – Apresentação cultural

14h00 – “Lacunas entre o manejo técnico e a atitude empática: profissionais da rede de atenção de cuidados diante dos desafios do suicídio” com a psicóloga Simone Zelonh, da 20ª Regional de Saúde

15h45 – “Fatores de proteção do suicídio: avaliação e manejo na prevenção”, com o clínico geral Milton Curvo

16h45 – “Suicídio e espiritualidade”, com o pastor Alfredo Bischoff

Apesar de a programação de palestras ser gratuita, os interessados em participar devem realizar as inscrições até amanhã (06), informando nome completo, CPF e e-mail por meio do endereço saude-mental@hotmail.com ou pelos telefones (45) 3284-1351 e (45) 99849-5690 (WhatsApp) com a assistente social Marla, da Unidade de Saúde 24 Horas.

Copyright © 2017 O Presente