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Policial Armas no Paraguai

Facilidades e perigos disponíveis do outro lado da fronteira

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Em Salto del Guairá, no Paraguai, não é difícil encontrar loja que comercializa armas e munições e comprar armamento (Foto: O Presente)

As mudanças feitas pelo presidente da República Jair Bolsonaro, por meio de decreto que facilita a posse de arma de fogo por cidadãos comuns, pode ter influência na entrada de armas pela fronteira entre Brasil e Paraguai.
Atraídos pelo valor dos produtos no país vizinho, as cidades de Ciudad del Este e Salto del Guairá, fronteira direta com os municípios de Foz do Iguaçu e Guaíra, respectivamente, são destino de milhares de brasileiros em busca dos mais diversos itens: de roupas, calçados, perfumes, alimentos, eletrodomésticos, eletrônicos… a lista é de perder de vista.
É neste paraíso das compras que está a poucos quilômetros de muitos municípios do Oeste paranaense que também estão espalhadas lojas especializadas na venda de armas, onde não é difícil encontrar armamento e munição de todos os tipos de calibres: revólveres, pistolas e até mesmo fuzis podem ser comprados, basta ter dinheiro para fechar o negócio.
Uma fonte ouvida pelo Jornal O Presente, que foi ao Paraguai em busca de informações para comprar o objeto, conversou com o proprietário de uma empresa que está há mais de 30 anos no mercado de armas.
Na conversa, o empresário afirmou que apesar de as mudanças no decreto, o número de brasileiros que foram até a empresa não aumentou. Isso porque as armas compradas no Paraguai são legais apenas no país vizinho. “Ao entrar no Brasil com a arma o risco é de quem compra. A arma estará ilegal e a responsabilidade em legalizá-la junto aos órgãos responsáveis é de quem fez a compra e não da nossa empresa”, disse o comerciante.
Diferente do Brasil, de acordo com o proprietário da loja, a legalidade das armas adquiridas por civis ocorre no momento da compra. “Se um brasileiro comprar uma arma aqui, enquanto estiver no Paraguai, ela estará legalizada. Mas se quiser ir para o Brasil será ilegal”, ressaltou, afirmando que a empresa já comercializou armas para brasileiros que passaram pela fronteira com o objeto. “A pessoa passa na sorte. Mas se a polícia abordar a pessoa é multada, presa e tem toda a responsabilidade sobre isso”, reforça.

Foto: O Presente

 

Marcas e valores
O principal atrativo para brasileiros irem ao Paraguai em busca de armas está no valor do produto que, assim como diversos outros itens, promete ser mais baixo do que quando comprado em território nacional.
O empresário explica que, acerca do valor das armas, é difícil fazer um comparativo com o preço praticado pela indústria brasileira levando em conta que no Paraguai são vendidas marcas que no Brasil não são comercializadas. “As únicas marcas que temos aqui e que são vendidas no Brasil são Taurus e Rossi, mas temos inúmeras outras armas que são de marcas desconhecidas por brasileiros, porque não é permitida a venda no Brasil”, declara.
Na empresa, uma pistola calibre .380 da marca Taurus é vendida por cerca de US$ 1,2 mil (cerca de R$ 4.680 com a cotação do dólar a R$ 3,90). No Brasil, em uma loja on-line especializada na venda de artigos esportivos, a mesma pistola pode ser encontrada por R$ 4.590, isenta do valor de frete. “Por conta da cotação do dólar, que está alto, não sentimos nenhuma diferença no número de brasileiros em busca de armas relacionado à mudança nas leis de compra e posse de armas no Brasil”, reafirma o empresário.
As marcas Taurus e Rossi fazem parte do grupo de cinco empresas que formam a indústria bélica do Brasil, completadas pela Imbel, CBC e Amantino. “O calibre .380 é um dos mais procurados, que é o permitido no Brasil para cidadãos comuns que têm a posse de armas, mas também há bastante procura pela pistola 9mm”, explica o comerciante.
Além das marcas, os calibres encontrados nas lojas paraguaias também são de uso restrito em território nacional, como .44 e .357. “Se a pessoa é abordada pela polícia com alguma dessas armas, ela não consegue pagar a fiança e fica presa”, explica o proprietário da empresa. “E, no caso de a pessoa conseguir passar com a arma pela fronteira, quando ela precisar comprar munição será necessário apresentar o documento que comprova a legalidade da arma, e nesta situação ela será presa também”, complementa.

Vidas perdidas
Comandando a empresa que foi iniciada por seu pai, falecido há menos de um ano, o empresário paraguaio diz que há 30 anos – tempo em que a família trabalha com a venda de armas – vê pessoas morrendo por conta do mal uso de armas. “Continuo trabalhando neste ramo porque sempre foi o negócio da minha família e penso que o problema não está na arma, para o uso desportivo, por exemplo, em clubes de tiro. O problema está quando as pessoas utilizam as armas para matarem suas famílias”, conta.
Das situações vividas por ele, uma das mais marcantes e chocantes foi quando, dias após a venda de uma das melhores armas que tinha em sua empresa, viu no noticiário que o cliente havia utilizado o armamento para matar sua família. “Há 30 anos trabalho com isso e há 30 anos vejo vidas sendo perdidas pelo comportamento das pessoas”, lamenta.

No Paraguai não é difícil encontrar armamento e munição de todos os tipos de calibres: revólveres, pistolas e até mesmo fuzis podem ser comprados, basta ter dinheiro para fechar o negócio. (Foto: O Presente)

 

Importação não é autorizada
A facilidade da compra de armamentos no Paraguai que entram no Brasil de forma ilegal é comprovada pelas inúmeras apreensões realizadas pelos órgãos de segurança na fronteira, que, muitas vezes, chegam a apreender armas de uso restrito das forças armadas. Apesar disso, na visão do agente da Polícia Federal de Guaíra, Thiago Graça Simões Amaral, não deverá haver um aumento na entrada ilegal de armas ou até mesmo no tráfico de armamentos por conta das recentes mudanças na legislação. “Acredito que se estivesse previsto, por exemplo, um período de anistia como foi em 2008, quando as pessoas puderam regularizar suas armas, poderíamos ter um aumento. Vejo que agora, o que muda, é que quem quiser ter uma arma legalizada no Brasil tem mais facilidades do que antes das mudanças no decreto”, afirma.
Ele explica que toda a importação de armamentos em território nacional passa pelo Exército Brasileiro e não tem relação com a Polícia Federal. O órgão de segurança, porém, é responsável pelo Sistema Nacional de Armas (Sinarm), que faz todo o controle de armas de fogo em poder da população, aquisição, registro, renovação de registro, transferência, entre outros. “Quando uma fabricante de armas transfere para um revendedor, no banco de dados do Sinarm essa arma já estará cadastrada e haverá a mudança do CNPJ do fabricante para o revendedor. Neste sentido, não há possibilidade de uma pessoa física tentar incluir uma arma adquirida por ela em outro país, porque precisa passar pela legalização no Exército Brasileiro e já constar no banco de dados do Sinarm”, exemplifica.

Sem previsão
Para o comandante do Batalhão de Polícia de Fronteira (BPFron) de Marechal Cândido Rondon, tenente-coronel Saulo de Tarso Sanson Silva, se a aquisição de armas de fogo na indústria nacional já é bastante burocrática, a compra de armas no exterior é ainda mais complexa. “A compra de armas em outros países necessita de prévia autorização do Exército Brasileiro, mais especificamente da Seção de Fiscalização de Produtos Controlados (SFPC)”, reforça.
Ele explica que, atualmente, as regras para importação de arma de fogo estão dispostas no decreto nº 5.123 de 1º de julho de 2004 no artigo 51 e seguintes, assim como nas regulamentações especiais do Exército, Polícia Federal e Receita Federal, a quem cabe o controle desse tipo de produto. “Nos moldes legais vigentes, quem pode fazer a aquisição de arma em outros países são os órgãos de defesa e segurança e os atiradores, colecionadores e caçadores registrados (CAC´s), que poderão obter do Comando do Exército, mediante solicitação, um Certificado Internacional de Importação”, diz.
Sanson pontua que, para aqueles que pretendem adquirir uma arma de fogo para segurança de sua casa ou trabalho, a chamada posse de arma para defesa pessoal, não há previsão no decreto 5.123/04 ou no Estatuto do Desarmamento (Lei 10.826/03) que preveja a importação. “A autorização fica a distrito da aquisição de armas no território nacional através de quem já tenha uma arma regularizada aqui, do comércio autorizado pelo Sinarm ou da indústria nacional”, menciona. “Esperamos que as pessoas não tentem realizar esse tipo de ação. A nossa orientação no que diz respeito às armas de fogo é sempre se informar com as autoridades acerca da melhor forma de fazer a aquisição e quais requisitos são necessários para proceder a compra de forma legal para não se sujeitar a complicações”, frisa.
O comandante orienta que na sede do BPFron há policiais que podem orientar as pessoas sobre este assunto, além da possibilidade de fazer perguntas pela página oficial do Batalhão de Fronteira no Facebook. “Caso haja alterações na lei pode ser que seja estendida a aquisição de armamento em outros países a quem deseja ter somente a posse da arma para defesa pessoal, mas ainda assim necessitará de prévia autorização do Exército para a aquisição”, frisa.

Pena
Atualmente, quem for flagrado pelas forças de Segurança Pública ou pela Receita Federal importando armas, acessórios ou munições sem autorização estará incorrendo no crime do artigo 18 da lei 10.826/03 e poderá ser preso em flagrante, sujeito a uma pena de quatro a oito anos e multa. “Até agora as prisões de armas ou munições pelo BPFron tinham características de tráfico para comercialização ilegal e outras ações criminosas. Ainda não temos registro de alguém que tenha tentado trazer uma arma do Paraguai ou qualquer outro país alegando regularizá-la posteriormente, mas, de qualquer forma, isso não deixa de ser crime”, alerta.

Tenente-coronel Saulo de Tarso Sanson Silva, comandante do BPFron: “Ainda não temos registro de alguém que tenha tentado trazer uma arma do Paraguai ou qualquer outro país alegando regularizá-la posteriormente, mas, de qualquer forma, isso não deixa de ser crime” (Foto: Arquivo)

(O Presente)

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