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Policial Entrevista ao O Presente

Lago de Itaipu pode receber projeto-piloto de torres digitais de monitoramento

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Coordenador-geral da CGFron, tenente-coronel Saulo de Tarso Sanson Silva, durante visita ao O Presente, na quarta-feira (15): “Pela primeira vez temos uma política do governo federal que olha as fronteiras e apoia os policiais. O Programa Vigia é um projeto estratégico” (Foto: Raquel Ratajczyk/OP)

As fronteiras terrestres, bem como o rendimento do crime organizado, não são mais os mesmos que outrora. Desde 2019, por meio da Coordenação Geral de Fronteiras (CGFron) da Secretaria de Operações Integradas (SEOPI) do Ministério da Justiça e Segurança Pública, o Programa Vigia atua nas áreas fronteiriças de 14 Estados e na região entre Guaíra e Marechal Cândido Rondon.

“Implementamos o programa com somente seis policiais do BPFron (Batalhão de Polícia de Fronteira) e alguns policiais federais no dia 15 de abril de 2019. A proposta foi e segue sendo a ação de cada um fora da sua caixa, por que o que acontecia na prática? Em uma semana o BPFron pegava cinco ou seis embarcações e a PF (Polícia Federal) outras cinco ou seis. Achávamos que fazíamos sucesso, mas em um certo ponto de Guaíra passavam mais de 300 embarcações por noite com cigarros, contrabando, armas e drogas”, rememora o coordenador-geral da CGFron, tenente-coronel Saulo de Tarso Sanson Silva, que foi comandante do BPFron de setembro de 2018 a dezembro de 2019.

O Programa Vigia, enaltece Sanson, surgiu para promover a articulação entre as instituições, de modo que haja governança, sem imposição de forças, com atuação de forma coordenada. “Catorze Estados aderiram ao programa. Há uma formalização por meio de um acordo de cooperação técnica (ACT) com as unidades federativas. Integra-se instituições municipais, estaduais e federais em prol do combate ao crime internacional nas fronteiras. Não só combater, mas também restringir o acesso. Esse é o principal problema”, expôs ao O Presente.

 

INTEGRAÇÃO COMO CHAVE

O Programa Vigia (vigilância, integração, governança, interoperabilidade de sistemas e autonomia) tem como trunfo a interação gerada entre as instituições de segurança. “Por que autonomia? Porque não há nenhum policial no comando. São as instituições que conhecem a região e a realidade do seu terreno”, salienta, acrescentando que o programa, que começou localmente hoje conta com cerca de 970 homens agindo diuturnamente nas fronteiras do país. “São várias instituições juntas, somando esforços para esse enfrentamento, sangrando as finanças do crime organizado”, evidencia.

O tenente-coronel destaca o papel do Centro Integrado de Operações de Fronteira (CIOF), parte do Programa Vigia, com central em Foz do Iguaçu. “No Brasil, cada Estado tem seu banco de dados e se você visse um carro do Amapá em Marechal Rondon, por exemplo, o policial rondonense não conseguiria informações sobre as bases daquele Estado. Nós solicitamos e conseguimos unir dados de 12 Estados no CIOF, com acesso imediato. Contamos com esse ranking de informações do Brasil inteiro, tanto de agentes da Operação Hórus, linha operacional do Programa Vigia, quanto de policiais federais. Por um simples WhatsApp, o policial cadastrado consulta essa base de dados. Foi uma grande inovação das nossas instituições que resultou em uma interoperabilidade entre sistemas dos Estados”, enfatiza.

 

RESULTADOS

Sanson enaltece que o sucesso do programa é medido pelos resultados apresentados. “O Programa Vigia causou um prejuízo estimado de R$ 4 bilhões entre tudo o que foi apreendido de 2019 até agora. Já passamos a marca de 1,1 mil toneladas de drogas apreendidas e mais de 127 milhões de maços de cigarro. Esses são os principais indicadores”, menciona.

Segundo ele, o primeiro embate do Programa Vigia faz com que os grupos criminosos sintam no bolso. “Essa é a primeira fase da operação. A segunda fase é mais profunda, de investigação. A terceira fase é pegar os barões do crime organizado”, indica.

 

OBSTÁCULOS NA LOGÍSTICA CRIMINOSA

Nos mais de 16,8 mil quilômetros de fronteira, o programa se articula por meio de bases operacionais integradas, que formam um cinturão de segurança. “É um cenário de baixa densidade demográfica, com ausência de algumas instituições em pontos estratégicos da fronteira. O governo federal, sob minha coordenação, faz uma parceria com os municípios. No Paraná temos quatro bases. Por exemplo, fizemos um cinturão na fronteira de Guaíra até Querência do Norte e percebemos que os criminosos passaram a fazer o transbordo de mercadoria em uma rota mais para cima”, aponta.

Diante dessa mudança na logística criminosa, o contrabando começa a perder rentabilidade aos poucos, expõe Sanson. Boa parte do cigarro consumido no Brasil, conforme ele, é contrabandeado do Paraguai, assim como o agrotóxico, muito apreendido na Costa Oeste do Paraná e em Santa Catarina. “Houve um aumento no valor de venda desses produtos falsificados, porque a repressão dificultou a logística. No que diz respeito ao agrotóxico, o programa tem um ACT com o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) para deixar essas operações mais frequentes, porque o agrotóxico é um crime silencioso, todos nós o consumimos e afeta a nossa saúde”, expõe.

 

ORÇAMENTO DE R$ 93 MILHÕES

Financiado pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública, o Programa Vigia atua em três eixos: operacional (com a Operação Hórus), de treinamentos e de aquisições. “Nesses dois anos de programa, chegamos ao orçamento de R$ 93 milhões. Um operador de segurança pública é 50% treinamento e 50% equipamento. Precisa estar bem treinado e bem equipado, são duas coisas importantes. O Vigia dá suporte e vai entregar, em dezembro, 230 viaturas para as fronteiras do Brasil. Só o Paraná vai receber 45 viaturas S10 4×4 e o BPFron vai ser contemplado com 16. O investimento em equipamentos no Paraná para a segurança da fronteira será na ordem de R$ 16 milhões”, mensura.

 

USO DE DRONES

O veículo aéreo não tripulado (vant) foi assunto na região recentemente e integraria a fiscalização aérea da região, auxiliando as ações da Operação Hórus. Porém, passados meses, o assunto “caiu por terra” e não se viu a ação do aparato aéreo. “As forças federais compraram o vant, mas a manutenção e a pilotagem dos equipamentos exigem treinamento especializado e, pelas informações que recebi, os drones foram repassados à Força Aérea Brasileira (FAB). Eles estão funcionando, mas não em sua totalidade”, informa.

 

TORRES DIGITAIS

Apesar das constantes ações do programa Vigia, o coordenador-geral diz que ainda há uma incidência considerável de crimes internacionais entre Guaíra e Foz do Iguaçu. “É um triângulo das bermudas brasileiro, um ponto sensível com portos clandestinos que recebem uma série de mercadorias”, compara, observando que a necessidade do local é tecnológica.

Segundo ele, há tratativas sobre a implantação de torres digitais para monitoramento da área. “Acompanhei a comitiva da Euro Frontier, um projeto semelhante ao Vigia no Brasil. Eles têm uma integração complexa entre os países e há maturidade. Eles propuseram um investimento inicial de 10 milhões de euros que será repassado às forças policiais daqui. Apresentamos o Vigia e esse projeto-piloto entre Guaíra e Foz do Iguaçu”, relata.

Para a área de fronteira oestina, o tenente-coronel ambiciona a implementação de torres digitais, com câmeras, radares e drones de alta capacidade. “A proposta é que inicie no Paraná, de Foz a Guaíra, numa cobertura tecnológica completa do Lago de Itaipu. A Emgepron (Empresa Gerencial de Projetos Navais), ligada à Marinha do Brasil, apresentou o projeto e levamos para a comitiva”, compartilha.

Tenente-coronel Saulo de Tarso Sanson Silva: “O programa de monitoramento projetado para Marechal Rondon também pode incorporar a rede do projeto Córtex, uma plataforma que reúne cerca de 24 mil faixas de câmeras. Basta criar um acordo de cooperação técnica” (Foto: Raquel Ratajczyk/OP)

 

PROJETO CÓRTEX

O Programa Vigia conta também com o projeto Córtex, uma plataforma que reúne cerca de 24 mil faixas de câmeras. “Nós espelhamos essas câmeras no Brasil inteiro para que tenhamos controle das nossas rodovias. O Córtex é um sistema de bastante sucesso para nós, muito importante para as agências de segurança nesse enfrentamento”, destaca Sanson.

O programa de monitoramento projetado para Marechal Rondon também pode incorporar a rede do projeto Córtex, indica o tenente-coronel. “Basta criar um acordo de cooperação técnica com o município e conseguimos espelhar essas imagens para a plataforma”, expõe.

 

CONSOLIDADO

Com resultados positivos gerados à sociedade e ambições para incrementar as ações, o coordenador-geral assegura que o programa Vigia não é ameaçado por trocas de governo em âmbito federal. “Trata-se de um programa de segurança integrada considerável. Não corre risco de ser extinguido, porque o Vigia é um programa entre Estados. Não tem como retroceder diante dos benefícios. Antigamente tinha-se uma preocupação com as Capitais, com grande densidade demográfica e alta criminalidade, e pela primeira vez temos uma política do governo federal que olha as fronteiras e apoia os policiais. O Programa Vigia é um projeto estratégico”, finaliza.

 

EXPANSÃO PARA A COSTA LESTE BRASILEIRA

“Se a maior potência mundial tem uma fronteira de três mil quilômetros com o México e já sofre no controle, imagina o Brasil”, compara Sanson, referindo-se às realidades brasileira e estadunidense. Ele acrescenta ainda um agravo: “Dez países fazem divisa com o Brasil em fronteiras abertas e terrestre. Além disso, são países com produção de maconha e refino de cocaína. Eles têm produção e o crime organizado vai às fronteiras buscar o lucro por meio do consumo interno brasileiro e para exportação ao continente europeu e africano”, relata.

Diante da fragilidade percebida nos extremos do país, o Programa Vigia deve, em breve, se estender à costa marítima do Brasil. “Temos o programa com essa frente na Costa Oeste e começamos a escrever o Vigia Azul, proposto para que atue na costa marítima. Há vários Estados, portos e marinas. Nos portos existem restrições, mas nas marinas o país está praticamente aberto e temos visto veleiros que vêm do continente europeu, entram no país, saem e não têm nenhum controle. A proposta do ministro (Anderson Torres) é que atuemos também nas fronteiras marítimas”, adianta o coordenador-geral da CGFron.

 

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