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Novos pneus deixarão corridas da Fórmula 1 mais dinâmicas na temporada 2018

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Não seria justo reclamar: a disputa pelas vitórias entre Lewis Hamilton, da Mercedes, e Sebastian Vettel, Ferrari, principalmente, fez da temporada de 2017 uma das melhores dos últimos anos. Mas queremos sempre mais, certo? Por que em vez de apenas Mercedes e Ferrari outras equipes não podem pensar também em vencer corridas?

As “pequenas mudanças” no regulamento, este ano, como a introdução do halo, o sistema de proteção para a cabeça do piloto, e o limite de apenas três unidades motrizes por piloto, para as 21 etapas do campeonato, podem, como vimos em outra reportagem, mexer nessa ordem de forças. Há espaço para surpresas.

Mas existe outra importante variável, agora, e ainda mais contundente quanto a poder interferir no andamento das competições: os pneus.

Mario Isola, diretor da Pirelli, fornecedora da F1, diz que o aprendizado no primeiro ano do novo regulamento, 2017, com pneus mais largos e carros de maior pressão aerodinâmica, “permitiu projetar e construir pneus para 2018 capazes de fazer com que a maioria das corridas volte a ter dois pit stops em vez de apenas um”.

Em entrevista exclusiva para o GloboEsporte.com, Isola explicou que os pneus para o mundial que vai começar dia 25 de março, na Austrália, são mais macios que os da temporada passada. A medida corresponde uma volta ao cenário de 2016, quando no total a F1 teve, em 21 etapas, 933 pit stops. Já em 2017, em 20 etapas, foram apenas 533, ou 57,12% dos pit stops de 2016.

Enquanto em 2016, último com os pneus menos largos e de elevada degradação, a média foi de 44,42 pit stops por GP, ou 2,22 pit stops por piloto por GP, no ano passado a média por GP não passou de 26,65 pit stops, sendo que por piloto ficou em 1,33 pit stop.

O campeonato foi disputado do início ao fim porque a Ferrari, contra as tendências, por ter remodelado o departamento técnico oito meses antes do início da temporada, teve grande mérito na construção de um carro que fez algo que ninguém havia conseguido desde a introdução da tecnologia híbrida na F1, em 2014: desafiar a Mercedes.

Quem poderia imaginar no fim de 2016, depois da hegemonia absoluta da Mercedes de 2014 a 2016, com três títulos de pilotos e três de construtores, que Vettel e a Ferrari quase venceriam o mundial de 2017?

Mesmo com corridas sem maiores possibilidades de as equipes jogarem com a estratégia, em razão de os pneus serem relativamente duros e, por isso, bastante duráveis, justificando um pit stop em média por GP, assistimos a belos pegas, em especial entre Hamilton e Vettel.

 

Maior margem de estratégia

Ninguém sabe como será o começo do campeonato deste ano, apesar de o regulamento mudar pouco, mas faz sentido esperarmos corridas mais dinâmicas. Mesmo que James Allison acerte em cheio no novo projeto da Mercedes ou Mattia Binotto, da Ferrari, coordene a produção de outro carro veloz e equilibrado, sem esquecer a possibilidade de outro time, como a RBR, aparecer com um monoposto vencedor, segundo o diretor da Pirelli “as características dos novos pneus vão ampliar significativamente a margem de estratégia”.

Outra boa notícia para o espetáculo é a preocupação dos técnicos sob a liderança de Isola terem trabalhado para reduzir um fenômeno que afetou algumas equipes em 2017: os pneus não atingirem a temperatura ideal de aderência. Ou mesmo irem além. Na prova de Sochi, na Rússia, Hamilton recebeu a bandeirada em quarto. Em Mônaco, sétimo, por esse motivo.

A mesma dificuldade de fazer os pneus trabalharem na faixa ideal de temperatura, e no final um furo, foram os responsáveis por Vettel ficar somente em sétimo no evento de Silverstone, na Inglaterra.

“Vimos em certos GPs alguns times com temperaturas bem distintas entre os pneus dianteiros e traseiros (provocando desequilíbrio no carro). Constatamos, também, times que compreenderam que se penalizassem um pouco um ou outro, frente ou traseiro, obteriam um resultado geral bem melhor dos quatro. E presenciamos, ainda, times que tiveram êxito em fazer os quatro pneus trabalharem muito bem (clara referência a Ferrari)”, disse Isola.

 

Mercedes X Ferrari

Todos viram, de acordo com o italiano, que a Ferrari privilegiou no começo o ritmo de corrida, em detrimento, um pouco, do de classificação. A Mercedes seguiu caminho inverso. Um fato ajudou a Ferrari explorar melhor os pneus. “Escalaram os pilotos titulares (Vettel e Raikkonen) para os testes de desenvolvimento que realizamos. A Mercedes, não. Agora parece ter aprendido a lição.”

O modelo W08 Hybrid da Mercedes fazia os pneus se desgastarem mais que os do modelo SF70H da Ferrari ao longo dos 305 quilômetros da corrida. “Os pneus da Mercedes estavam submetidos a estresse maior. Eles fizeram grandes esforços para melhorar o carro nesse sentido ao longo do campeonato, assim como a Ferrari procurou fazer seu carro ser mais rápido nas definições do grid, mas sem perder o que tinha de melhor, a velocidade e o equilíbrio nos domingos.”

E conclui o raciocínio: “Na parte final da temporada era impossível prever como seriam a definição do grid e a corrida, Ferrari e Mercedes tinham velocidades muito semelhantes”.

O curioso, nessa história, conta o engenheiro, é o fato de em 2017 mesmo pequenas diferenças de temperatura aparecerem muito mais que em 2016. “Com a supercompetitividade entre Mercedes e Ferrari, as duas buscavam o máximo do máximo dos pneus. Vale para as demais escuderias também, um décimo de segundo podia dar até três posições no grid.”

Seguiu na explicação: “Em 2016, quando o acerto escolhido fazia os pneus trabalharem por exemplo dez graus fora da faixa ideal, isso não tinha tanta importância por ninguém poder lutar com a Mercedes e o grid estava menos compacto. Já em 2017, ficar fora da faixa de temperatura implicava grande vantagem aos adversários, aparecia demais.”

É verdade, como contou, que algo poderia ser feito pela empresa para 2018. “Nós investimos para melhorar nesse aspecto. Mas é importante dizer que não tivemos a chance, em 2016, de usar os carros de 2017 nos testes, com geração de pressão aerodinâmica bem maior que a dos carros que utilizamos, chamados mulas, somente adaptados para gerar maior pressão aerodinâmica”, explicou o diretor da Pirelli.

“Quando pusemos os novos pneus nos modelos de 2017, já nos testes de inverno, entendemos logo que a carga a que os pneus estavam submetidos era bem maior. Felizmente fomos prudentes ao projetar e construir pneus mais duros, para suportar os esforços previstos nas nossas simulações e não dos testes de pista”.

 

Maior diferença entre os tipos de pneus

Além de procurar aumentar, este ano, a faixa de temperatura que os novos pneus vão funcionar, a fim de reduzir a possibilidade de dificuldades como a de Hamilton em Mônaco e Vettel em Silverstone, dentre outros exemplos, Isola deu detalhes do que foi feito para as corridas terem dois pit stops, elevando o seu grau de incerteza, o que leva a disputa ser menos previsível: “Todos sabem que introduzimos um tipo de pneu ainda mais macio, os hipermacios. E procuramos aumentar a diferença de desempenho entre um tipo e outro de pneu, justamente para ampliar, também, a margem de escolha”.

Cada piloto tem direito a 13 jogos de pneus por fim de semana de GP. Junto com sua equipe eles escolhem 10 jogos dentre os três tipos de pneus disponibilizados pela Pirelli. Os outros 3 jogos são definidos pela empresa em conjunto com os comissários da FIA, os mesmos para os 20 pilotos da F1.

O projeto, em 2018, é para que entre os hipermacios e os ultramacios haja um segundo de diferença. Entre o ultramacio e o supermacio, passe de algo como meio segundo para sete ou oito décimos de segundo. Entre o supermacio e o macio e entre o macio e médio, da mesma forma a diferença de desempenho fique na casa dos sete ou oito décimos de segundo. É pouco provável que o duro e outra novidade, o superduro, venham a ser utilizados.

Com a implantação de compostos de borracha mais moles na banda de rodagem, este ano, a velocidade proporcionada em 2017 pelos pneus ultramacios será disponibilizada, agora, pelos supermacios. A dos supermacios, pelos macios. A velocidade que antes era oferecida pelos macios, em 2018 ficará para os médios. Os hipermacios deverão ser usados apenas nas etapas de Mônaco e da Rússia, onde o tipo de traçado e a natureza do asfalto geram bem pouco desgaste aos pneus.

 

Escolhas mais agressivas

Outra mudança na filosofia da Pirelli, em 2018, é poder ser mais agressiva na escolha dos tipos de pneus para as 21 pistas do calendário. “Em 2017 tínhamos de ser mais conservadores, por causa das limitações dos testes, como falei, com carros que não reproduziam as condições dos modelos de 2017. Agora temos conhecimento bem maior.”

A empresa já anunciou os tipos de pneus escolhidos para as quatro primeiras etapas do mundial, Austrália, Bahrein, China e Azerbaijão. Tendo em mente que os pneus estão mais macios, os tipos definidos em conjunto com comissários da FIA ratificam a maior agressividade mencionada pelo diretor da Pirelli.

E no que diz respeito ao GP da China, há até a novidade de a escolha pular a escala normal, ao serem definidos os pneus ultramacios, macios e médios, enquanto seria de se esperar que antes dos macios viessem os supermacios. Fará, com certeza, diferença na estratégia de cada piloto.

“Não é fácil você projetar um pneu que faça com que os pilotos realizem precisamente dois pit stops nas corridas”, disse o diretor da Pirelli. “Nós recebemos uma carta, assinada por integrantes da FIA, FOM, os pilotos, a chamada Target Letter, onde todos expressavam os objetivos que nós deveríamos ter.”

O documento pedia para os pneus favorecerem as ultrapassagens, gerarem um número ideal de pit stops nas corridas, oferecerem maior diferença de performance entre um e outro tipo e apresentassem menor degradação, a fim de os pilotos poderem acelerar do início ao fim. Na era Bernie Ecclestone o pedido era para o desgaste ser elevado para provocar muitos pit stops.

“Atingimos a maioria desses objetivos em 2017. Para 2018, como falei, os GPs deverão ter mais pit stops, satisfazendo outro pedido. Mas os pilotos já não precisam mais ficar pensando em não acelerar para preservar os pneus.”

O retorno dado pelos pilotos pelo expressivo aumento de velocidade, outro desejo da classe, foi bastante positivo, comentou Isola. “Gostaram de fazer de pé em baixo a curva Copse, em Silverstone, as curvas 5 e 6 de Sepang e a 3 de Barcelona também. Registramos 40 ou 50 km/h a mais nas velocidades, de 220 para 260, 270 km/h, com 1 G a mais de aceleração, de 4 para 5 Gs, é muita coisa de um ano para o outro.”

Os novos pneus serão usados pelos modelos de 2018 pela primeira vez de 26 de fevereiro a 1º de março no Circuito da Catalunha, em Barcelona, série de testes inicial da pré-temporada. Mais moles, podem permitir aumento ainda maior nas velocidades de contorno das curvas mais rápidas. Se for mesmo assim, pilotos e fãs vão gostar ainda mais.

 

Globo Esporte

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