Fale com a gente

Geral

Como a reforma da Previdência afeta sua aposentadoria?

Publicado

em

 

Mirely Weirich/OP
Proposta do governo objetiva diminuir o déficit crescente do sistema previdenciário brasileiro. No entanto, medidas afetam diretamente os trabalhadores

 

Os quatro anos que estavam batendo na porta do servidor público rondonense Rui Francisco Kuhn, de 53 anos, para que alcançasse a tão sonhada aposentadoria, saltaram para seis caso a proposta de reforma da Previdência Social apresentada pelo governo federal seja aprovada. Vai castigar muita gente. Para nós que temos esse tempo adquirido não deveria mudar muita coisa. Uma reforma seria boa, mas deveria ser melhor pensada para os trabalhadores que estão tão próximos de conseguirem esse direito, desabafa.

A proposta do governo fixa a idade mínima de 65 anos para homens e mulheres – que atualmente é de 35 e 30 anos respectivamente – requererem a aposentadoria, e eleva o tempo mínimo de contribuição de 15 anos para 25 anos. A aposentadoria integral (100% do valor do benefício) só será concedida àqueles que completarem 49 anos de contribuição ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Nesta conta, para conseguir receber o benefício integral com a idade mínima, o trabalhador precisaria contribuir desde os 16 anos de idade, sem interrupção. Quem se aposentar com um tempo menor receberá um valor proporcional, limitado a 76% do benefício, com pelo menos 25 anos de contribuição.

De acordo com o cálculo do governo, aos 65 anos e com 25 anos de contribuição, o valor do benefício será de 76% da média de todas as contribuições. Com 26 anos de contribuição, 77%. Com 27 anos, 78%. Chegando a 100%, ou seja, aposentadoria integral, com 49 anos de contribuição. Mas eu duvido muito que isso vá acontecer com algum trabalhador como a gente. Ninguém consegue trabalhar até os 65 anos ou contribuir 49 anos. Só os cargos altos, que têm carros à disposição e outras pessoas que façam tudo por eles. Para nós que damos duro todos os dias, não vai ter como, diz o servidor público, que há 14 anos, cuida da manutenção do prédio da Prefeitura de Marechal Cândido Rondon, mas já atua no funcionalismo há 22.

A nova proposta também impacta o rondonense de outra forma: os funcionários públicos já possuíam um regime próprio e separado da Previdência dos trabalhadores privados, por isso parte das aposentadorias vem das contribuições dos próprios servidores e outra do governo. Caso a reforma entre em vigor, não haverá mais essa diferença entre o regime da Previdência geral e do funcionalismo público.

 

Direito adquirido

A proposta, no entanto, preserva os direitos de quem recebe o benefício ou já tem as condições para se aposentar, ou seja, nada se altera para aquelas pessoas que já contam com aposentadoria, pensões e para aqueles que mesmo não aposentados já completaram as condições de acesso à aposentadoria até a data em que o projeto de emenda constitucional (PEC) for promulgado. Quem conseguir preencher os requisitos para aposentadoria na vigência das regras atuais, antes de mudar qualquer lei ou emenda constitucional, mesmo que não fez o pedido junto à Previdência, poderá pedir o benefício com as regras anteriores porque se trata do instituto do direito adquirido, esclarece o advogado Alcemir Moraes, especialista em Direito Previdenciário.

Na visão do advogado, há necessidade de um estudo mais aprofundado para abarcar não somente com o déficit da Previdência, mas, sim, com os problemas econômicos como um todo, e como essas reformas iriam impactar no contexto geral, criando mecanismos para trazer recursos para a Previdência, que vem a beneficiar pessoas de baixa renda em sua maioria. Provavelmente vai se tornar uma realidade o trabalhador se aposentar e aproveitar por cinco ou dez anos, porque mesmo que a expectativa de vida tenha aumentado e seja necessário subir a idade mínima da concessão do benefício para que a pessoa não seja um gasto eterno para o INSS, na medida em que vai se dificultando não há garantia que obrigar as pessoas a trabalharem mais para se aposentar não vá diminuir a expectativa de vida por problemas de saúde causados pelo ofício, opina.

 

Novo cálculo

Na regra atual, calcula-se 80% das maiores contribuições do segurado ao INSS para chegar a uma média do benefício. E isso passa também pelo fator previdenciário, que faz cair o valor da aposentadoria caso a pessoa seja muito nova, destaca Moraes.

A reforma prevê que o novo cálculo considere uma média de todos os benefícios e que se aplica 51% sobre este valor, acrescido de 1% por cada ano de contribuição. O governo pretende mexer no cálculo e pressionar o trabalhador a contribuir mais tempo para melhorar o valor a receber.

 

Regra de transição

Haverá uma regra de transição para não prejudicar quem está perto da aposentadoria. De acordo com ela, homens que estiverem com 50 anos ou mais e mulheres com 45 anos ou mais poderão se aposentar pelas regras atuais, pagando uma espécie de pedágio de 50% sobre o tempo que faltava para a aposentadoria.

Este é o caso de Rui Kuhn, que pelo tempo de contribuição, hoje, deveria trabalhar mais quatro anos, porém, caso a reforma seja aprovada, precisará trabalhar mais 50% deste período, ou seja, mais dois anos. Se hoje ele tem 31 anos de contribuição, seriam necessários mais 18 para chegar aos 49 e garantir o benefício integral, explica o advogado Itamar DallAgnol.

Com os 53 anos de idade somados aos 31 de contribuição, na fórmula 85/95, Kuhn somaria 84 pontos. Faltariam para 11 anos, então ele teria que trabalhar ainda mais cinco anos e meio para pegar 100% da aposentadoria, mas, se a reforma for aprovada, ele precisaria de 18 anos. Ele terá que contribuir seis anos para entrar no novo sistema e pegar proporcional, aproximadamente 78%, enquanto no sistema atual ele pegaria benefício integral em cinco anos, apresenta.

DallAgnol avalia que há necessidade de uma reforma para excluir os benefícios excessivos a determinadas pessoas e, na visão dele, os trabalhadores de forma geral contribuem de forma suficiente com o INSS. O problema é que aproximadamente 33 milhões de trabalhadores brasileiros ganham a mesma coisa de 3,5 milhões de beneficiários do sistema de segurança, que inclusive não serão afetados por essa reforma apresentada e estão dando o furo na Previdência, menciona o advogado.

O governo determinou que bombeiros, policiais militares e as Forças Armadas ficarão de fora das mudanças de aposentadorias do país e serão tratados em projetos à parte.

 

Modalidades de Benefícios Previdenciários

De acordo com o advogado especialista em Direito Previdenciário, Alcemir Moraes, conforme as regras atuais da Previdência Social, os benefícios previdenciários são de várias espécies e cada um tem requisitos distintos, por isso cada caso deve ser tratado de forma particular para o cálculo de quanto tempo ainda falta para o contribuinte conquistar a aposentadoria tanto nas regras vigentes quanto no texto apresentado para a reforma da Previdência.

 

Por Invalidez: Não exige idade mínima, mas, sim, qualidade do segurado por ocasião da invalidez ou incapacidade de trabalhar. A pessoa começou a ficar doente, mas ainda consegue trabalhar. Isso não significa incapacidade, explica Moraes. Com um ano de contribuição, diz, essa pessoa adquire a qualidade de segurada e, se um ano e um dia após este período essa doença causar alguma incapacidade, ela tem o direito de receber a aposentadoria por invalidez independentemente da idade.

O texto não prevê mudanças nesta modalidade.

 

Aposentadoria por tempo de contribuição: Pelas regras de hoje, não existe idade mínima para aposentadoria por tempo de contribuição no INSS. O que é exigido para esse tipo de aposentadoria é o tempo mínimo de contribuição, de 30 anos para mulheres e de 35 para homens. A regra 85/95 não muda em nada o requisito de acesso ao benefício.

 

Fórmula 85/95: Essa fórmula tem previsão para durar até 2026, mas com a reforma vai acabar. Atualmente, a pessoa precisa ter uma idade mínima e um tempo de contribuição mínimo que some um determinado número de pontos – 85 para mulheres e 95 para homens – para conseguir a aposentadoria integral. Com a mudança, a aposentadoria exclusivamente por tempo de contribuição no setor privado vai acabar e valerá a idade mínima de 65 anos mais um tempo mínimo de contribuição de 25 anos.

 

Por idade: Aposentadoria por idade urbana: Para mulheres, a regra estipula 60 anos e, para homens, 65 anos, levando em conta que o trabalhador deve ter contribuído por 15 anos com a Previdência Social. Algumas vezes o INSS nega, porque o patrão não recolheu o benefício e aí surge a dúvida: se o empregador não pagou essa contribuição, eu tenho o direito ao benefício? Tem. Uma vez que a carteira de trabalho foi assinada, se o empregador não pagar a contribuição quem tem que cobrar é o INSS do patrão, e não o funcionário, esclarece.

 

Aposentadoria por idade rural: Para mulheres a idade é de 55 anos e para homens de 60 anos. Neste caso, Moraes diz que a idade é reduzida levando em conta o desgaste na saúde do trabalhador rural, que geralmente é maior do que o trabalhador urbano. Nesta categoria, a exigência é de 15 anos de trabalho rural contínuo ou descontínuo, ou seja, a mulher ter trabalhado dos 40 aos 55 anos, por exemplo, e o homem dos 45 aos 60 anos. Ou descontínuo, desde que quando completou a idade ou requereu o benefício esteja trabalhando no campo, expõe.

Aos trabalhadores rurais, a contribuição ao INSS se torna obrigatória para pedir aposentadoria caso o novo texto seja aprovado – ao contrário do que é hoje. Além disso, a idade será fixada em 65 anos para homens e mulheres.

 

Aposentadoria por idade híbrida/mista: Esta possibilidade de aposentadoria, aberta em 2008, é voltada para pessoas que trabalharam tanto na zona rural quanto na zona urbana, mas não conquistaram os 15 anos de contribuição nem de trabalho rural. Devido ao êxodo rural, as pessoas que estavam na cidade, apesar de ter o tempo de trabalho no campo, quando alcançava a idade mínima para aposentadoria não estavam mais na roça e ficavam sem direito ao benefício, pontua.

Ao contrário da aposentadoria por idade rural, a possibilidade de somar o trabalho no campo com a contribuição urbana não exige que a pessoa esteja trabalhando por ocasião do implemento da idade, já que a modalidade é equiparada a uma aposentadoria por idade urbana, ou seja, não é necessário estar gozando da qualidade de segurado. Contudo, na via administrativa eles não reconhecem, então no INSS o benefício só é concedido quando o último trabalho foi rural. Já no âmbito do Direito, a ampla maioria já reconhece e há súmulas nos tribunais no sentido de que é possível a concessão dessa aposentadoria mesmo que o último trabalho tenha sido urbano, menciona.

 

Pensão por morte: Concedida aos dependentes dos segurados quando o segurado falece e deixa dependentes nessas condições, com a reforma da Previdência a pensão será reduzida à metade, com acréscimo de 10% por dependente, e à medida que o dependente atingir 21 anos o valor não poderá ser revertido para a viúva. Pelas novas regras não será permitido acumular pensão com aposentadoria, ou seja, o cônjuge sobrevivente terá de optar entre receber a pensão ou a aposentadoria, destaca Moraes. Com isso, as pensões podem ficar abaixo do valor do salário-mínimo, ao contrário das aposentadorias, que têm como piso o valor do mínimo.

 

Benefícios assistenciais (LOAS): O Benefício da Prestação Continuada da Lei Orgânica da Assistência Social (BPC/LOAS) é a garantia de um salário-mínimo mensal ao idoso acima de 65 anos ou ao cidadão com deficiência física, mental, intelectual ou sensorial de longo prazo, que o impossibilite de participar de forma plena e efetiva na sociedade, em igualdade de condições com as demais pessoas. Por se tratar de um benefício assistencial, não é necessário ter contribuído ao INSS para ter direito a ele.

A ideia do governo é desvincular este benefício da política de reajuste do salário-mínimo, que permite ganhos reais. Os benefícios seriam reajustados só pela inflação. A idade deve subir de 65 anos para 70 anos.

 

Votação do projeto

A expectativa do governo é de que o texto seja aprovado no primeiro semestre do próximo ano pelo Congresso Nacional. Por se tratar de uma mudança na Constituição, tem de passar pelos plenários da Câmara e do Senado, em duas votações, com maioria de 3/5 dos parlamentares, além de sessões do Congresso Nacional.

 

Efeitos na economia

O objetivo do governo ao propor uma reforma da Previdência é tentar manter a sustentabilidade das contas públicas, diante de um déficit crescente do sistema previdenciário brasileiro. Em 2015, o rombo do INSS foi de

R$ 86 bilhões. Em 2016, deve chegar a R$ 152 bilhões e, em 2017, a R$ 181 bilhões.

Até 2015, de cada 100 brasileiros, 12 eram idosos. Em 2060, eles serão quase a metade, ou seja, mais gente vai viver de aposentadoria. Segundo o governo, este é o motivo da urgência da reforma e se ela for aprovada em 2017, a economia do INSS passaria para R$ 4 bilhões em 2018. Mais de R$ 14 bilhões no ano seguinte até chegar a R$ 700 bilhões em um período de dez anos.

Copyright © 2017 O Presente