Fale com a gente

Geral

Imunoterapia: nova esperança na luta contra o câncer

Publicado

em

 

Fotolia

Considerada como o maior avanço contra o câncer em 2016, a técnica representa tanto para médicos como pacientes diagnosticados um novo caminho para vencer a doença. O tratamento, no entanto, pode chegar a custar até R$ 40 mil por mês

Até o fim deste ano, mais de 596 mil novos casos de câncer devem ser registrados em todo o Brasil. Os dados são oriundos da publicação Estimativa 2016: Incidência de Câncer no Brasil, publicada pelo Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva (Inca), que também estima que, entre os homens, são esperados 295 mil novos diagnósticos e, entre as mulheres, 300 mil.

O tipo de câncer mais incidente em ambos os sexos será o de pele não melanoma (175.760 casos novos no ano, sendo 80.850 em homens e 94.910 em mulheres), que corresponde a 29% do total estimado. Depois desse, para os homens, os cânceres mais incidentes serão os de próstata (61,2 mil novos casos/ano), pulmão (17.330), cólon e reto (16.660), estômago (12.920), cavidade oral (11.140), esôfago (7.950), bexiga (7,2 mil), laringe (6.360) e leucemias (5.540). Entre as mulheres, as maiores incidências serão de cânceres de mama (57.960), cólon e reto (17.620), colo do útero (16.340), pulmão (10.860), estômago (7,6 mil), corpo do útero (6.950), ovário (6.150), glândula tireoide (5.870) e linfoma não-Hodgkin (5.030).

Em um cenário em que a incidência de novos casos não para de crescer e, para o paciente diagnosticado os tratamentos disponíveis pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e pelos planos de saúde representam uma luta árdua diária contra a doença e seus duros efeitos colaterais, descobertas que estão mudando o paradigma do câncer e viabilizando novas drogas enchem médicos e pacientes de um novo sentimento: a esperança.

A imunoterapia, capaz de representar uma revolução tão grande na oncologia que a Sociedade Americana de Oncologia Clínica (ASCO) a elegeu o maior avanço contra o câncer em 2016, é uma técnica que, ao invés de atacar o organismo como a quimioterapia e a radioterapia, fortalece o corpo para que ele combata a doença com o mesmo objetivo dos tratamentos já conhecidos: atingir a massa tumoral. A defesa imunológica do organismo é um processo normal, mas que em algumas circunstâncias não funciona de forma adequada. O que a imunoterapia faz é restaurar essa capacidade, ou substituí-la, por exemplo, administrando anticorpos prontos, explica Ricardo Caponero, oncologista da Clinonco, de São Paulo, em entrevista ao Jornal O Presente.

O câncer surge quando, por algum motivo, ocorre um erro na duplicação das células do corpo, dando origem a uma célula cancerosa. Com o DNA danificado, ela passa a se multiplicar fora de controle. Essas células podem enganar o sistema imunológico para que ele pense que elas não representam ameaça. Assim, são capazes de desligar a resposta imune que poderia destruí-las.

De acordo com o oncologista clínico do Hospital do Câncer de Cascavel (Uopeccan), Ademar Dantas da Cunha Júnior, a imunoterapia, que estimula os linfócitos a combater a doença e inibe o efeito imunossupressor do câncer, é um anticorpo administrado endovenoso, por cerca de 60 minutos a cada 15 ou 21 dias durante dois anos, ou até a progressão da doença. Por enquanto, os estudos de fase três mostram efetividade em câncer de pulmão, melanoma e bexiga, porém em praticamente todos os tipos de tumores existem pesquisas em andamento para aplicação da técnica, enfatiza.

Caponero complementa que, além disso, a imunoterapia tem sido muito útil no câncer de rim, no melanoma e no câncer de pulmão, doenças em que tradicionalmente a quimioterapia citotóxica convencional obtinha resultados muito pobres. Nem todas as pessoas podem passar por este tratamento, pois na medicina nada pode ser generalizado. As indicações são sempre individualizadas e fundamentadas em criteriosa avaliação médica. O futuro é promissor, mas a indicação da imunoterapia ainda é restrita. Os usos estão se ampliando, mas, por exemplo, para o câncer de mama o tratamento ainda não mudou, complementa o oncologista.

Apesar de os agentes imunomoduladores serem considerados uma forma recente do tratamento, Caponero afirma que a aplicação de imunoterapia remonta a épocas anteriores às da quimioterapia, com o uso de Corynebacterium parvum e Bacilo Calmette-Guérin, por exemplo, que eram uma forma de imunoterapia ativa e inespecífica. Também já utilizamos interferons, interleucinas e outras formas de tratamento, que também eram imunoterapia. O interesse foi renovado em função da descoberta de novos mecanismos de ação e de novos agentes, destaca.

O oncologista diz que esse tipo de tratamento não atingiu todo o seu potencial nem no Brasil nem no restante do mundo, pois é uma área terapêutica nova em que há extensa pesquisa sendo realizada. Podemos até arriscar a dizer que esse será o cenário da próxima década de desenvolvimento na oncologia e o Brasil, como sempre, está alguns passos atrás, menciona.

 

Imunoterapia x Quimioterapia

Apesar de nem todos os pacientes oncológicos apresentarem uma boa resposta a esses novos medicamentos, já que os resultados dependem da fase e do tipo de tumor do paciente, o oncologista da Uopeccan destaca que a imunoterapia pode apresentar menos efeitos adversos do que a quimioterapia, por exemplo, e são mais bem tolerados por alguns pacientes e, em geral, não afetam as células saudáveis. Os efeitos adversos geralmente são relacionados à aumento de inflamação no organismo (fígado, intestino, medula óssea, pulmão), explica Júnior.

De acordo com Caponero, a única coisa em comum entre a imunoterapia e a quimioterapia é que ambos são utilizados contra o câncer. De resto, não há nenhuma outra semelhança, afirma. Talvez as duas modalidades de tratamento não sejam excludentes. É bem provável que no futuro estejamos combinando os tratamentos, completa.

Na visão dele, os efeitos colaterais não são melhores aos que os da quimioterapia. Alguns imunomoduladores podem causar até a morte do paciente, por encefalite, por exemplo. A única coisa que acontece, como o mecanismo de ação, é que a toxicidade é muito diferente. Não menos intensa, mas diversa da quimioterapia tradicional. O rol de eventos adversos compõe uma lista tão grande que já são chamados, em conjunto, de eventos imunorrelacionados, esclarece.

Ele diz que, como tudo na medicina, o tratamento pode ser curativo para alguns e não fazer o menor efeito para outros. Por isso os pesquisadores e clínicos buscam biomarcadores que possam ser fatores prognósticos ou preditivos de resposta e que possam auxiliar a dar o tratamento correto para os pacientes que, de fato, vão se beneficiar da imunoterapia. Ainda assim, este tratamento representa para a medicina uma esperança, um passo a mais, um progresso significativo e o começo de mais uma longa jornada que ainda não terminou, opina Caponero.

 

Alto custo

Cirurgias, quimioterapia, radioterapia e imunoterapia são os principais tratamentos que comprovadamente podem eliminar alguns tipos de câncer. São eles que permitem que até 80% dos cânceres infantis desapareçam e garantem também índices muito bons para tumores de testículo, ovários, linfomas e, mais recentemente, melanomas.

Os tratamentos estão avançando, mas a questão ainda é o acesso, pois falta que esses tratamentos estejam disponíveis a todos os pacientes. Apesar de a imunoterapia ser uma nova arma contra o câncer e cada vez mais as farmacêuticas concentrarem seus esforços em avanços para melhorar os tratamentos contra a doença, a nova esperança de médicos e pacientes só é acessível a uma pequena parcela da população, já que os preços dos medicamentos utilizados na imunoterapia estão se tornando inacreditavelmente altos.

Mesmo disponível em qualquer local do país – inclusive no Oeste do Paraná -, de acordo com solicitação ao convênio ou por parte individual de cada paciente conforme prescrição médica, Júnior afirma que este é um tratamento caro, em torno de R$ 30 mil a R$ 40 mil por mês. Além disso, não está previsto pelo SUS e nem no rol de procedimentos de alguns planos de saúde, que não pagam pelo medicamento, afirma.

Para Caponero, falar da viabilidade econômica dos medicamentos ainda é uma questão muito complexa. Considerando apenas essa nova forma de imunoterapia, os imunomoduladores, as drogas não estão disponíveis no SUS. Na saúde suplementar, uma vez aprovados pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) são de cobertura obrigatória em função da lei nº 9656, e os preços variam em função da medicação utilizada e do tamanho do paciente, já que a maioria dos medicamentos é administrada em miligramas por quilo de peso, informa.

O oncologista destaca, ainda, que a imunoterapia não se trata de uma opção do paciente. Há indicações precisas e em muitos casos ela ainda pode não ser a imunoterapia. Então não adianta o desejo do paciente. Ele pode escolher quando há opções equivalentes, mas não pode determinar a conduta quando há uma diretriz terapêutica vigente, conclui.

Copyright © 2017 O Presente