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Fátima Baroni Tonezer

Então é Natal!

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Estamos nos aproximando de 25 de dezembro, dia estabelecido para comemorar o nascimento de Jesus Cristo. Data importante para todos os cristões mundo afora, evoca em todos muitas emoções, como alegria que nos preenche de afetos. E ruins, pesados de sentir, como a perda de alguém querido. Ou a frustração e a raiva por dividir o espaço com pessoas com as quais há diferenças (políticas, religiosas etc.). Como diria o eterno rei Roberto Carlos, são tantas emoções.

E refletindo sobre o que significa o Natal, para minha família, pessoas que fazem parte do convívio e para mim mesma, me deparei com um conto, uma pequena história compartilhada há muitos anos.

O ENVELOPE NA ÁRVORE

É apenas um pequeno envelope branco pendurado entre os galhos da nossa árvore de Natal.

Não tem nome, não tem identificação, não tem dizeres. Se esconde entre os galhos da nossa árvore há cerca de dez anos. Tudo começou porque meu marido Mike odiava o Natal. Claro que não era o verdadeiro sentido do Natal, mas seus aspectos comerciais: gastos excessivos, a corrida frenética na última hora para comprar uma gravata para o tio Harry e o talco da vovó, os presentes dados com uma ansiedade desesperada porque não tínhamos conseguido pensar em nada melhor.

Sabendo como ele se sentia, um certo ano decidi deixar de lado as tradicionais camisetas, casacos, gravatas e coisas no gênero. Procurei algo especial só para o Mike. A inspiração veio de uma forma um tanto incomum.

Nosso filho Kevin, que tinha 12 anos na época, fazia parte da equipe de luta livre da sua escola.

Pouco antes do Natal, houve um campeonato especial contra uma equipe patrocinada por uma igreja da parte mais pobre da cidade.

A equipe era formada, em sua maioria, por negros. Esses jovens, que usavam tênis tão velhos que tínhamos a sensação de que os cadarços eram a única coisa que os segurava, contrastavam de forma gritante com nossos filhos, vestidos com impecáveis uniformes azuis e dourados e tênis especiais novinhos em folha.

Quando o jogo começou, fiquei preocupada ao notar que a outra equipe estava lutando sem o capacete de segurança que tinha como intuito proteger os ouvidos dos lutadores. Era um luxo ao qual a equipe dos pés sujos não podia se dar. No fim das contas, a equipe da escola do meu filho acabou arrasando com eles. Ganharam em todas as categorias de peso.

E cada um dos meninos da outra equipe que levantava do tatame se virava com fúria, fazendo pose de valente, procurando mostrar um orgulho de quem não ligava para a derrota. Mike, que estava sentado ao meu lado, balançou a cabeça, triste:

“Queria que pelo menos um deles tivesse ganhado”, disse. “Eles têm muito potencial, mas uma derrota dessas pode acabar com o ânimo deles”.

Mike adorava crianças – todas as crianças – e as conhecia bem, pois tinha sido técnico de times mirins de futebol, basquete e vôlei.

Foi aí que tive uma ideia para o presente dele. Naquela tarde, fui a uma loja de artigos esportivos e comprei capacetes de proteção e tênis especiais que enviei, sem me identificar, à igreja que patrocinava a equipe adversária. Na véspera de Natal, coloquei o envelope na árvore com um bilhete dentro, contando ao Mike o que tinha feito e que esse era o meu presente para ele. O mais belo sorriso iluminou o seu rosto naquele Natal.

Isso se deu em todos os anos consecutivos.

A cada Natal, eu seguia a tradição: uma vez comprei ingressos para um jogo de futebol para um grupo de jovens com problemas mentais, outra vez enviei um cheque para dois irmãos que tinham perdido a casa num incêndio na semana antes do Natal e assim por diante. O envelope passou a ser o ponto alto do nosso Natal. Era sempre o último presente a ser aberto na manhã de Natal. Nossos filhos, deixando de lado seus novos brinquedos, ficavam esperando ansiosamente o pai pegar o envelope da árvore e revelar o que havia dentro.

As crianças foram crescendo e os brinquedos foram sendo substituídos por presentes mais práticos, mas o envelope nunca perdeu seu encanto. Esse conto não acaba aqui. Perdemos nosso Mike ano passado por causa de um câncer. Quando chegou a época do Natal, eu ainda estava sofrendo tanto que mal consegui montar a árvore. Mas, na véspera de Natal, me vi colocando um envelope na árvore. Na manhã seguinte, havia mais três envelopes junto a ele. Cada um de nossos filhos, sem o outro saber, tinha colocado um envelope na árvore para o pai.

A tradição cresceu e, um dia, se expandirá ainda mais e nossos netos se reunirão em volta da árvore, ansiosos para saber o que há no envelope retirado da árvore por seus pais.

O espírito de Mike, assim como o espírito do Natal, estará sempre conosco. Vamos todos lembrar de Jesus, que é o motivo dessa comemoração e o verdadeiro espírito do Natal este ano e sempre. (Jack Canfield).

Em que momento começamos a perder o espírito do Natal e fomos “engolidos” pela ideia de super produtividade atual, a necessidade de estar “conforme” os ditames da cultura e sociedade materialista, não sei. Mas o fato é que perdemos o encanto, soterrados nas obrigações e crenças. Resgatar em nós a capacidade de esperar (lidar com a frustração da recompensa não ser imediata), entendendo que as melhores coisas pedem paciência para serem feitas, com esforço e dedicação. Criar memórias afetivas com tradições que façam sentido para a família. Remexer no baú de memorias e reencontrar o espírito natalino.

Lembranças antigas de natais passados, da infância, das tradições familiares, das expectativas que praticamente todos nós tínhamos dos presentes que estariam nos esperando. A orientação de que tínhamos que fazer algo para merecer o presente, como sermos bons, estudar e passar de ano, obedecer aos pais, respeitar os mais velhos… e em algumas famílias éramos lembrados disso o tempo todo.

Para algumas pessoas hoje o Natal perdeu o encanto e o significado ligado à época, com a história do nascimento de Jesus, tudo o que os pais – Maria e José – enfrentaram para que ele nascesse. E estão ocupados com o aspecto comercial da época, a troca de presentes, gastos excessivos, o excesso de comemorações – leia-se comida e bebida. E essa correria frenética que se tornou os dias que antecedem o Natal desperta desagrado e outras emoções ruins em algumas pessoas.

E para você, o que esse período desperta?

Nos encontramos na próxima segunda-feira, porque, sim, dia 25 é dia de artigo por aqui.

Até a próxima.

Fátima Sueli Baroni Tonezer é psicóloga, formada em Psicologia na Universidade Estadual de Maringá (UEM). Sua maior paixão é estudar a psique humana. Atende na DDL – Clínica e Treinamentos – (45) 9 9917-1755

@psicofatimabaroni

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