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Tarcísio Vanderlinde

Cenário de analogias redentoras

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Don Richardson (1935-2018) foi um daqueles escritores geniais que soube conciliar o trabalho missionário entre povos tribais com pesquisas antropológicas reconhecidas no meio acadêmico.

Seus escritos partem da tese de que entre as culturas tribais costuma haver práticas que ele nomeia de “analogias redentoras”. As analogias lembrariam narrativas bíblicas, principalmente aquelas presentes no livro de Gênesis.

Sua obra mais conhecida, “O fator Melquisedeque”, foi originalmente publicada em 1981 com o título “Eternity in their hearts” (Eternidade em seus corações), título que, sem muito esforço, nos remete ao texto bíblico de Eclesiastes.

A começar por explicar a origem da crença ao “deus desconhecido” entre os gregos, pretexto que seria utilizado no primeiro século pelo apóstolo Paulo para ali pregar as boas novas, o autor aborda surpreendentes concepções teológicas presentes em 25 grupos tribais em diversos continentes.

No intuito de “preservar costumes”, a antropologia nem sempre aprova o trabalho missionário entre grupos desconhecidos do mundo supostamente civilizado. Por outro lado, muitos missionários foram impactados ao serem confrontados com concepções morais, étnicas e religiosas de grupos “desconhecidos” que encontraram pela frente.

O título da obra de Richardson para as edições publicadas no Brasil também não se deve ao acaso. A referência a Melquisedeque, sacerdote de El Elyon, o Altíssimo, a quem Abraão prestara tributo, não era da linhagem sacerdotal que seria somente instituída mais tarde entre o povo hebreu.

Melquisedeque era cananeu, ou seja, alguém que, pela “regra”, não seria qualificado para o cargo que exercia. Esta é a perspectiva a partir da qual Richardson passa a observar os grupos étnicos que pesquisou em diferentes lugares.

Um destes grupos que recebeu atenção foram os incas. Os incas formaram uma civilização que é caracterizada por ter sido o maior império da América pré-colombiana. O domínio surgiu nas terras altas do Peru em algum momento do século XIII, entrando em decadência já na primeira metade do século XVI, com o avanço dos exploradores espanhóis.

Centrado na Cordilheira dos Andes, o império incluía áreas que hoje se distribuem entre os territórios do Equador, Peru, Bolívia, Argentina, Chile e Colômbia.

A administração política e militar do império ficava na cidade de Cusco, palavra quéchua que significa “umbigo do mundo”. Ao lado do espanhol, o idioma quéchua está presente nas falas e nas músicas em toda a região do antigo império.

Surpreendentemente se constata que palavras em quéchua acabaram sendo transliteradas e incorporadas ao português, tais como cancha, poncho, abacate, chácara e gaúcho, além de outras.

 

O autor é professor sênior da Unioeste

tarcisiovanderlinde@gmail.com

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