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Marechal Lei Maria da Penha

127 inquéritos por violência doméstica foram instaurados este ano na 47ª Delegacia de Polícia Civil

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Delegado Geraldo Evangelista de Souza Júnior: “É uma cultura de violência que precisa ser gradativamente mudada, através de orientações e campanhas de esclarecimento” (Foto: Universo da Notícia)

Um tapa, um empurrão, um xingamento, um constrangimento, uma humilhação ou uma ameaça… A violência contra a mulher acontece sob várias formas, desde a agressão física até uma relação sexual sem consentimento ou assédio emocional e psicológico. E, apesar de todas as medidas que vêm sendo tomadas nos últimos anos, a violência contra a mulher possui proporções epidêmicas, representando um importante problema de saúde pública global. E não é só: os custos sociais e econômicos dessa violência são enormes e têm efeito cascata em toda a sociedade.

Os números deixam claro esse cenário assustador. De acordo com um levantamento da Organização Mundial da Saúde (OMS), uma em cada três mulheres em todo o mundo já sofreu violência sexual ou física. Na maioria das vezes, a agressão é realizada por seu próprio parceiro (ou ex-parceiro). Ainda segundo a organização, quase dois quintos (38%) de todas as mulheres vítimas de homicídio foram assassinadas por seus namorados ou maridos.

Além disso, dados do Instituto Maria da Penha, com base em pesquisa encomendada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública realizada em 2017 em 130 municípios, indicam que a cada dois segundos uma mulher é vítima de violência física ou verbal no Brasil e a cada 1.4 segundo uma mulher é vítima de assédio. Já de acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2018, 221 mil e 238 casos de violência doméstica foram registrados no ano passado, o equivalente a 606 casos por dia.

Os números são alarmantes e comprovam que as situações de violência não isoladas, mas, sim, que afetam mulheres de todas as classes sociais, etnias e regiões brasileiras. Em Marechal Cândido Rondon, município com cerca de 51 mil habitantes, a realidade não é diferente.

Com base em um levantamento de ocorrências registradas pela 2ª Companhia do 19º Batalhão de Polícia Militar, no período de janeiro a outubro deste ano, 142 casos envolvendo lesão corporal, violência doméstica e tentativa de homicídio contra mulheres foram registrados na área de abrangência da companhia, que abarca 23 munícipios da região Oeste. Até novembro deste ano, 127 inquéritos por violência doméstica, no âmbito da Lei Maria Penha, foram instaurados na 47ª Delegacia de Polícia de Marechal Rondon. No ano passado, foram cerca de 200. No entanto, assim como muitos casos não são denunciados, outros são registrados apenas junto à Delegacia de Polícia Civil e não chegarão a conhecimento da Justiça, já que a maioria das mulheres agredidas, mesmo registrando o acontecimento na delegacia, retira a queixa dias depois. “As mulheres acabam retirando a queixa pelo fato de que acabam sendo ameaçadas pelo agressor, por dependência financeira ou até porque o agressor muda sua atitude e elas acreditam na mudança”, salienta o delegado Geraldo Evangelista de Souza Júnior, responsável pela Delegacia de Polícia Civil de Santa Helena e que responde de forma interina pela delegacia rondonense, na ausência do delegado titular, Diego Valim.

Segundo Evangelista, os números de inquéritos instaurados neste ano demonstram que houve um pequeno incremento no número de ocorrências registradas referentes à violência dominativa. “Por outro lado, devido a campanhas sociais e da mídia, as mulheres agredidas têm buscado cada vez mais amparo e proteção junto aos órgãos policiais para fazer valer seus direitos. A violência doméstica contra a mulher é uma forma específica de violação dos direitos humanos”, destaca.

O delegado informa que os casos de violência contra a mulher ainda são em sua maioria relacionados a questões passionais, “em que os indivíduos agem com impulsão, são extremamente controladores e acabam resultando em agressões, muitas vezes por motivos de ciúmes ou banais”. “A grande maioria desses delitos ocorre nos domicílios do casal, em situações típicas de discussões, que acabam resultando em agressões verbais e físicas”, salienta.

Para Evangelista, o fato de muitas mulheres sofrerem caladas por anos até terem coragem de denunciar as situações de violência se deve ao fato de o Brasil ainda possuir uma cultura machista muito forte, com base em um sistema patriarcal. “Por isso, algumas condutas acabam sendo legitimadas por esse sentimento de posse, poder e dominação do homem sobre a mulher. As mulheres devem sempre, em qualquer caso de violência, buscar auxílio imediato as autoridades”, aconselha.

 

Amparo

Denunciando as situações de agressões, as mulheres conseguem a defesa dos seus direitos através da Lei Maria da Penha, que neste ano completou 12 anos de criação. “A lei garante por parte também da autoridade policial diversos instrumentos de amparo, dentre eles as medidas protetivas de urgência quando deferidas pelo juiz, o acompanhamento da ofendida para retirada de pertences do local, a proibição de contato do agressor com a ofendida, o afastamento do lar, entre outras”, ressalta.

Evangelista explica que o delegado de polícia pode garantir proteção policial, quando necessário, comunicando o fato ao Ministério Público e Poder Judiciário, bem como encaminhar a vítima para exames, fornecer transporte à ela e dependentes, abrigo e informar sobre os direitos previstos na lei.

Ele comenta que o presidente Michel Temer recentemente vetou que o delegado de polícia pudesse deferir medidas protetivas de urgência, incumbindo dessa tarefa apenas o Poder Judiciário. “O delegado pode colher a manifestação da vítima que requer medidas protetivas de urgência e encaminhar ao Judiciário para análise. Além disso, pode, por si próprio, conceder as diligências previstas no item 7, sendo que as medidas previstas no item 6 somente por via judicial. Independentemente da gravidade do caso, mesmo que seja uma simples ameaça contra a mulher ou uma agressão propriamente dita”, detalha.

 

Pano de fundo e reincidência criminal

Apesar de todas as respostas criminais, os crimes dessa natureza ainda acontecem, e isso, para o delegado, se deve principalmente à cultura social de submissão das mulheres. “A violência contra as mulheres é mais presente do que se imagina, aqui e em qualquer lugar, pois não conhece barreiras sociais, econômicas e geográficas, acontecendo cotidianamente”, frisa. “É uma cultura de violência que precisa ser gradativamente mudada, através de orientações e campanhas de esclarecimento. Infelizmente, apesar da repressão a este delito, ele acaba acontecendo novamente, caracterizando a reincidência específica”, completa.

Sobre a questão da reincidência nos crimes de violência contra a mulher, Evangelista aponta que nos casos em que ocorre agressão, a ação penal é pública incondicionada, ou seja, a investigação terá seguimento na delegacia independentemente da vontade da vítima. “Contudo, mesmo assim, em alguns casos tem se verificado a reincidência, porque a mulher acredita que o agressor vai mudar o seu comportamento e não segue com o processo”, enfatiza.

 

 

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