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Marechal Evolução e desafios

Construção civil é o setor com maior número de acidentes de trabalho em Marechal Rondon

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Apesar da fiscalização ter evoluído ao longo dos anos e de empresas e empregadores estarem mais conscientes da necessidade de investir em treinamentos, cursos e assessoria voltados à segurança do trabalho, ainda há problemas que precisam ser corrigidos (Foto: O Presente)

 

Acidentes acontecem por toda parte, e no ambiente de trabalho não é diferente. De acordo com dados do Observatório de Segurança e Saúde no Trabalho do Ministério Público do Trabalho (MPT), o Brasil registra um acidente laboral a cada 49 segundos. Foram registrados nada menos que 4,7 milhões de acidentes de trabalho no país no período que vai de 2012 até o último dia 03 de maio. Ao todo, foram 17.244 acidentes fatais. A média, conforme os últimos números divulgados, é de seis mortes a cada 100 mil trabalhadores dentro do mercado de trabalho formal.

Esses números dão grande embasamento para debates e análises sobre as más condições de segurança e saúde no trabalho e a necessidade de maior fiscalização sobre as empresas.

Apesar de o cenário ter evoluído ao longo dos anos, quando o assunto é segurança no trabalho ainda há problemas que precisam ser corrigidos. “A parte principal não é somente treinar o trabalhador, é conscientizar o empregador que se ele investir em segurança do trabalho vai colher um resultado positivo, vai diminuir os custos, fazendo com que o trabalhador desenvolva sua atividade de forma segura, além de garantir que ele venha até a empresa com saúde e retorne para o seu lar da mesma forma”, destaca o técnico em segurança do trabalho Rafael Tiago Petry.

Entra ano, sai ano e o posto de setor com maior número de acidentes e mortes de trabalhadores no Brasil continua sendo a construção civil. Imprudência, não utilização de equipamento de proteção individual e falta de comprometimento da equipe estão entre as principais causas dos acidentes.

Segundo o Observatório de Segurança e Saúde no Trabalho, os acidentes que mais vitimam os trabalhadores estão relacionados às quedas com diferença de nível, impacto originário de material projetado e desabamento e desmoronamento. Já os principais agentes causadores foram plataformas, andaimes, telhados e estruturas.

No cenário local a realidade segue os mesmos contornos. Conforme Petry, que há dez anos trabalha com cursos e treinamentos na área de Segurança do Trabalho, além de prestar assessoria para empresas, especialmente construtoras, em Marechal Cândido Rondon o setor lidera as estatísticas de acidentes laborais, tendo em vista as características e riscos que envolvem o desempenho da atividade. “Já aconteceu de a prefeitura me ligar e dizer que não havia os bandejões ou cortinas de contenção em uma determinada obra. São muitas situações que às vezes são deixadas para fazer na próxima laje, no próximo passo da obra. Isso faz com que nós desenvolvamos ainda mais medidas de proteção e segurança, não só para o trabalhador, mas para demais pessoas que possam se envolver nessas áreas de risco”, expõe.

A grande dificuldade do setor de construção civil, de acordo com Petry, se deve à rotatividade do trabalhador. “O trabalhador que está em uma obra hoje, amanhã pode estar em outra. Então se tem um rodízio muito grande. O empregador treina o trabalhador e ele vai para outra obra”, comenta.

Os números de acidentes na construção civil poderiam ser maiores se as estatísticas considerassem os trabalhos informais, já que muitos deles são registrados como acidentes casuais e não laborais.

 

RISCOS

Trabalhar no setor da construção civil oferece muitos riscos. A afirmação vale tanto para as construtoras quanto para os colaboradores.

Há riscos dos mais variados envolvidos em todos os processos. A execução da obra, por exemplo, apresenta risco de acidentes aos funcionários. Dentro do escritório, os riscos são financeiros, como na contratação de prestação de serviços. “A gente cita muito a questão do trabalho em altura, que traz consigo o risco de morte. Eles (trabalhadores) sempre estão expostos a esse tipo de risco. Mas temos outro grande problema que é a parte elétrica. Principalmente em início de obras há muitos serviços provisórios e isso acaba gerando condições inseguras para os trabalhadores. Por isso a necessidade de treinamento e orientação para que eles mesmos desenvolvam um ato seguro”, enaltece Petry.

Os números alarmantes em se tratando de acidentes de trabalho no Brasil são frutos em grande parte da pouca fiscalização que havia em anos anteriores. Atualmente há uma fiscalização mais rigorosa, tendo em vista que esses acidentes representam custos ao Estado, desde o atendimento até o restabelecimento de um trabalhador ao mercado de trabalho. “Os próprios sindicatos da construção civil estão fazendo essas cobranças. Eles visitam as obras, fazem as exigências e temos que providenciar. Por isso eu acredito que hoje uma obra, independente do tipo, vem buscando adequação, principalmente focada na segurança do trabalhador e da edificação”, ressalta o profissional.

TRABALHO AUTÔNOMO

Outra faceta dessa realidade é a dos trabalhadores autônomos. Em sua grande maioria trabalham sem registro no Ministério do Trabalho ou filiação com a Previdência Social. A situação coloca em xeque os direitos do trabalhador em caso de acidente. “Se vir acontecer qualquer problema dentro de uma empresa com esse prestador de serviço a responsabilidade é do empregador, porque a partir do momento que estão sendo executadas atividades contratadas pela empresa a responsabilidade passa a ser dela”, explica o técnico em segurança do trabalho.

Por outro lado, os trabalhadores autônomos também estão em busca de capacitação, realizando cursos e treinamentos de forma individual. “Eles estão conscientizados e até mesmo os próprios clientes estão exigindo isso. Se hoje ele (autônomo) não estiver definitivamente certificado estará fora do mercado de trabalho, que está mais exigente em busca de um serviço qualificado”, enaltece Petry.

 

Técnico em segurança do trabalho Rafael Tiago Petry: “Em longo prazo se consegue ver uma grande melhoria, não somente na parte preventiva da saúde do trabalhador, mas também na parte financeira, porque hoje sabemos que um acidente de trabalho representa altos custos” (Foto: O Presente)

 

A CULTURA DA SEGURANÇA

Capacete, óculos de segurança, abafadores de ruído, cinto de segurança, luvas, máscara filtradora, calça comprida e sapatos fechados são alguns itens imprescindíveis de segurança, também chamados de Equipamentos de Proteção Individual (EPI). “Os EPIs são fundamentais para proteger a saúde e a integridade física dos colaboradores, evitando consequências negativas em casos de acidentes de trabalho e garantindo que o profissional não seja exposto a doenças ocupacionais, que podem comprometer a capacidade de trabalho e de vida dos colaboradores durante e depois da fase ativa de serviço”, descreve Petry.

De acordo ele, os anos recentes trouxeram maior conscientização às empresas e aos empregadores, que perceberam a necessidade de investir na área de treinamento, cursos e assessoria voltados à segurança do trabalho. “Em longo prazo se consegue ver uma grande melhoria, não somente na parte preventiva da saúde do trabalhador, mas também na parte financeira, porque hoje sabemos que um acidente de trabalho representa altos custos, sem contar a ausência do trabalhador por afastamento ou suas próprias perdas, que fica limitado, às vezes tendo perda permanente e não podendo mais exercer sua atividade, além de todos os problemas sociais que geram um acidente”, evidencia.

O que antes era visto como um custo, hoje é tido como um investimento. “Se percebe muito que um empregador, quando vai contratar, quer um profissional com o curso ou treinamento específico para a atividade que ele irá desenvolver. Se o trabalhador não tem, nós somos procurados para oferecer e fornecer condições para ele trabalhar legalmente habilitado”, menciona.

A preocupação de empresários em ter profissionais habilitados e conscientizados não se debruça apenas à parte legal. O conhecimento diferenciado e a atividade desenvolvida com maior eficiência são fatores preconizados no momento da contratação. “O trabalhador treinado na parte de segurança do trabalho, independente da atividade que ele irá desenvolver, é diferenciado e tem um valor agregado maior, tanto financeiramente quando na execução da atividade”, salienta.

Petry explica que acidentes de trabalho “custam caro” para o dono de uma obra. Um exemplo são os trabalhos realizados em altura. “Se hoje vir a acontecer um acidente com um trabalhador acima de dois metros de altura e ele não estiver devidamente habilitado, isto é, com os cursos que a norma regulamentadora obriga a ter, o empresário sofre punições. Então, além da conscientização, existem obrigações que as empresas devem ter”, informa.

Diante das cobranças, o técnico lembra ser muito mais vantajoso para o empregador ter um profissional habilitado do que correr o risco e ter um trabalhador que não seja um profissional da área e que poderá gerar maiores riscos, seja em acidentes de trabalho com risco de morte ou por questões de punições, com multas. “Hoje, por exemplo, eu acho muito difícil, pelo meu conhecimento e contato com os empregadores, ter uma empresa com um eletricista que não tenha o curso NR-10 que trata sobre eletricidade”, exemplifica.

 

IMPACTO DA INFORMALIDADE

Muito além de ser uma exigência legal do Ministério do Trabalho, a empresa que dá a devida importância à segurança do trabalho demonstra a sua preocupação e comprometimento com a qualidade de vida no trabalho de seus colaboradores, assegurando a motivação e fidelização de seu público interno.

Dentro de um canteiro de obras essa preocupação com a segurança do trabalhador se intensifica, visto que, se mal estruturado, é um espaço propício para prováveis acidentes. Além disso, todos aqueles que estiverem dentro do canteiro de obras passam a ser de responsabilidade da construtora. “Um projeto de canteiro de obra organizado é a primeira coisa que deve ser feita. Se ele está organizado o funcionário não corre o risco de tropeçar em madeiras, pisar em pregos, ser atingido por algum objeto, entre outras situações. Hoje o EPI é o elementar, mas tem todo o entorno do funcionário que também é preciso cuidar”, declara o engenheiro civil Carlos Roberto Wild.

Segundo ele, a informalidade é o maior problema em se tratando de acidentes de trabalho. “Se tem por costume colocar a culpa nos EPIs, mas eles, na verdade, não evitam acidentes, o que evita é o treinamento constante das equipes. Por isso a importância de se ter um engenheiro de segurança que faça o treinamento no mínimo duas vezes por ano”, afirma.

Wild destaca o fato de muitas vezes o trabalhador ter o EPI, mas não ter os equipamentos de segurança comuns, como escadas e andaimes, equipamentos de segurança que são da obra. “O uso do EPI não é mais a cargo do funcionário, é obrigação do empresário. Além disso, não se pode somente disponibilizar, é preciso treinar para poder usar, e se o trabalhador não usar é preciso tomar providências, inclusive com demissões, mas não pode deixar no canteiro de obras sem EPI”, assegura.

Na visão do engenheiro, acidentes de trabalhos poderiam ser evitados se as empresas investissem mais em treinamentos. “Às vezes ouvimos que o funcionário estava distraído quando sofreu o acidente, mas o funcionário bem treinado, que conhece o equipamento de segurança, dificilmente se machuca, ou quando ocorre se machuca menos”, frisa, emendando: “É muito genérico e vulgar dizer, por exemplo, que um acidente de trabalho aconteceu porque o trabalhador caiu do andaime. Talvez ele até tinha os equipamentos de segurança, mas não sabia o que fazer com eles”.

Wild diz que cerca de 80% das obras realizadas em Marechal Rondon são feitas por empreiteiras e não por funcionários de construtoras. “Mesmo que os funcionários estejam registrados, o que é o mínimo, estão registrados somente para aquela obra, então eles não têm presente um técnico de segurança na obra, por exemplo”, cita.

O engenheiro enaltece que todas as construtoras rondonenses possuem empresas contratadas que ofertam assistência ao trabalho de segurança, que realizam exames periódicos e detectam algum problema oculto. “Às vezes acontece de um trabalhador cair na obra, mas talvez ele já estivesse com um problema oculto de saúde há mais tempo”, pontua.

O profissional defende que todas as construtoras do município realizem treinamentos semestrais de segurança em altura e principalmente para o uso dos equipamentos de segurança. “Hoje nem se pode pensar em gasto em EPI porque um funcionário parado para a empresa é muito mais caro. Além de que um acidente de trabalho grave é investigado pelo Ministério Público do Trabalho e se a empresa for causadora terá de ressarcir, mesmo se o trabalhador for ‘encostado’ e fizer cirurgia pelo INSS. Caso seja comprovado que a empresa não deu o atendimento nem os equipamentos de segurança, ela terá que repor ao governo esses valores”, explica Wild.

 

SEGURANÇA EM MÁQUINAS

Além da construção civil, o setor industrial é outro que também precisa se preocupar com essas exigências. Isso acontece porque existem equipamentos pesados e complexos atuando em uma planta de produção. Nessas horas, a falta de atenção coloca em risco a vida dos funcionários e atrapalha o desempenho do negócio. Dessa forma, a NR12 – Segurança no Trabalho em Máquinas e Equipamentos – foi criada para definir parâmetros que promovem a segurança em máquinas.

“Não adianta o funcionário estar usando luvas, capacete e óculos se a máquina não tiver proteção para serra, por exemplo. Essa é uma norma que está sendo cobrada agora e muitas empresas de Rondon estão contratando profissionais para adaptar as máquinas. Elas podem ser muito mais perigosas que a falta do EPI”, alerta.

O engenheiro lembra o grande número de máquinas usadas na construção civil e a grande parte dos acidentes causados pela serra circular. “Hoje essa máquina vem com equipamentos de segurança, então o setor precisa se adaptar. Há custos, mas é uma necessidade ter equipamentos adequados”, finaliza.

 

Engenheiro civil Carlos Roberto Wild: “Hoje o EPI é o elementar, mas tem todo o entorno do funcionário que também é preciso cuidar” (Foto: O Presente)

 

NORMAS

Existem várias normas reguladoras da construção civil com o objetivo da preservação da saúde e segurança do trabalhador e que definem parâmetros nas práticas adotadas pelo setor. As principais são:

NR 4: trata do SESMT (Serviços Especializados em Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho).

NR 5: discorre sobre a CIPA (Comissão Interna de Prevenção de Acidentes).

NR 6: dispõe sobre os EPIs (Equipamentos de Proteção Individual).

NR 7: estabelece a obrigatoriedade da elaboração e implementação do PCMSO (Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional).

NR 9: estabelece a obrigatoriedade da elaboração e implementação do PPRA (Programa de Prevenção de Riscos Ambientais).

NR 10: dispões sobre as instalações e serviços em eletricidade na construção civil.

NR 12: sobre a utilização de máquinas e equipamentos de qualquer tipo.

NR 18: uma das mais importantes no setor, aborda, entre outras coisas, questões específicas de uma obra, como escavações, demolições, alojamentos de trabalhadores e proteção contra incêndios.

NR 35: estabelece requisitos mínimos de segurança para os trabalhos em altura.

 

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