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Conheça a história de Iuri Borm, o biólogo autista que escancarou a porta

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(Foto: Milena Rossi/Arquivo Pessoal)

É lei: Pessoas com Transtorno do Espectro Autista têm direitos ao diagnóstico precoce, tratamento, terapias e medicamento pelo Sistema único de Saúde, além de acesso à educação, proteção social e ao trabalho.

Mas, o que vai além da lei? Que tal: oportunidade! Aquela que alguém resolve sair do óbvio, do chamado Bê-á-bá. Sim, o autista tem direito à educação de qualidade, é isso que diz a lei, mas como fazer a mais? Abrir as portas para um novo caminho de quem ainda está em processo de entendimento pessoal e familiar. Esse primeiro passo, na maioria das vezes para um autista precisa de um braço de apoio (por questões de falta de informação da sociedade), de alguém dito como “normal”, o que, aliás, precisa mudar já que está comprovado que 1 em cada 58 crianças no mundo nasce dentro do espectro autista, ou seja, é hora de abrir mais portas sem deixar a “tranca” do receio.

Enquanto esse mundo de dúvidas não se torna um assunto retrógrado, existem nichos preparados para abrir essa porta da oportunidade e escancará-la. O Programa de Educação Especial (PEE) da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste) é prova disso. Desde que foi implantado na Unioeste, que começa com o atendimento no vestibular, contribui para o ingresso e permanência do acadêmico, realização de diversas atividades, adaptações, materiais, atendimento em sala de aula, intérpretes e apoio, isso tudo nos cinco campi da Universidade (Cascavel, Foz do Iguaçu, Francisco Beltrão, Marechal Cândido Rondon e Toledo). Um programa essencial para incluir e oportunizar direitos iguais a todos para educação gratuita de qualidade, mas esse apoio oferecido também foi além, quando a professora Letícia Nunes Goulart, especialista em Educação Especial, e o acadêmico do curso de Biologia, campus Cascavel, Iuri Shevchuk Borm se encontraram.

Iuri e Letícia se conheceram dentro da Unioeste em 2018, porém, ainda era um momento daqueles que autistas com diagnóstico tardio enfrentam na maioria das vezes: o de aceitação. Só em 2019 foi consolidado atendimento semanal especializado para condições com cronograma de estudos “Criamos uma estrutura de ensino focada em 50% a mais em provas e trabalhos, sempre nos reunindo com a mãe dele Dona Valéria para explicar esse processo de estudos”, relembra a professora Letícia.

Aliás, Dona Valéria Shevchuk ao longo dos anos enfrentou o que muitas mães passam, a falta de respostas. “Passamos por diversos profissionais de saúde para tentar entender o que fazia de Iuri diferente das outras crianças, mas nunca era algo concreto”.

Os meses passaram e foi aí que um novo capítulo começou, algo que não compete especificamente ao PEE, mas que o cenário pós-pandemia mais severa apresentou: a falta de locais para Iuri fazer estágio. “Fui à procura da professora Letícia Goulart para me ajudar na procura de um estágio. Foram dias de procura até que ela conseguiu encontrar um Laboratório de Análises de Alimento e Água que logo entrou em contato com o RH e depois comigo. Fui até o local e conversei com o responsável que avisou do meu interesse à técnica dos laboratórios onde eu iria fazer futuramente meu estágio. Depois o responsável entrou novamente em contato comigo, informando que eu poderia fazer meu estágio na empresa”, assim explica Iuri, mas o processo foi longo e inédito.

 

A saga pelo estágio de Iuri

“Tudo estava lotado de estagiários porque os universitários estavam com os estágios atrasados. Eu me sentei com Iuri e começamos a ligar a todos os possíveis estágios em biológicas da região oeste do Paraná. Estava o caos, era lotação máxima: prefeitura, zoológico, até para o Parque das Aves em Foz do Iguaçu nós ligamos. Foi aí, que procurei a professora Ana Paula que também faz parte do programa, formada em Biológicas e ela me passou uma nova lista de possibilidades, depois de várias tentativas. A Lanali (Laboratório de Análises de Alimentos) nos cedeu uma oportunidade”, conta a Professora Letícia.

Mas, o processo não terminava aí. Era preciso ainda integrar Iuri e contextualizar sua condição ao local de estágio. Foi então que em contato com o Recursos Humanos da empresa foi decidido pela realização de uma palestra no local sobre como conviver com um autista “Minha intenção era desmistificar, tirar dúvidas do dia a dia”. Depois disso, Iuri foi chamado para entrevista e o que a professora Letícia deu de recomendação? “Capricha, que você será contratado”. E Iuri caprichou.

O primeiro estágio de Iuri que terminaria em alguns meses também foi além. “Terminei meu primeiro estágio e comecei a me familiarizar com a empresa e a gostar do lugar, eu me dei bem com todos que trabalham por lá, então decidi conversar novamente com a responsável dos laboratórios se poderia fazer meu segundo estágio da empresa e a resposta foi sim. E assim pude concluir meus estágios e adquirir mais experiência no local”, conta.

Lembra da história que é preciso escancarar uma porta, pois é, foi isso que aconteceu com Iuri. O jovem concluiu a graduação em Ciências Biológicas bacharelado e os estágios no Laboratório acabaram em grande estilo, e ele foi contratado “A sensação foi de muita felicidade. Agora começa a abrir novos aprendizados para que eu possa crescer na vida profissional. E como é meu primeiro emprego, vou crescer muito nesta empresa, pois é exatamente o ambiente que eu gosto de estar”, conclui o biólogo.

 

Além do profissional

Durante a conversa com Iuri tomei a liberdade de questionar o que é ser autista, isso porque existem vários livros, estudos que tentam mostrar características, percepções e dados a respeito. E ele foi categórico: “Ser autista é viver em um mundo diferente e em outra realidade. A minha visão e compreensão de mundo é diferente das pessoas que não possuem o transtorno do Espectro Autista (TEA). Não é fácil aceitar ser um autista, pois ainda há muitas pessoas que não compreendem e não respeitam. Mas, graças à tecnologia e novas informações isso vem mudando a cada dia que passa. A autoaceitação e autoconfiança vem com o tempo, compreensão e terapia. Até hoje eu não consigo entender bem o que é realmente ser um autista. Para mim é meio confuso, principalmente lidar e entender as pessoas, mas como eu já tomo medicamentos e fiz algumas sessões de terapia eu já aprendi bastante coisa a respeito do transtorno e sobre mim mesmo, e já consigo me aceitar melhor como eu sou. Mas, eu sei que ainda tenho um longo caminho pela frente, que posso e vou conseguir ir mais longe e atingir os meus objetivos”.

Bom, acredito que Iuri foi além, e entendeu que não precisa sequer de portas.

 

Com assessoria
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