Paraná Os frangos de Alá
Viés ideológico nas relações internacionais pode fechar principal mercado da avicultura oestina
Não há nenhuma dúvida que os presidentes das grandes cooperativas do Oeste digitaram os números 1 e 7 no primeiro e no segundo turno da eleição presidencial. Mais que isso: empenharam-se – em maior ou menor grau de engajamento – em obter os votos dos associados para Jair Bolsonaro.
O que talvez eles não esperassem é levar sustos tão cedo com a ideologização que cerca o agrupamento político vencedor. Ao colocar o bedelho no ódio secular entre judeus e palestinos, o futuro governo pode trazer imensos prejuízos para a avicultura, um dos alicerces da economia regional.
Ao sinalizar a mudança da embaixada brasileira em Israel, tomando lado na briga e quebrando uma tradição de neutralidade, Bolsonaro pode fechar o valioso mercado do Oriente Médio para os franguinhos abatidos aos milhões no Oeste paranaense.
O governo do Egito, por exemplo, inimigo declarado dos judeus, suspendeu a visita do ministro das Relações Exteriores brasileiro ao país das múmias. O gesto foi entendido como um recado do mundo árabe muçulmano à postura brasileira.
Aqui na região, o tema é tratado com muitos dedos. O Pitoco ouviu o presidente da Copacol, Valter Pitol. A cooperativa que ele lidera investiu pesado no Oriente Médio. Acaba de instalar em Dubai um escritório próprio da Copacol.
“Acredito que com diálogo vamos chegar a um denominador razoável”, limitou-se a dizer Pitol, acreditando que com o balanço da carroça ajeita-se a carga de frangos.
E não são poucos. A Copacol exporta três milhões de toneladas/mês para o mundo islâmico. Isso representa entre oito e dez milhões de dólares mensais.
Francisco Turra, presidente da Associação Brasileira de Produtores de Aves, parece mais alarmado. “O Oriente Médio é nosso principal destino de exportação. Faz 30 anos que conquistamos e fidelizamos este mercado, que representa 40% das exportações brasileiras de frango”, argumenta.
Nos primeiros dez meses deste ano, o Brasil vendeu dois bilhões de dólares em frango para os árabes.
Sensibilidade
A apreensão dos avicultores chegou à futura ministra da Agricultura, Tereza Cristina. Ela disse que o governo Bolsonaro “ainda está em gestação e é aberto ao diálogo”. Porém, ela enfatiza que o mercado é arisco.
“Acho que a gente tem que ter muito cuidado com o que vai falar porque o mercado é muito sensível. Qualquer fala fora do tom pode prejudicar uma abertura de mercado ali ou um mercado que se fecha lá”, disse.
Frango halal
Frango halal. É assim denominado o processo de abate que segue os princípios islâmicos. É uma imposição religiosa que vem lá do aviário do produtor integrado até o abate.
No frigorífico da BRF, em Pato Branco, há 15 “sangradores” islâmicos. Eles coordenam o abate de forma a atender as exigências de Alá.
No momento da sangria, o peito do frango precisa estar voltado para a Meca, na Arábia Saudita. Para atender as exigências, a BRF teve que construir uma nova calha de sangria.
A planta abate 130 mil aves por dia e metade da produção é destinada ao mundo árabe. Recentemente, uma comitiva japonesa veio conhecer o sistema. A ideia é importar o frango halal para as Olimpíadas de Tóquio, de forma a atender as exigências dos países islâmicos que irão participar da competição.
O Brasil é o maior exportador de frango halal do planeta.
Em tempo: na visita de Bolsonaro ao Show Rural, o Pitoco fez mais uma de suas perguntas inconvenientes. Era sobre o viés ideológico do candidato com a China, grande parceira comercial da região Oeste. O que não se imaginava na ocasião era a encrenca prematura com os homens de turbante.
O Pitoco