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Fagulhas de esperança

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Mirely Weirich/OP

A fraqueza do mercado interno, que enfrenta a pior recessão da história brasileira com uma taxa de desemprego que ainda pode superar os 13% no começo do ano que vem, somado a fraqueza das exportações brasileiras, que dependem de negociações do governo para abrir mercados, são os dois motivos fundamentais para que a indústria nacional só volte a crescer daqui a um ano e meio.

Ao menos é o que prevê o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Robson Braga de Andrade, ressaltando que em 2016 nós paramos de perder, em 2017 vamos começar a plantar, mas o crescimento mesmo da indústria, só em 2018.

Ou seja, apesar de o fôlego do setor industrial poder ser recuperado ainda no próximo ano, a colheita dos bons resultados, como aqueles vistos há cerca de dois anos, só deve acontecer mesmo em 2018. Até mesmo para as regiões blindadas pelo agronegócio, como é o caso do Oeste do Paraná. Na análise industrial ampla, o agronegócio e a agroindústria vão bem, salvo quando temos uma quebra na cadeia, como foi a falta de insumos para uma empresa específica da avicultura, mas o setor de metalmecânica vai muito mal. Contudo, como é um percentual muito pequeno de toda a cadeia, a economia global não sente isso, então a sociedade, no âmbito geral da região, sentiu pouco o impacto da crise, afirma o vice-presidente da Federação das Indústrias do Estado do Paraná (Fiep), Edson José de Vasconcelos, em entrevista ao O Presente.

Na avaliação dele, pela facilidade de endividamento da população nos últimos 14 anos, sem nenhum tipo de educação à poupança, o sistema financeiro brasileiro deixou de ter excesso de consumo para ter um excesso de assédio ao sistema financeiro. Ontem (quarta-feira, 19), a taxa Selic baixou para 14%. Esse já é um sintoma de que precisamos entender que a retomada da economia depende muito mais do sistema financeiro do que do sistema político, afirma. O sistema político interfere diretamente na máquina pública, mas na nossa região, qual o percentual da interferência direta da máquina pública? O nosso problema maior hoje, para saber quando será a retomada de crescimento da indústria, está muito mais ligado à política monetária do que a confiança, complementa.

Retomar a economia no pico em que se encontrava em 2011 não pode, para o vice-presidente da Fiep, ser considerado saudável para o país. Na visão de Vasconcelos, há necessidade de se estruturar a base com geração de poupança, aumento da capacidade de endividamento da população e redução das taxas de juros, para, a partir daí, retomar o crescimento com mais consistência. Caso essa retomada não ocorra com uma redução da taxa de juros, uma educação à poupança por parte da população, um fortalecimento da base, a sazonalidade da crise será muito maior, enfatiza.

Para o dirigente da entidade, não é prudente avaliar se os piores momentos da crise econômica já deram adeus às indústrias brasileiras, já que os problemas podem se agravar dependendo de cada setor. O de metalmecânica ainda pode sofrer, mas a agroindústria talvez não. O mercado da construção depende muito do financiamento. Já passou o pior? Não sei. Se não baixar a taxa Selic continuamos no pior, mas acho que não pode piorar. No setor de metalmecânica, se não houver aumento do consumo, não tem o que fazer. Já nas commodities é muito flutuante, pois vai de acordo com o dólar. Se tivermos uma frustração na safra teremos um processo agravado, menciona Vasconcelos. A tendência é que os lastros, as macro mexidas para a economia ficar mais fundamentada estão sendo feitas, conclui.

 

O pior da crise já passou?

André Rohloff, da Metalúrgica AJJ:

Acredito realmente que a o crescimento do setor industrial vai voltar somente no fim de 2017, começo de 2018, porque a restrição de crédito foi muito grande. Hoje existe até o crédito, mas é um valor muito alto, se tornando inviável para os investimentos. Nós, por exemplo, trabalhamos em um mercado muito voltado ao leite, então vemos que a crise ainda está oscilando, ainda existe. Esse mês teve uma redução do valor pago ao produtor, que estava recebendo R$ 1,80 no litro de leite e caiu para R$ 1,1, o que é bastante significativo. As consequências, neste caso, se refletem na hora, pois como este é para nós um mercado muito forte, os investimentos são cortados imediatamente. Acredito que se o setor ainda sentir algo da crise vai ser menor. O pior já passou. As empresas obrigaram-se a se reinventarem em meio à crise, assim como todos os setores. Temos perspectivas de sinal de crescimento, vemos que o Brasil está dando sinais de crescimento, mas eles estão lentos por enquanto. O primeiro semestre de 2017 acredito que ainda será de incertezas, mas no segundo já poderemos ter uma estabilização e a curva do gráfico começará a ficar positiva.

 

Adair Schumacher, da Indústria Schumacher e vice-presidente para Assuntos da Indústria da Acimacar,

Temos algumas variáveis que estão muito longe do nosso controle. A primeira é em cima do que o governo fala. A nossa confiança perante a um posicionamento do governo era zero e, com esse novo modelo de gestão, eles estão tentando mostrar que o que estão falando vai acontecer, tanto é que estão prometendo menos para gerar novamente um ambiente de confiança. Tem se dito lá fora que o Brasil é um país sólido, que vai dar segurança jurídica para os investidores, mas em nenhum momento disse que ano que vem haverá um crescimento de 2%, investimentos, abertura de linhas de crédito. Novamente estamos na escuridão, antes na desconfiança, hoje no pouco que se é dito. Temos também o agravante do dólar que subiu, mas agora começou a baixar e, se ele baixar a um nível em que a importação volte a ser viável teremos um problema, pois no meio automotivo o que está salvando são as importações pela desvalorização do real. Dizer que para o ano que vem realmente já começaremos a subir, dizem que sim, mas eu não consigo confirmar isso. Eu já esperava que o segundo semestre de 2016 fosse melhor que o primeiro, mas isso não está acontecendo na indústria como um todo. Os juros baixaram 0,25% na taxa Selic, o que é um bom resultado, mas o que isso indica? Dá a entender que vai continuar baixando, mas qual vai ser a próxima? Mais 0,25%, 1%, 2%? Novamente não estamos enxergando. Quando se diz que a economia vai crescer a partir de 2018, eu acho que vai começar ano que vem, mas estamos acumulando recessão. Em dados oficiais chegamos a 7%. Se começarmos a crescermos agora será muito bom, mas precisamos crescer 7% para chegarmos no que estávamos antes. Se o país crescer 1% ao ano, durante quatro anos, isso é muito lento, levaremos sete anos para chegar ao que estávamos produzindo antes, com os custos aumentando. Para dizer que o país vai ter crescimento real para repor as perdas acumuladas será de 2018 para frente.

 

Marlise Ricardi, da Candon:

O que estamos percebendo agora, especialmente em nossa região e mais precisamente no setor de alimentos, é que até a metade do ano não havíamos sentido uma baixa na produção e também nas vendas. Porém, no segundo semestre teve uma queda de consumo, até mesmo por conta do desemprego que cresceu na região e também pela questão da diminuição do poder aquisitivo do consumidor, e isso reflete no setor alimentício. A não ser que tenhamos uma boa perspectiva de crescimento na produção e que o agronegócio continue com preços bons, aliado com uma boa política de mercado externo para que os nossos produtos tenham uma boa aceitação no mercado, vemos, sim, uma retomada de crescimento para 2017. Hoje vemos o setor produtivo voltando a ter confiança no governo devido algumas medidas que estão sendo adotadas. Pela iniciativa privada ter sempre sido a grande alavanca da economia do nosso país, tendo um cenário animador e de maior confiança, é muito rápida a retomada de crescimento do país. Então imagino que em 2017 tenhamos um poder de crescimento novamente. Para dizer que vamos voltar aos níveis de 2014 e 2015, só sentiremos a partir de 2018 se em 2017 voltarmos a crescer. E se falando em questão de um ano é um tempo bastante curto para se voltar a ter estabilidade. Em termos gerais, o pior da crise do setor industrial ainda não passou, vejo que ela está presente em todos os segmentos. Estamos tendo muitos reflexos, como a questão do desemprego. Até que a indústria consiga voltar a produzir e que tenhamos outros setores que também alavanquem a economia ainda sentiremos os piores efeitos da crise.

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