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Whole30: a dieta do momento

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Trinta dias. Esse é o tempo que você precisa para estabelecer uma relação mais saudável com a comida. A promessa é de um dos programas alimentares mais badalados no momento nos Estados Unidos e agora também no Brasil: o Whole30. Mas, até chegar aí, todos os alimentos industrializados e alguns outros naturais devem ficar fora do cardápio. Significa esquecer por um mês açúcar, queijo e iogurte e até mesmo os grãos, sem direito a escapadas no fim de semana.

“Este é o programa de nutrição desenhado para mudar sua vida em 30 dias”. Além dessas frases, outras em tons radicais aparecem no site oficial em português com todos os passos da dieta: “É proibido se pesar durante os 30 dias e deve-se ‘limpar’ a dispensa dos alimentos proibidos”.

Mas, enfim, qual o objetivo do Whole30? Segundo a página oficial, a dieta promete reeducação alimentar, perda de peso e mudanças significativas no corpo e nos hábitos de vida. A rondonense Luana Thaís Karling, de 22 anos, adepta do programa, perdeu cerca de seis quilos e garante que as mudanças não foram só essas. “Além da perda de peso, você passa a ter um estilo de vida diferente. Hoje, depois que eu fiz o Whole30, não consigo mais consumir a mesma quantidade de comida. É como se fosse uma reeducação alimentar”, destaca.

Estudante de Direito, Luana diz que conheceu o programa através de dois amigos que praticam crossfit. “Como eles já haviam feito, notei que realmente tiveram resultados e as diferenças eram expressivas. Assim, mesmo não praticando crossfit, acabei me interessando e resolvi fazer a dieta”, conta.

A jovem relata que combinou a dieta com a prática de exercícios físicos, como corridas e caminhadas, mas não de forma diária. “Às vezes fazia uma caminhada ou uma corrida, mas não eram todos os dias. Quando você faz a dieta aliada à prática de exercícios físicos mais intensos, os resultados são mais rápidos e efetivos”, pontua.

Quando as dúvidas surgiam, Luana recorria aos amigos, também adeptos do programa, para colher sugestões e dicas do que podia ou não comer. “Eles (amigos) me explicaram como funcionava o Whole30, me apresentaram o livro sobre o programa (30 dias para mudar – Whole30), me passaram o que podia e o que não podia comer. Além disso, também fui pesquisando um pouco mais sobre o assunto”, destaca.

 

“Comida de verdade”

“Corte o açúcar, elimine grãos e farinhas, não consuma nada processado e retire os laticínios. Queremos apenas comida de verdade, aquelas que você encontra na natureza”. O Whole30 indica em seu site uma vasta lista de alimentos proibidos e recomendados ao longo do programa. A retirada de todos estes alimentos e bebidas traz como promessa “um novo metabolismo, reduzindo a inflamação sistêmica e ajudando o(a) adepto(a) a perceber como estes alimentos estavam afetando a sua vida”. 

E Luana seguiu isso à risca. Deixou de lado refrigerantes, bebidas alcóolicas, alimentos processados e industrializados, carboidratos, massas, dentre muitos outros e aderiu a uma alimentação à base de produtos naturais. “Eu podia comer todos os tipos de frutas, carnes e saladas. No lugar de refrigerantes, por exemplo, bebia sucos naturais e muita água. O pão eu substituía por crepioca ou omelete”, relata, acrescentando: “Diminuía a quantidade de alimentos que eu consumia ao longo do dia e comia em intervalos de tempo menores. No entanto, os alimentos eram mais saudáveis”.

 

O segredo é a substituição

A rondonense afirma que o processo é gradativo e que os alimentos vão sendo tirados aos poucos da alimentação. “Cada dia vai retirando um alimento e inserindo outro no lugar. Se você fizer substituições, não sente falta daquele alimento”, garante.

A ingestão de doces, por exemplo, ela substituía por frutas mais adocicadas. “Isso faz com que você não sinta falta dos alimentos e ainda se alimente de uma forma saudável”, reitera.

Agora, após finalizar os 30 dias do programa, Luana comenta que está começando a reinserir alguns alimentos no cardápio, mas não em grandes quantidades como consumia antes de fazer a dieta. Alguns foram extintos da sua alimentação. “Refrigerantes e arroz, por exemplo, eu não consumo mais”, menciona.

 

Mais benefícios

Luana revela que já havia tentando outros métodos para emagrecer, como a dieta da sopa, feita por sete dias. Entretanto, ela afirma que não obteve os resultados desejados, pois estes eram apenas temporários.

Já com o Whole30, ela destaca que os resultados não vieram apenas em forma de alguns quilos a menos, mas principalmente em mais disposição, além de benefícios à saúde. Com colesterol hereditário, a jovem revela que a dieta ajudou a reduzir o quadro. “Principalmente porque cortei diversos tipos de gordura que influenciavam. Inclusive, a dieta foi um método que também busquei antes de ficar dependente de remédios para o colesterol”, expõe, emendando: “Claro que ainda tenho colesterol, mas ele não está tão elevado quanto antes”.

 

Desafios

Força de vontade e determinação são os pré-requisitos básicos para encarar o Whole30 e levá-lo adiante. Abrir mão dos alimentos que mais ingere na alimentação não é tarefa fácil, prova disso é que muitas pessoas iniciam a dieta, mas desistem na primeira ou segunda semana.

No caso de Luana, o maior empecilho ao longo da dieta foi a restrição aos doces. “Além disso, estar com os amigos e não poder sequer tomar uma cervejinha em um domingo à tarde não é algo fácil”, brinca.                      

Contudo, a estudante seguiu firme e, apesar de alguns amigos a incentivarem a desistir, conta que recebeu muito apoio dos pais e do namorado para conseguir concluir a dieta e obter bons resultados.            

 

Sucesso entre os crossfiteiros

Também conhecida como a “dieta de quem faz crossfit”, o Whole30 se tornou sucesso entre os crossfiteiros americanos e logo chegou aos boxes brasileiros. Entre os praticantes está o rondonense Diogo Henrique Delavi, de 28 anos. Da turma da academia onde treina, ele se orgulha de ter sido o primeiro a cumprir os 30 dias. “Já havia feito várias dietas, mas com nenhuma consegui um resultado tão bom quanto com o Whole30”, enaltece.

Dos resultados obtidos com a dieta, Diogo pontua primeiramente o ganho de qualidade de vida, seguido da perda de quase 20 quilos durante os 30 dias. “Além disso, por ser uma dieta baseada em proteína, durante o processo eu treinei com mais intensidade e assim também ganhei massa muscular”, destaca.

Ele comenta que o início da dieta é difícil, principalmente por conta das restrições alimentares. “Você deixa de ingerir alimentos que fazem parte do dia a dia, como pão, leite, açúcares, grãos e até mesmo o arroz e feijão”, menciona.                      

Em contrapartida, Diogo frisa que com o passar dos dias o corpo e o organismo se adaptaram e ele passou a comer “comida de verdade”, ou seja, alimentos naturais. “São alimentos ‘da terra’, como batata doce e inglesa, mandioca, verduras, legumes, frutas, proteínas e gorduras boas”, relata. “Eu, particularmente, não busquei inventar receitas, mas também não fiquei com fome em nenhum dos dias, pois comia quantas vezes eu quisesse, no entanto eram apenas os alimentos certos”, salienta.

O cardápio de Diogo era variado e respeitava a todos os requisitos impostos pelo programa Whole30. Na parte da manhã ele diz que dava preferência para receitas com ovos. Para o lanche a escolha eram frutas e no almoço o cardápio era à base de carnes, mandioca, batata e refogado de legumes. Já à noite ele fazia tapioca ou crepioca com carne e ovo.

 

Primeiras diferenças 

Praticante de crossfit há cerca de dez meses, Diogo revela que a modalidade teve uma contribuição significativa para sua redução de peso e garante que mesmo após finalizados os 30 dias de dieta, os hábitos alimentares continuam. “Agora sei fazer escolhas boas para me alimentar e sem passar fome”, pontua.

Uma das regras do programa proíbe subir na balança ou tomar quaisquer medidas do corpo durante os 30 dias de dieta. “Mesmo assim, antes de terminar o programa, já notava algumas mudanças significativas, como melhora na disposição e redução de medidas corporais”, menciona Diogo, acrescentando que antes de iniciar a dieta ele estava com 109 e atualmente pesa 91 quilos. 

Além de crossfit, o rondonense também pratica mountain bike, o que, segundo ele, auxilia na obtenção de bons resultados.

 

Aos poucos…

Com os 30 dias de dieta completados, o rondonense voltou a reinserir alguns alimentos ao seu cardápio. “Cortei totalmente o consumo de refrigerantes, diminuí bastante a ingestão de frituras e carboidratos. Bebidas alcoólicas voltei a ingerir, mas em frequência e quantidade menores”, expõe. 

 

Metas

Além da redução de peso, outro objetivo de Diogo ao fazer o Whole30 era melhorar sua performance no crossfit. Com esse resultado também alcançado, ele revela que pretende novamente fazer os 30 dias de dieta, visando agora uma competição na modalidade. “Já participei uma vez dessa competição, mas agora pretendo ter um resultado muito melhor”, ressalta.

 

Riscos das dietas restritivas

Se por um lado o Whole30 traz benefícios, de outro o método pode comprometer a saúde. Assim como as demais dietas restritivas, ele pode levar o organismo ao desequilíbrio de nutrientes. “O maior risco das dietas restritivas é a retirada de alguns nutrientes que o organismo precisa para estabelecer seu estado fisiológico de funcionamento ideal e desenvolver as reservas nutricionais. O comprometimento do funcionamento de sistemas, seja digestivo, urinário ou excretor e a propensão a desenvolver constipações são algumas das consequências de uma dieta irregular”, afirma a nutricionista clínica e esportiva Aiessa Balko Smaniotto.

Ela diz que se a pessoa não respeitar a própria fisiologia e as características que traz da sua genética, um estilo de vida como este pode antecipar o desenvolvimento de doenças. “O risco de seguir uma dieta indicada por colegas, as ‘dietas padrão’, isto é, que se tenta aplicar de uma mesma forma para um grande grupo, está no fato de que é algo individual que está sendo aplicado igualitariamente a todos e de uma forma coletiva, sem se atentar ao fato de que cada pessoa possui determinadas características fisiológicas e precisa, por conta disso, de uma dieta específica”, alerta.

De acordo com a nutricionista, há pessoas que, por exemplo, têm insônia, enxaqueca, síndrome do intestino irritável, alguns desarranjos gastrointestinais, gastrite, intestino preso, etc, sendo que não se consegue, através de uma dieta padrão, organizar tudo isso. “Como alguém vai seguir uma dieta padrão sendo que cada pessoa possui horários diferenciados, pratica atividade física em um determinado horário, além da questão da matéria-prima para executar o exercício e do pós-exercício, com a recuperação muscular, ou seja, os nutrientes específicos para cada tarefa que o corpo vai executar”, questiona a profissional, acrescentando: “Além disso, é preciso levar em consideração o intervalo de tempo em que cada pessoa tem o esvaziamento gástrico, visto que isso vai determinar em quanto tempo essa pessoa vai precisar se alimentar novamente, com base na sua necessidade individual”.

Aiessa reforça que dietas padrões não respeitam nenhuma dessas características e podem até mesmo agravar alguns quadros de saúde, caso a pessoa já tenha tendência a desenvolver algumas doenças. “A dieta não vai desenvolver, mas pode intensificar algumas patologias”, considera.

Por não estar de acordo com a legislação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), o Whole30 pode ser caracterizado como uma dieta irregular. “Nós, enquanto profissionais, somente podemos prescrever planos alimentares com base em todos os ingredientes que estão previstos pela Anvisa”, aponta.

Comer carne, frutos do mar/peixes, ovos, muitos vegetais, frutas e gorduras boas é uma das regras do Whole30. A nutricionista destaca ser verdadeiro que todas as gorduras boas (fontes de ômega), em boas quantidades, podem melhorar o não acúmulo de gordura na região abdominal, porém ressalta a importância de fazer uma triagem. “Isso é essencial para ver se a pessoa não apresenta uma carência ou redução de determinadas vitaminas, ou através do histórico alimentar verificar se está ingerindo uma quantidade insuficiente dos ômegas, por exemplo”, frisa.

 

Consequências

A profissional comenta que toda e qualquer restrição alimentar mesmo que traga benefícios também acarretará em consequências, como na manutenção das funções fisiológicas dos sistemas respiratório, circulatório e urinário. “Não somente deve se preocupar com a restrição de grupos alimentares e horários, mas também com a qualidade, quantidade e frequência dos ingredientes que são ingeridos através de determinados alimentos”, ressalta.

Aiessa diz que antigamente quem fazia dieta se preocupava em comer alimentos com mais nutrientes, como frutas, verduras e uma variedade maior de cereais, mas hoje a dieta está associada à restrição calórica, e isso, conforme ela, acarreta em uma carência nutricional. “Se há uma restrição a ser feita é na quantidade e frequência do sal, do açúcar dos conservantes, corantes e alimentos ultra processados. Essa sim é uma restrição consistente a se fazer”, avalia a nutricionista.

Diante de todas as regras e privações, as dietas restritivas e individuais cabem na sociedade? Para a nutricionista, é inviável ter uma vida social com uma restrição que só você vive. “Haverá momentos em que essa pessoa terá que se alimentar no coletivo, seja adultos, idosos, crianças ou adolescentes, e cada um com necessidades distintas, mas que precisam se servir da maneira que seja ideal para si”, enfatiza.

 

Mudanças

“Toda e qualquer mudança de estilo de vida, que não seja sustentável, não vai trazer mudanças consistentes no peso e em condições corporais”, afirma Aiessa. Ela enaltece que qualquer tipo de restrição extrema requer acompanhamento, principalmente para descobrir se isso trouxe carências nutricionais. “Para haver uma mudança de peso e conseguir manter, além de mudança do estilo de vida, a pessoa promove uma mudança metabólica, que é importante que seja acompanhada juntamente com um nutricionista ou um endócrino, para que não ocorram distúrbios metabólicos”, salienta.

 

Efeitos inversos

A nutricionista destaca que é arriscado uma pessoa seguir um plano alimentar não sabendo qual a sua condição inicial, e assim saber se perdeu gordura ou músculo. “Além disso, não irá periodizar uma margem segura de perda de peso para não aumentar muito, por exemplo, o colesterol sanguíneo. Haja vista que emagrecer mais que cinco quilos por mês, além de não conseguir manter esse mesmo peso posteriormente, a pessoa pode apresentar um aumento muito grande da gordura hepática e colesterol”, informa. 

Carências nutricionais e o tão temido “efeito sanfona” também são riscos que as dietas restritivas podem gerar. “Isso porque se não houve uma restrição progressiva e calculada, haverá momentos em que a pessoa estará usando gordura e em outros proteínas, que é músculo, e isso é péssimo”, alerta.

 

Reinclusão de alimentos

O fato de após cumprir os 30 dias com todas as restrições alimentares, as pessoas voltarem a reinserir alimentos no seu cardápio é questionado pela nutricionista. “A pessoa se submete ao extremo e depois volta a reincluir os alimentos, talvez sem saber se ela realmente ganhou ou perdeu peso, e se, inclusive, tem reserva para fazer a dieta por mais 30 dias”, observa.

O ideal, de acordo com Aiessa, é que a pessoa fique no adequado e que ela consiga mantê-lo. Mas para isso é preciso mudança no estilo de vida. “Algumas coisas que não estão presentes na alimentação dessa pessoa teriam que ser incluídas e aquilo que está sobrando seria ajustado. O que não deve ser feito é colocar o paciente em uma caixinha quadrada, dizendo que ele precisa viver de um determinado jeito, sem levar em consideração a sua rotina, cultura e hábitos alimentares do dia a dia, porque eu não vou conseguir incluir alimentos que talvez nunca fizeram parte da alimentação dessa pessoa”, alega.

Para ela, as dietas restritivas são “modismos” que mudam de nomes, mas continuam com as mesmas características. “O que realmente precisa ser feito é filtrar as receitas através dos ingredientes. Se você tem uma matéria-prima boa, orgânica e de qualidade, isso vai virar um produto, e se for consumido adequadamente, haverá uma boa absorção dos nutrientes”, expõe. 

 

Reeducação alimentar

A profissional enfatiza que quanto menos processado o alimento, melhor. “Porém, não se deve fazer isso de modo restrito em quantidade, além do recomendado individualmente, ou seja, abaixo das recomendações diárias, tanto de vitaminas e minerais, quanto as recomendações calóricas”, pontua, ressaltando: “Para não ter efeitos colaterais da restrição, e a pessoa ficar apenas com os benefícios, é aconselhável um programa mais consistente, que seria um comportamento de reeducação alimentar”.

 

“Modismos em alta”

Aiessa revela que não somente adeptos do Whole30, mas também pacientes que estão recorrendo a outros métodos, como a dieta intermitente, que é o jejum prolongado, são os que mais são atendidos em seu consultório. Além disso, por ser nutricionista esportiva, ela também já atendeu muitos pacientes que buscavam fazer exercícios em jejum, com o objetivo de queimar mais gordura. “‘Os modismos’ estão inseridos no nosso dia a dia, mas possuem uma vida útil muito curta. Sendo assim, as dietas só mudam de nome e características, mas a ciência sempre desmitifica o que realmente funciona ou não em determinado processo”, enaltece.

Fazer um acompanhamento nutricional é o último passo a ser feito desde que a pessoa se disponha a seguir o tratamento, que realmente modifica o estilo de vida. “Desta forma, ela não vai precisar de outro processo de mudança, a menos que a própria genética e estilo de vida em outras características mostrem doenças a serem tratadas”, menciona Aiessa.

Para ela, quem realmente segue o tratamento indicado por profissionais competentes apenas retornam ao consultório para verificar se tudo está certo, a qualidade de suas escolhas e se atualizar sobre algo de novo que possa haver. “Mas não volta para retificar, porque não terá nada de errado”, finaliza.  

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