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Marechal Custos x produtividade

Frustração da safra faz agricultores de Marechal Rondon e região repensar contratos de arrendamento

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(Fotos: Sandro Mesquita/OP)

As perdas na agricultura, em virtude da longa e penosa estiagem que castigou e ainda castiga parte da região Sul do Brasil, são sentidas não somente pelo agricultor que investiu tempo e dinheiro para preparar e semear o solo, mas também por quem arrendou áreas de terra de outros produtores.

Os prejuízos nas lavouras paranaenses de soja e milho em 2021 ultrapassaram os R$ 22 bilhões. Em Marechal Cândido Rondon há relatos de produtores que colheram apenas seis sacas em um alqueire de terra, número absurdamente menor que as 180 sacas/alqueire colhidas em média na safra de verão de 2020.

Arrendatários e arrendadores não contavam com tamanha quebra na produção e precisaram de uma boa dose de conversa e jogo de cintura para chegarem a um consenso e, até mesmo, fazerem ajustes para os próximos contratos de arrendamento.

 

Contratos

Normalmente, o valor pago ao arrendador é fixo ou em percentual sobre a safra colhida. Para a cultura da soja, muitos contratos são firmados para pagamento de 50 sacas por alqueire ou 30% da produção. Em relação ao milho, são feitos contratos em 30% da produção para cultura de verão e 20% para a segunda safra.

No entanto, nestes moldes, a conta não fecha, uma vez que os insumos aumentaram mais de 100% em alguns casos, no ano passado, enquanto que o custo para produzir um alqueire de soja subiu de 45 para até 90 sacas. Isso, é claro, dependendo da estrutura, equipamentos, mão de obra que o arrendatário possui e da sua capacidade de negociação na aquisição de insumos.

Conforme o vice-presidente do Conselho de Desenvolvimento Agropecuário de Marechal Rondon e engenheiro agrônomo do IDR-PR, Urbano Mertz, estes patamares poderão inviabilizar economicamente muitos agricultores arrendatários nas próximas safras. “Caso forem mantidos as mesmas cláusulas contratuais, ou houver dificuldade de negociação entre as partes quanto ao valor pago ao proprietário da terra”, menciona.

 

Fixo ou percentual?

O produtor rural Ademar Storch conta que prefere fazer os contratos de arrendamento de acordo com a produção obtida, pois, segundo ele, essa forma oferece menos risco ao arrendatário. “Eu não colhi 50 sacas de soja por alqueire, como faria para cumprir o contrato?”, questiona. “A metade faltaria”, pontua.

Morador da Linha Concórdia, interior rondonense, Storch planta grãos em uma área de 21 alqueires. Deste total, 12 são de terras arrendadas.

O agricultor revela que colheu em média 25 sacas de soja por alqueire na última safra, enquanto que a média considerada normal para a cultura seria de aproximadamente 160 sacas. “A quebra foi grande. Faltou mais ou menos 140 sacas”, compara.

Eno Pedde cultiva milho e soja em uma área de aproximadamente 30 alqueires em Marechal Rondon. Cerca de 50% das lavouras plantadas por ele são em terras arrendadas.

O produtor revela que possui tanto contratos firmados no sistema de percentual como em valores fixos em sacas de grãos.

Ele diz que colheu na última safra apenas 12 sacas de soja por alqueire e, em razão da quebra, os arrendamentos fixos foram extremamente desvantajosos para ele. “Os contratos com valores fixos foram péssimos para mim, mas, é claro, precisamos honrar os compromissos”, menciona.

De acordo com Pedde, não foram feitas alterações contratuais referentes à safra de milho já implantada nas terras arrendadas por ele em razão do bom relacionamento com os arrendadores. “Sempre encontramos uma forma de resolver a questão. Alguns a gente acerta, outras empurramos para a safrinha ou para o próximo ano”, expõe.

 

Preços

Apesar das perdas registradas nas últimas safras em algumas regiões do país por conta da estiagem, os ótimos preços da soja e do milho ajudam a equilibrar o orçamento dos produtores.

Conforme Mertz, os preços pagos aos agricultores ainda estão em elevação, tendo em vista as frustrações na safra brasileira de soja e milho em função da seca, que também atingiu gravemente a safra argentina e paraguaia.

Segundo ele, por enquanto, as cotações futuras para agosto, véspera da colheita da safra americana, ainda estão acima de US$ 16/bushel (medida de volume que precisa levar em conta a densidade e as características do produto). “Em todo caso, se houver uma safra normal americana, que deve ser colhida no segundo semestre, e uma safra normal brasileira e argentina no próximo verão, estes preços podem voltar aos patamares anteriores”, prevê.

O vice-presidente do Conselho de Desenvolvimento Agropecuário de Marechal Rondon chama a atenção para a China, que anunciou uma redução da importação de soja para 2022, principalmente em função dos preços altos da soja brasileira, mas também porque diversificou os fornecedores e ampliou muito a sua própria área de produção.

No valor atual do dólar, as cotações futuras da soja ficam acima de R$ 180/saca. Considerando o câmbio desta semana, o valor da saca está acima de US$ 35. “E lembrar que em 2012 a saca de soja já passou dos US$ 40, mas com o câmbio em torno de R$ 2,20/dólar”, recorda.

O engenheiro agrônomo comenta que em fevereiro de 2020 a saca estava em torno de US$ 18, com o câmbio de aproximadamente R$ 4,30, ou seja, o preço da saca girava na casa de R$ 77. “Consideramos que estas oscilações fazem parte do mercado, e caso não houver fatores extraordinários, com uma pequena valorização do real e uma safra cheia, o preço da soja pode voltar a patamares de R$ 100 a R$ 120/saca”, estima.

Mertz pontua que mesmo se os arrendamentos forem realizados em percentual sobre a colheita, os riscos para os arrendatários ainda serão grandes, “principalmente se houver uma queda expressiva no valor de comercialização da soja nos próximos anos, sem que o custo dos insumos e dos serviços abaixem na mesma proporção”.

 

Renegociação

Normalmente não se renegocia contrato durante a sua vigência e muito menos após a colheita. Contudo, segundo o engenheiro agrônomo, “o agricultor pode renegociar com o proprietário da terra as condições de pagamento desta ou das próximas safras, dependendo das cláusulas constantes no contrato, ou dependendo também da capacidade de negociação entre as partes, buscando usar o bom senso”, aconselha.

 

Vice-presidente do Conselho de Desenvolvimento Agropecuário, Urbano Mertz: “Em geral os contratos são feitos prevendo condições normais de produção e produtividade das culturas a serem plantadas nas terras arrendadas. Condições excepcionais de frustração de safra eventualmente constam em contratos de venda de terras, que podem ser fixadas para pagamento em sacos de soja por ano” (Foto: Divulgação)

 

Agricultor Ademar Storch: “O contrato em percentual é bom para os dois lados, pois quando a safra é boa, o arrendador também ganha mais” (Foto: Sandro Mesquita/OP)

 

Produtor rural Eno Pedde: “Os contratos com valores fixos foram péssimos para mim, mas, é claro, precisamos honrar os compromissos” (Foto: Sandro Mesquita/OP)

 

Contratos de arrendamento e de parceria geralmente são feitos em média de cinco anos, o que facilita os financiamentos por parte dos arrendatários. Eventualmente, alguns contratos são feitos por até 15 anos (Foto: Sandro Mesquita/OP)

 

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