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Marechal O que muda?

Polêmica, PEC do voto impresso divide opiniões. Lideranças rondonenses não veem vantagens nas mudanças; confira

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(Arte: O Presente)

Desde as eleições de 2018 e agora com maior vigor, as urnas eletrônicas, utilizadas nacionalmente em definitivo a partir dos anos 2000, são colocadas em dúvida frequentemente pelo presidente da República, Jair Bolsonaro. Motivada pelas inquietações presidenciais, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 135/2019 tramita no Congresso Nacional, mas divide opiniões e vem perdendo apoiadores no cenário político.

Por parte do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a proposta é considerada descabida, visto que, conforme nota emitida pelo TSE, não há vestígios ou comprovações de fraude nas eleições enquanto utilizou-se a urna eletrônica.

 

O QUE MUDA?

Mesmo com a aprovação da PEC 132/2019, a urna eletrônica continuaria sendo utilizada. A mudança seria a impressão de um comprovante do voto que, posteriormente, seria depositado em um compartimento externo da urna. O comprovante físico serviria para conferência do resultado da urna, se solicitado.

Ao contrário do que pensam alguns, o eleitor não sairia do local de votação com o comprovante, explica o juiz eleitoral de Marechal Cândido Rondon, Renato Cigerza. “Esse é um grande equívoco. Após digitar o número do candidato na urna e confirmar a operação, o sistema imprimiria a informação e depositaria em um local externo, lacrado, sem contato manual do eleitor”, relatou ao O Presente.

A reportagem contatou algumas lideranças para opinar sobre o assunto, que segue sendo motivo de polêmicas semana após semana. Confira.

 

Presidente da subseção da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/PR) de Marechal Rondon, Nair Galles

“Se aprovada a PEC, uma das principais mudanças seria a celeridade nas eleições. Nos dias atuais, o processo eleitoral é concluído, em média, em 24 horas. Com o grande número de eleitores, se retroagirem ao voto no papel, o tempo necessário será muito maior. Considerando que vivemos em um mundo eletrônico, cada vez usando mais tecnologia, voltar ao voto impresso é retroagir no tempo. Eu não vejo vantagens na mudança e não acredito que seja mais seguro, pois se houver uma forma de não confiabilidade no voto eletrônico, também não haverá no voto impresso. Acredito que por meio eletrônico as possibilidades de fraudes sejam menores que no voto impresso. Por ser uma mudança repentina e pouco estudada, poderia fazer os brasileiros desacreditarem no sistema eleitoral. Sobre o uso de urnas eletrônicas, penso que não seja completamente seguro, porém traz menos margem para fraudes do que o voto impresso”, argumenta.

Presidente da subseção rondonense da OAB/PR, Nair Galles: “Por ser uma mudança repentina e pouco estudada, a mudança poderia até fazer os brasileiros desacreditarem no sistema eleitoral” (Foto: Divulgação)

 

Presidente da Comissão de Direito Eleitoral da OAB/PR de Marechal Rondon, advogado João Bersch

“As desvantagens do voto impresso são a despesa bilionária para adaptar as atuais urnas com impressoras; o curto tempo para adaptar o sistema até as eleições de 2022; a morosidade na votação; possíveis falhas na impressora demandariam a troca das urnas ou até votação em cédulas; o aumento nas despesas com segurança para manter os votos impressos armazenados; a possibilidade de questionamento do resultado da eleição e recontagem de votos em massa, o que resultaria num atraso no resultado oficial e uma enxurrada de ações na Justiça Eleitoral; o aumento na chance de violação do voto, mediante fotografia do voto impresso, o que já acontece atualmente, porém, com mais dificuldade. Não acredito que o voto impresso trará mais segurança, visto que nunca se comprovou a ocorrência de fraude ou adulteração no resultado com o sistema atual. Se fosse possível fraudar o voto eletrônico, automaticamente seria possível fraudar o voto impresso, o que, na minha visão, é uma incoerência. Deve ficar claro que as urnas não possuem conexão com a internet, ou seja, invadir uma urna eletrônica seria como invadir uma cafeteira. Suposições de fraude não podem ter força jurídica para alterar um sistema que vem funcionando bem. Questionamentos fazem parte da democracia. Constatamos no mundo inteiro questionamentos sobre resultados de eleições coincidentemente vindos sempre do lado perdedor. Não há uma fórmula absolutamente segura, porém, creio termos no Brasil um dos sistemas eleitorais mais seguros do mundo. A mudança traria ao sistema eleitoral gravosos prejuízos. Vejo risco no aumento da violação do sigilo do voto e devemos lembrar que esta alteração impactaria o Brasil inteiro, posto que em várias localidades o ‘voto de cabresto’ ainda é uma realidade e poderia ser impulsionado. Tais alterações não encontram respaldo na realidade jurídica que vivemos na Justiça Eleitoral e nas eleições, pois até o momento nunca houve indícios de fraude às urnas eletrônicas. Acredito que o atual sistema é seguro, pois elegeu políticos de todas as vertentes ideológicas, o que demonstra a prevalência da democracia e da escolha do eleitorado. A alegação de fraude eleitoral ocorre em países com votações impressas ou eletrônicas, todavia, na sua absoluta maioria, não passam de reclames infundados. Entendo que o atual sistema eleitoral deve ser melhorado, mas acredito que estamos em um caminho correto e se a PEC for sancionada será uma regressão democrática-eleitoral”, frisa.

Presidente da Comissão de Direito Eleitoral da OAB/PR de Marechal Rondon, João Bersch: “Suposições de fraude não podem ter força jurídica para alterar um sistema que vem funcionando bem” (Foto: Arquivo/OP)

 

Chefe do Fórum Eleitoral de Marechal Rondon, Fábio Gealh

“Conhecendo o processo eleitoral, acredito não ser possível atribuir vantagens à mudança pretendida. Em defesa da mudança, há quem mencione a possibilidade de conferência do voto antes da validação, mas isso já existe atualmente. O eleitor digita o número do candidato e a urna permite que ele confira o voto digitado antes de validar. Nesse processo não há quebra ao sigilo do voto, pois, uma vez confirmado, o voto é validado e a votação encerrada. A impressão do voto traria risco à inviolabilidade do voto, uma vez que permitiria fiscalizar em quem o eleitor votou mediante o registro indevido ou por fiscais de partido durante eventual falha no processo de impressão ou travamento do papel. A proposta é contraditória, visto que, na verdade, inaugura um enorme risco à quebra do sigilo. É interessante ao eleitor que ninguém saiba em quem votou e é importante que os candidatos sejam eleitos sem identificar como cada eleitor votou. No caso de auditoria, os votos em papel seriam apurados e comparados com o resultado apresentado pela urna eletrônica. Devido à intervenção manual direta com os votos impressos, a possibilidade de fraude com relação ao papel é grande, ocasionando resultados divergentes e menos confiáveis. Na prática, o alvo de ataques foi deslocado da urna eletrônica para a auditoria por contagem dos votos impressos, o que pode implicar na anulação indevida de votos enquanto a vontade do eleitor é perfeitamente íntegra nos registros eletrônicos. Com relação à comprovação pelo eleitor de seu próprio voto, essa possibilidade viola o sigilo, que é uma garantia expressa pela Constituição, uma vez que o eleitor poderá apresentar prova do seu voto a outra pessoa. Mesmo com registro impresso do voto, o eleitor nunca teria garantia de que seu voto foi efetivamente contado num processo de auditoria. Em Marechal Rondon já aconteceu o sorteio de uma de suas urnas para apuração paralela pelo Tribunal Regional Eleitoral e o resultado da auditoria comprovou a regularidade da votação eletrônica. Outro procedimento de segurança, publicamente aberto a todos, é a auditoria da carga e lacração das urnas. No dia da preparação das urnas para o dia da eleição, candidatos, partidos políticos, OAB e Ministério Público são notificados pessoalmente para comparecerem ao procedimento de auditoria. Até hoje, além da OAB e Ministério Público, apenas um partido rondonense e dois de Pato Bragado compareceram. Além disso, nunca houve ocorrência de que qualquer urna tenha iniciado a votação com o registro de votos a partir da checagem da zerésima. A urna eletrônica não possui nenhum mecanismo que possibilite sua conexão a redes de computadores, como a internet, e nem mesmo possui o hardware necessário para se conectar a uma rede ou a qualquer forma de conexão com ou sem fio. Não há fraudes no sistema de votação atual. O que existem são suposições e crenças negativas de algumas pessoas sobre o sistema eletrônico de votos. Não há, nem nunca houve, qualquer prova de que tenha existido fraude na urna eletrônica. Historicamente, já houve questionamentos por grupos políticos de um segmento e outro, mas sem prova destas suposições. Na hipótese de fraude, não há motivo algum para quem afirma isso se esquivar de apresentar tal situação, todavia ocorre que não há provas, apenas crença. Ou melhor, descrença sem nenhuma evidência. No conteúdo da PEC 135/2019 não há indício de que o sistema atual permita fraudes ou que elas tenham ocorrido. O texto apenas se delonga em críticas às decisões do TSE e do STF (Supremo Tribunal Federal) em julgamentos sensíveis ao tema. Essa mudança traria descrédito e criaria instabilidade no sistema eleitoral. É lamentável que se discuta este tipo de retrocesso de segurança num processo eleitoral seguro, confiável e eficiente. A PEC aparenta ser possível na forma técnica, mas não seria viável por, além de exigir enorme gasto de dinheiro público, aumentar os fatores de risco à segurança do voto e a confiabilidade do sistema”, reforça.

Chefe do Fórum Eleitoral de Marechal Rondon, Fábio Gealh: “Essa mudança traria descrédito e criaria instabilidade no sistema eleitoral. É lamentável que se discuta este tipo de retrocesso de segurança num processo eleitoral seguro, confiável e eficiente” (Foto: Arquivo/OP)

 

Juiz eleitoral de Marechal Rondon, Renato Cigerza

“Não vejo vantagens na mudança, a não ser silenciar as incansáveis vozes de que o sistema eleitoral brasileiro não é confiável. Como desvantagens, pode-se citar a morosidade do processo de votação, sem esquecer do elevado custo financeiro para adaptação das urnas, que não estão e nem foram preparadas para impressão. Acima de tudo, há o risco de quebra do sigilo do voto com a ocorrência de problemas técnicos relativos à impressão e necessidade de reparos durante a própria votação. O sistema atual é absolutamente seguro e foi criado de modo a evitar qualquer influência externa. Após a carga das urnas, com a informação a respeito dos candidatos, todos os compartimentos são lacrados e não há mais possibilidade de acesso ao conteúdo daquele equipamento sem que o lacre seja rompido. Se antes de receber o primeiro voto a urna emite a zerésima, indicando que os candidatos daquele pleito possuem zero voto, e ao finalizar a votação a urna imprime um boletim com todos os votos dados naquela seção, como se cogita a ocorrência de fraude se durante todo o processo a urna ficou isolada, sem ligação de rede e, assim, sem possibilidade de ser invadida? Até hoje, nunca se narrou nenhuma fraude comprovada no sistema eleitoral, ao passo que uma mudança dessa dimensão traria insegurança aos votantes. Por isso, o TSE é contra o projeto de lei. Como juiz eleitoral, não presenciei qualquer fraude na votação e nem poderia diante da ausência de condições de influências externas. O que se presencia são casos de compra de voto. Nesse caso, a fraude não se dá pela urna, mas, sim, pela ação humana que influencia o eleitor com promessas. A ingerência não deixa de ser uma fraude, mas não tem qualquer relação com a urna eletrônica”, salienta.

Juiz eleitoral de Marechal Rondon, Renato Cigerza: “Não vejo vantagens na mudança, a não ser silenciar as incansáveis vozes de que o sistema eleitoral brasileiro não é confiável” (Foto: Divulgação)

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