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Por que só abrir mais leitos não resolve o problema da pandemia

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Desde o início da pandemia, em março do ano passado, o Paraná já disponibilizou 3.150 leitos exclusivos para a Covid, sendo 1.285 leitos de UTI e 1.865 de enfermaria (Foto: Rodrigo Felix Leal/AEN)

No dia 26 de fevereiro de 2020, o Brasil confirmou a primeira contaminação pelo coronavírus. Tratava-se de um cidadão de São Paulo que havia viajado para a Itália. Em março, ocorreu a declaração de transmissão comunitária no país, mês em que também foi registrada a primeira morte pela doença.

No dia 20 daquele mês, o Paraná anunciava o primeiro lockdown, seguindo medida semelhante de outros Estados, como forma de organizar o sistema de saúde, os fluxos de atendimento dos pacientes e, especialmente, frear a circulação do vírus.

Um ano depois, o Brasil vive o pior momento da pandemia de Covid-19. Hospitais lotados e com o número de óbitos crescente.

“Em fevereiro de 2020, ninguém imaginava os rumos que a pandemia tomaria. Por várias vezes imaginávamos que estava melhorando, porém, infelizmente, hoje vivemos o pior momento da pandemia em nosso país, com número crescente de casos e óbitos”, reforça a médica infectologista Juliana Gerhardt Moroni, de Cascavel.

De acordo com ela, esta situação crítica é a soma de uma combinação de fatores. “Primeiro, mutações virais (o que é comum entre os vírus que têm alta circulação), com novas cepas que são mais transmissíveis e potencialmente mais agressivas. Segundo, grande relaxamento das medidas preventivas, que sabemos ser de extrema importância no controle da pandemia, como uso de máscaras e distanciamento principalmente. Terceiro, o conhecimento de que, sim, a reinfecção ocorre e a imunidade, em média, dura de dois a três meses. Quarto, a velocidade extremamente lenta da vacinação no país, com menos de 1% da população já imunizada com duas doses”, detalha.

 

NOVA CEPA: CARGA VIRAL MAIOR

Segundo a infectologista, no Brasil já foram identificadas duas variantes do coronavírus, o P.1 e P.2. “Os dados a respeito ainda são escassos, porém apresentam maior potencial de disseminação. Os infectados possuem uma carga viral até dez vezes maior, gerando um grande número de casos em pouco tempo, além da possibilidade – ainda em estudo – de causarem casos com evolução mais rápida e mais grave”, revela.

 

SÓ ABRIR LEITOS NÃO VAI CONTER A PANDEMIA

Em redes sociais, um dos principais questionamentos das pessoas é por que não abrir mais leitos nos hospitais. No entanto, dados divulgados pela Prefeitura de Cascavel, por meio da Secretaria Municipal de Saúde, por exemplo, mostram que 45,7% das pessoas internadas com Covid-19 em leito UTI foram a óbito e 25% dos pacientes confirmados com a doença, que entraram na UTI e tiveram alta, morreram por sequelas pós-alta.

“É claro que ter leitos de hospital e de UTI é essencial. Porém, a população precisa entender que isso não irá conter a pandemia. Isso irá ajudar no tratamento dos casos mais graves, que precisam de hospitalização. Contudo, é extremamente difícil esta logística: as instituições precisam ter um espaço físico exclusivo para os leitos de isolamento (o que na maioria delas significou fechar leitos que atendiam outras doenças); precisa ter equipe exclusiva para atender naquele setor, e extremamente capacitada e treinada, já que são casos complexos e críticos; precisa ter toda uma organização com aparelhos, exames, entre outros, que não se consegue de forma rápida. E nenhum profissional aguenta mais. Um ano trabalhando nesses setores levou a um extremo desgaste físico e emocional de toda a equipe. É uma rotina extremamente extenuante, além de lidar diariamente com o medo de ser contaminado e assim contaminar alguém”, ressalta.

Além disso, de acordo com a médica, o fato de alguém com Covid-19 necessitar de hospitalização já aumenta em muito o risco de morrer pela doença e suas complicações, mesmo que seja atendido em um serviço de excelência. “Se houver necessidade de ventilação mecânica, o que indica que o caso é crítico, o risco de morte está em torno de 30% a 50%. Ou seja, o caminho é não se infectar e, para isso, a pandemia precisa ser controlada fora dos hospitais, na comunidade”, frisa. “Se as pessoas não adotarem novamente as medidas restritivas para frear a disseminação viral, e seguindo a velocidade que a vacinação está ocorrendo no país, infelizmente não será possível conter a pandemia. Quanto mais circulação viral, mais probabilidade de mutações e novas cepas”, alerta.

A infectologista frisa que o cerne da questão não está em abrir infinitos leitos de hospital e UTI, como muitas pessoas defendem. O essencial, enaltece ela, é frear a disseminação viral. “Isso só será possível com vacinação em massa e medidas rígidas de distanciamento, uso de máscaras e higiene de mãos. Um bom exemplo é o que ocorre em Israel, onde está havendo a vacinação em massa”, exemplifica.

 

Médica infectologista Juliana Gerhardt Moroni: “Quanto mais circulação viral, mais probabilidade de mutações e novas cepas” (Foto: Arquivo/OP)

 

PREOCUPAÇÃO COM JOVENS

Médicos têm manifestado que uma das preocupações no momento, além das pessoas com comorbidades e idosos, são os jovens. “Infelizmente, percebe-se que os jovens são o grupo que menos segue as orientações de uso de máscaras, distanciamento e não realizar aglomerações. Atuam como vetores, levando vírus e contaminando familiares, amigos e colegas de trabalho, que muitas vezes ficam em estado grave e morrem. Estamos observando também que a média da faixa etária dos casos graves caiu muito. No início, estava acima de 70 anos; agora, a média é em torno de 50 anos, com vários casos graves em UTI de pessoas na faixa dos 20, 30 anos, e sem comorbidades”, relata.

 

CASOS COM EVOLUÇÃO MAIS RÁPIDA

Chama atenção que alguns pacientes com Covid-19 têm evoluído mais rapidamente nos registros de óbito, inclusive em Marechal Rondon. Na avaliação da médica, é preciso mais dados de pesquisas para identificar os motivos, mas provavelmente, conforme a profissional, isso tem ocorrido devido às novas cepas. “O principal parâmetro para indicar hospitalização é a queda da saturação de oxigênio – este dado pode ser facilmente observado através da monitorização domiciliar da saturação com um oxímetro digital. Além de recomendar procurar atendimento em caso de sintomas como falta de ar, crises importantes de tosse, febre persistente, dor no peito, recomenda-se uma avaliação médica rápida para casos que mesmo sem sintomas apresentem saturação de oxigênio abaixo de 95%”, indica.

 

VACINA TRÍPLICE VIRAL, IVERMECTINA, CLOROQUINA…

De um lado, nenhuma comprovação científica de que o uso de ivermectina ou cloroquina ajudam no combate à Covid-19. Pelo contrário, o consumo destes remédios, sem acompanhamento médico, pode causar doenças como hepatite aguda.

Já um estudo preliminar de um pesquisador da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) indica que a vacina tríplice viral pode diminuir os sintomas de Covid e reduzir as chances de hospitalização, caso infectado pela doença.

A notícia tem feito com que algumas pessoas adquiram o imunizante para aplicar de forma indiscriminada, sem avaliação prévia do perfil de quem vai receber a vacina. A médica infectologista é enfática: “Antes de termos as vacinas específicas para Covid-19 liberadas, uma série de pesquisadores tentou avaliar se outras vacinas, já disponíveis, poderiam ser úteis no combate à pandemia. Temos um estudo, pequeno, com metodologia não ideal, que apontou que pessoas vacinadas com a tríplice viral (sarampo, caxumba, rubéola) poderiam ter Covid-19 mais leve. Todavia, esta informação não deve ser extrapolada para a vida real, pois não há este tipo de orientação por parte de nenhum órgão competente. A vacinação com tríplice viral deve continuar em sua recomendação usual: crianças de 12 meses e 15 meses (neste caso a tetraviral) ou duas doses para adultos até 49 anos que não foram vacinados na infância. Esta vacina é de vírus vivo atenuado, tem várias contraindicações e não pode ser usada em número de doses além do autorizado. É bastante perigoso tomar este tipo de conduta pensando em Covid-19. Totalmente fora das recomendações”, destaca.

 

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