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Paraná

Invasão de privacidade

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Podendo ser facilmente comprado pela internet, em lojas especializadas e até mesmo no Paraguai, drones estão cada vez mais acessíveis para o uso recreativo e abrem porta para o medo da invasão de privacidade

 

A constante evolução tecnológica tem tornado produtos cada vez mais acessíveis a pessoas comuns. E um bom exemplo da tecnologia ao seu dispor está na proliferação dos equipamentos conhecidos como drones – que na tradução livre para a língua portuguesa significa zangão, zumbido.

Há cerca de um ano, o rondonense Leandro Montoia adquiriu o equipamento e passou a captar imagens profissionalmente. Segundo ele, os preços variam muito, pois dependem da finalidade de uso do drone. Tem a linha recreativa, em que se podem encontrar aparelhos que custam em média R$ 300. Já a linha para iniciantes e hobby varia entre R$ 500 e R$ 3 mil, passando para os modelos profissionais, que podem custar mais de R$ 10 mil, diz.

Ao passo que a aquisição da aeronave remotamente pilotada (RPA) – que os usuários comandam por meio de um controle remoto – torna-se mais fácil, a legislação brasileira continua branda acerca do veículo aéreo não tripulado (VANT), forma como o aparelho eletrônico é classificado no Brasil.

Para fazer o investimento, não há muita complicação. O aparelho pode ser facilmente comprado pela internet, em lojas especializadas e até mesmo no Paraguai. Leandro ressalta, no entanto, que para a compra do produto importado é preciso ficar atento as diferenças dos produtos oferecidos. A maioria das marcas conhecidas podem ser encontradas no Paraguai e têm qualidade semelhante à do Brasil, mas antes de adquirir o aparelho no exterior, o comprador precisa se atentar à regularização do equipamento no Brasil, se possui garantia e também ficar ciente da cota de exportação, que na maioria das vezes é excedida. Mas as diferenças, nos nacionais, podem passar de 30% quando se trata de equipamentos com mais tecnologia, como sistema de GPS, maior alcance, qualidade de imagem, normalmente usados para fins profissionais, expõe o rondonense.

Para utilizar o drone, além de seguir as especificações do fabricante – como idade mínima para utilizar o aparelho -, a única obrigatoriedade atual é que o aparelho seja homologado pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), para evitar que o drone interfira em serviços de comunicação.

 

Violação de privacidade

Mesmo sendo utilizado em larga escala para fins profissionais, como para captação de imagens em eventos públicos e privados, criação de vídeos institucionais e até mesmo como aliado das forças policiais em prol da segurança pública, percebe-se cada vez mais o uso de aeronaves remotamente pilotadas para fins recreativos. Atualmente, qualquer cidadão pode adquirir um drone e operá-lo sem consequências maiores, o que abre porta para a possibilidade de uso desse equipamento para a violação da privacidade. Além dessa preocupação, a possibilidade de uso das aeronaves para cometimentos de infrações de natureza criminal já chama atenção no Brasil, onde alguns Estados já flagraram tentativas de entregas de drogas, celulares e até armas em presídios com o uso de drones.

De acordo com o advogado e procurador jurídico Rafael Faro, atualmente não há legislação específica para o uso dos equipamentos no Brasil. O que há é apenas um projeto de lei em tramitação na Câmara dos Deputados, que estabelece regras sobre o licenciamento e operação de veículos aéreos não tripulados e aeronaves remotamente pilotadas. Entretanto, a proposta trata apenas de veículo aéreo projetado para operar sem piloto a bordo, que possua uma carga útil embarcada e que não seja utilizado para fins meramente recreativos. Ou seja, exclui-se do projeto de lei normas concernentes ao uso indevido de drones para captação de imagens indevidas que violam o direito à privacidade do indivíduo, enfatiza Faro.

Com base no artigo 5º, inciso dez da Constituição Federal, que determina que são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação, ser fotografado ou filmado em sua intimidade por um objeto voador pode causar danos possíveis de reparação moral, cuja indenização deverá ser arbitrada pelo Judiciário. Em que pese não existir legislação que insira a utilização dos drones como ato ilícito, já existe a proteção, pela Constituição e pelo Código Civil, dos direitos da personalidade. Dentre esses direitos estão a imagem e a privacidade. Sem autorização, a utilização dos drones poderá ser objeto de reparação por danos morais, destaca o advogado.

Ele enfatiza, no entanto, que por se tratar da ofensa de um direito subjetivo, há a necessidade de ser apurado o caso em concreto, mas a partir do momento que o indivíduo sente que tem sua privacidade ferida, seja por meio de fotos, vídeos ou mesmo que o espião não esteja guardando as imagens em mídia e apenas bisbilhotando a vida de outrem, pode haver o entendimento de que está sendo atacada sua privacidade. É complicado delimitar isso porque no direito a matéria que é regrada, com legislação específica para o assunto, já gera controvérsias e conflitos por admitir interpretações diversas, quiçá uma matéria que não está regulamentada, polêmica, como é o caso deste assunto. Como eu vou dar uma segurança jurídica? Então faço uma análise superficial diante da ausência de uma lei especifica, menciona Faro.

Premier Drone

 

 

Tutela judiciária ou apoio policial?

Se um drone aparecer em uma propriedade privada, fazendo com que o cidadão sinta sua privacidade invadida, o advogado orienta a ir para a regra comum. Chame a Polícia Militar, que tem a função de atender ocorrências, e informe que você avistou um drone sobrevoando sua casa e que desconfia que possa ser alguém te vigiando, talvez um bandido querendo verificar a sua casa, como ela é por dentro para dar suporte a outro que vai invadir, exemplifica.

Se o caso ocorrer mais de uma vez, a orientação de Faro é de que a pessoa registre um Boletim de Ocorrência na Polícia Civil como forma de se resguardar. Se conseguir comprovar que a pessoa realmente está te filmando, primeiro tente resolver administrativamente. Descubra de quem é o equipamento, quem filmou ou quem difundiu as imagens, por exemplo, e caso não resolva procure a tutela judiciária, seja diretamente no juizado ou por meio de um advogado para fundamentar a ação, evidencia.

Casos como esse podem ocorrer em dano moral se apurado o caso concreto, já que, segundo o advogado, o dano moral possui requisitos, como o nexo causal e o dano, para serem apurados. É muito subjetivo, mas a pessoa procurando a tutela judiciária e comprovando que não houve autorização para efetuar fotos ou vídeos, pode haver a indenização por dano moral, completa.

Para evitar que o ato volte a se repetir, no âmbito do direito há tutelas inibitórias, como ordens judiciais, que podem estabelecer que nenhum drone possa chegar a um raio de 100 metros de determinada residência, por exemplo. Isso é possível, mas precisa ter uma fundamentação jurídica, lembra Faro, destacando que sansão imediata para quem pratica esse tipo de ato não é estabelecida por lei. Em pesquisas, até mesmo jurisprudências transitadas em julgado que tratassem do tema de invasão de privacidade relacionado ao uso de drones não foram localizadas, ressalta.

 

Sem perder a razão

Faro aponta que, em casos que o cidadão tenha sua privacidade violada pelo sobrevoo de um drone em sua residência, abater ou capturar o equipamento é extremamente desaconselhado, pois a pessoa estará incorrendo em ato ilícito. Não aja de forma a perder a razão. Capturá-lo é uma apropriação indevida de um bem que não é seu e isso é um ato ilícito, bem como derrubá-lo ou é dano ao patrimônio de outrem, explica.

Uma situação diferente, exemplifica, é no caso de o drone estar atacando a uma pessoa. Ele vai bater na minha cabeça, vai cair em cima do meu filho: eu vou agir em legítima defesa, ou seja, é um caso diferente. A integridade física de alguém estaria na iminência de ser lesada, expressa Faro. Nesses casos, bem como quando o equipamento cair na propriedade e o dono não for localizado, o advogado indica que a Polícia Militar seja procurada para que o fato seja apurado.

Já na esfera militar, como quando um drone é derrubado para evitar um crime ou diante de um crime que está flagrantemente sendo perpetrado, as forças policiais podem abater o equipamento. Isso é questão de segurança pública, que é um bem maior que a esfera privada, ressalta.

No ano passado, um drone foi derrubado a tiros após sobrevoar a cadeia pública de Guaíra. Próximo à carceragem estava ocorrendo um evento e a pessoa que estava operando era um fotógrafo, que acabou sobrevoando a carceragem e os agentes abateram o equipamento, que no ar não pôde ser identificado. Mas não havia relação entre o drone e a entrada de ilícitos na carceragem, esclarece o delegado Deoclécio Detros.

Em Marechal Cândido Rondon, de acordo com o delegado Diego Valim, não foi verificada nenhuma situação de uso de drones para a entrada de drogas ou ilícitos na carceragem da cadeia pública. Até o momento, também não houve nenhum registro de Boletim de Ocorrência acerca de invasão de privacidade pelo uso de drones em propriedades particulares, diz.

O que existe

Apesar da falta de legislação, agências reguladoras já tentam regrar o uso desses equipamentos. A Instrução do Comando da Aeronáutica (ICA) 100-40, por exemplo, vigora no Brasil e trata de assuntos como o processo de solicitação de voos destinados a fins lucrativos, como o uso do drone para atividades profissionais. Para voos recreativos com uso de drones, no entanto, aplicam-se as regras do aeromodelismo no Brasil, que são estabelecidos pela portaria DAC n° 207, que determina normas como evitar voos sobre aglomerados de pessoas e que alcancem, no máximo, 400 pés acima da superfície terrestre.

O Departamento de Controle do Espaço Aéreo (Dcea) também orienta a não sobrevoar áreas de segurança como quartéis, prédios, delegacias, infraestruturas críticas e que seja respeitada uma distância mínima de 30 metros de edificações. Quem opera deve seguir essas normas, evitar voar sobre propriedades particulares, áreas críticas e não ultrapassar os 120 metros de altura, porque demanda de autorização da aeronáutica e, caso não tenha, pode incorrer em crime que acarreta em detenção salienta Faro. Quem deseja pegar o drone de forma recreativa, o faça sem colocar em risco a integridade física ou psíquica de qualquer pessoa, pontua o advogado.

Além disso, existe uma consulta pública que pode ser acessada no site da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) com o propósito de convidar a sociedade em geral a oferecer contribuições para o aprimoramento dos normativos propostos para regulamentação do uso não experimental de veículos aéreos não tripulados (VANT). Nesta consulta, a Anac externaliza que, por serem aeronaves não tripuladas, não há risco para pessoas a bordo. No entanto, existe um grande risco para as pessoas em solo, bem como colisão com outras aeronaves. Eu vejo que a legislação precisa normatizar essa questão para evitar a violação de privacidade. Talvez ter o registro do drone em nome do proprietário para tentar evitar que aquela pessoa tenha má-fé ao utilizar o equipamento, por exemplo, mas a legislação, o Congresso, que deveria normatizar isso, está muito devagar, pondera o advogado.

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